20/09/2011

Fichamento do texto Corpo e imagem: comunicação, ambientes, vínculos de Norval Baitello Jr.

Referências:
BAITELLO JR, Norval. Corpo e imagem: comunicação, ambientes, vínculos. In: RODRIGUES, David (org.) Os valores e as atividades corporais. São Paulo: Summus, 2008. P. 95 - 112

A famosa citação de Harry Pross: “Toda comunicação começa no corpo e nele termina” abre a discussão sobre a necessidade de se incluir o corpo no processo comunicativo. São discutidas algumas implicações que vêm a tona quando se menciona “corpo”: a hipnogenia, a ambiência, os vínculos e a projetividade.

De acordo com o princípio da hipnogenia, as pessoas não têm responsabilidade pelo processo comunicacional que é controlado absolutamente pelos meios, elas se encontram em quase hipnose. Contudo, nessa categoria se enquadram apenas os indivíduos que se submetem a essa alienação, renunciando ao seu prórpio corpo, ou negligenciando uma relação equilibrada com ele.  

“... concepção de hipnogenia (Elisabeth von Samsonow) como componente indispensável dos sujeitos e objetos da comunicação – crença que passa a ser questionada. Tomava-se por aceita e tranquila a concepção de que os veículos comunicativos, os chamados meios ... tendem a substituir (ou ao menos ocultar) seus produtores, conduzindo o telespectador à ilusão de que são autônomos e imperativos (por seu lastro material ou por sua autoridade baseada na presença contínua de seus sinais). ... A hipnogenia transfere ao meio toda a responsabilidade, mas também toda a capacidade de decisão, deixando seus agentes no espaço-tempo de uma quase hipnose, abrindo mão de sua intencionalidade, de sua história e de seus sonhos...”(BAITELLO, 2008, pág 97)

“... localizando no corpo o momento germinal da comunicação, evita-se totemizar os meios, a mídia e afasta-se a crença na autonomia desta, bem como em sua onipotente decisão. Expande-se a percepção do fato social e inclui-se uma instância complexa, dotada de imperativos próprios, de densidade histórica e cultural. Com isso, não se pode simplesmente transformar ou enxergar o participante de um processo de comunicação como um ‘sujeito hipnógeno’, despido de capacidade de autodeterminação. Ele será transformado em tal figura infantilizada e de reduzido grau de vigília e prontidão quando renunciar- por vontade prórioa ou dos insistentes aparelhos sociais e culturais _ ao seu próprio corpo ou tiver uma relação pouco vital com ele. ... Por força de um estreitamento do uso dos sentidos (e da sensorialidade), ou seja, do próprio corpo em suas múltiplas potencialidades, criam-se “funcionários” (no sentido da expressão criada por Vilém Flusser) de um aparelho social onipotente, incapazes de existência plena e previamente projetados para suas funções.”(BAITELLO, 2008, pág 98)

Além disso o corpo cataliza ambientes comunicacionais, pelo simples fato de estar presente. A essa qualidade dá-se o nome de ambiência.

“O corpo não se reduz a um único vetor ou a uma única direção de vinculação... não é... mero meio de comunicação ou mídia. Muito antes, ele é um catalisador de ambientes, e talvez seja sempre o catalisador inicial de um ambiente comunicacional. Podemos nomear essa implicação de “princípio da ambiência”. Sua simples presença gera a disposição de interação, desencadeia processos de vinculação com o meio, com os outros seres do entorno e com seus iguais.... Somos vocacionados para a interação com outros que preencham nossas faltas e necessidades, porque somos corpo, com limites e alcances espaciais claros, com uma duração apenas presumível, mas indubitavelmente finita.” (BAITELLO, 2008, pág 99)

Comunicação deve ser entendida como estabelecimento de vínculos entre corpos. É descabida a ideia de que comunicar é apenas trocar informações.

“ Comunicar-se é criar ambientes de vínculos. Nos ambientes de vínculos já não somos indivíduos, somos um nó apoiado por outros nós e entrecruzamentos ... deslocamento do foco da comunicação: não se pode mais compreendê-la como simples conexão ou troca de informações, mas necessariamente é preciso ver nela uma atividade vinculadora entre duas instâncias vivas. ... os vínculos procedem de atmosferas afetivas, quer dizer, procedem de espaços de falta (ou espaços negativos), eles germ densidades afetivas oriundas dos espaços de carência ou saciedade, dos espaços de negação ou de negação da negatividade.” (BAITELLO, 2008, pág 100).

E comunicar é estabelecer ambientes ou atmosferas comunicacionais, conectanto a história de toda a humanidade por meio do princípio da projetividade.

“...não é um canal, ou uma via, ou um fluxo a melhor forma de retratar um processo comunicativo, já que este parte de um corpo. Muito mais adequado seria sua consideração, ... como ambiente, ou uma atmosfera gerada por todas as partes que a integram, suas materialidade e imaterialidade, seus percurso e sua histórias, seus sonhos, suas ambições e aspirações, suas perspectivas pregressas e ‘progressas’, suas projeções para frente e para trás, ambas entrelaçadas e inseparáveis, as naturezas retrospectiva e prospectiva mescladas uma à outra, como se o tempo se tivesse tornado duplo, inverso e reversível. A essa implicação podemos atribuir o nome de ‘princípio da projetividade’. Sim, porque um corpo é o registro das histórias de si mesmo e de todos os outros corpos, oferecendo a um ambiente comunicacional a profundidade e a densidade das camadas mais profundas do seu tempo e dos outros tempos. E sim, porque um corpo também é o registro dos sonhos, desejos e anseios que delineiam a perspectiva e a projeção futura de si mesmo e de todos os outros corpos. Projetividade é o lastro de história e o potencial de anseios que todo corpo carrega em seu âmago. ... Um corpo sempre conta histórias e projeta sonhos. Mais que isso, ele se constrói nas histórias e nos sonhos” (BAITELLO, 2008, pág 102 e 103)

Na contemporaneidade, contudo, se percebe um processo de abstração do corpo e de cerceamento do corpo para fazê-lo entrar na forma dada previamente por uma imagem. Em um processo crescente de adequação a objetivos e sonhos pré-fabricados. Como se os seres humanos fossem apenas ferramentas.

“ operação complexa que denominei ‘iconofagia’, na qual se processam as duas devorações heterodoxas: corpos que se alimentam de imagens e imagens que se alimentam de corpos. Tais devorações ocorrem em inúmeras situações e com frequencia cada vez mais assustadora, com a escalada exponencial da hegemonia do sentido da visão em detrimento dos outros sentidos que operam a comunicação de proximidade. Tocar, saborear e cheirar são sentidos banidos da comunicação.” (BAITELLO, 2008, pág 104)

“As amputações de projetividade ...Entre as violências perpetradas pela civilização, essa se apresenta como uma das mais graves. Pode-se simplificá-la coo uma sonegação do direito de sonhar, de crer (até mesmo de ter fé), de ambicionar uma vida própria, diferenciada dos padrões previstos e programados pelas estratégias da civilização centrada no escoamento da produção serial de mercadorias. ... Apagar os matizes da memmória e das vivências sempre individualizadas significa homogeneizar o presente, pois impõe um atestado de procedência única. Significa, também, impor um único destino, um roteiro de vida previsto, um futuro de sonhos uniformizados e pré-fabricados.” (BAITELLO, 2008, pág 105)



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