02/12/2009

II PND e Crise da dívida (1974 – 1984)

II PND e Crise da dívida (1974 – 1984)
(Eco 191) HERMANN, Jennifer in GIAMBIAGI, Fabio. Economia Brasileira Contemporânea (1945-2000) et al (2005) pp. 93-114, Cap. 4 Auge e Declínio do Modelo de Crescimento com Endividamento: O II PND e a Crise da Dívida Externa.

II PND e Crise da dívida (1974 – 1984) 1
II PND (1974-78) Governo Geisel 2
Efeitos práticos do II PND.. 3
Pol. Econ. e ajuste externo do Governo Figueiredo (1979-84) 3
EFEITO TANZI. 4

A partir do milagre capacidade de produção permanentemente ampliada no setor de bens de consumo duráveis, contudo sua efetiva utilização dali em diante implicava uma demanda por bens de capital e petróleo que não podia ser atendida pelo parque industrial brasileiro. Consequentemente o crescimento da economia tornou-se mais dependente da capacidade de importar (bens de capital e petróleo) do país. Paralelamente o aumento da dívida externa ampliou a dependência e a vulnerabilidade financeira externa da economia. Para cumprir os encargos da dívida era necessário: gerar superávits comerciais, para compensar as despesas financeiras e ou captar novos recursos, refinanciando a dívida. Nos dois casos o país se torna mais dependente do mercado internacioonal e, portanto, mais vulnerável a seus reveses: a geração de superávits comerciais requer, além de uma política cambial adequada, uma demanda externa em crescimento; a emissão de novas dívidas requer um mercado internacional com disponibilidade de liquidez e receptivo a novas dívidas do país devedor. O elevado coeficiente de importação de petróleo da economia brasileira na época do choque do petróleo converteu uma situação de dependência externa em um quadro de restrição externa a partir de 1974. Com os novos preços, comprimia-se a capacidade de importação e, consequentemente, de crescimento do país.

Nos países industrializados os efeitos mais imediados do choque foram o aumento dos juros (já em 1974) e a contração da atividade econômica (no biênio 1974-75). Isso comprimiu ainda mais a capacidade de importar dos países em desenvolvimento já atingidos pela deterioração dos termos de troca porque a recessão nos países industrializados dificultava o aumento das receitas de exportação.

As dificuldades dos países em desenvolvimento no comércio internacional foram aliviadas, paradoxalmente por outro efeito do choque do petróleo: a forte entrada de “petrodólares” no mercado financeiro internacional que acabaram financiando os déficits em conta corrente de países endividadeos como o Brasil.

Em meados de 1979, no segundo choque dos preços do petróleo, visando conter os efeitos inflacionários do segundo choque do petroleo, os bancos centrais dos países industrializados, em geral, elevaram suas taxas básicas de juros. A prime rate, usada como taxa de referência nos empréstimos domésticos e externos dos bancos americanos seguiu trajetória semelhante. O novo patamar das taxas de juros inaugurou fase de recessão nos países industrializados e enxugou a liquidez dos países em desenvolvimento.

O aumento dos juros americanos contribuiu para aumentar os déficits em conta corrente de duas formas: 1) através da retração das importações dos países industrializados (entre eles os EUA historicamente grande comprador de produtos brasileiros) ; e 2) através do aumento das despesas com a dívida externa já que grande parte dela fora contratada a taxas flutuantes (indexadas à prime rate). Ao mesmo tempo, os juros mais altos dificultavam a captação de novos empréstimos pelos países já endividados além de atrair recursos para os países industrializados, aumentavam o risco atribuído (pelos investidores estrangeiros) aos países devedores, porque impricavam maiores despesas com a dívida já contratada e maiores custos de rolagem da dívida vincenda. Nessas condições, a compensação dos déficits em conta corrente por superávits na conta de capital como se fez no Brasil durante o milagre não era mais possível.

Incapazes de saldar ou de refinanciar as elevadas despesas financeiras os países altamente endividados – a maioria da América Latina – se viram forçados a declarar moratória da dívida externa. O primeiro foi o México em 1982. Deflagrando a crise da dívida latino-americana.
II PND (1974-78) Governo Geisel
Ousado plano de investimentos públicos e privados (estes incentivados por políticas específicas) a serem implementados ao longo do período de 1974-79 que se propunha a cobrir a área de fronteira entre o subdesenvolvimento e o desenvolvimento. Os novos investimentos eram dirigidos aos setores identificados como os grandes pontos de estrangulamento que explicavam a restrição estrutural e externa ao crescimento da economia brasileira: infra-estrutura, bens de produção (capital e insumos), energia e exportação. Ampliação da malha ferroviária, da rede de telecomunicações, da infra-estrutura para produção e comercialização agrícola, visando aumentar oferta para o mercado interno e para a exportação. Investimentos em siderurgia, química pesada, metais não ferrosos e minerais não metálicos. No setor energético, pesquisa exploração e produção de petróleo e derivados, ampliação da capacidade de geração de energia hidrelétrica e desenvolvimento de fontes alternativas de energia como o proalcool.

Financiamento do II PND concessão de linha de crédito pelo BNDE para os investimentos privados a juros subsidiados, investimentos públicos financiados por recursos do orçameto (impostos) e por empréstimos externos captados pelas empresas estatais que por terem o aval do governo federal estavam em posição de obter melhores condições de créditos que as empresas privadas no mercado internacional. As condições de crédito se tornaram favoráveis já em 1975, devido a ampla disponibilidade de liquidez no mercado externo, alimentada pelos petrodólares; o recuo das taxas de juros internacionais a partir de 1975 e a retomada da economia mundial após o primeiro choque do petróleo.

Além desse cenário externo propício, havia internamente uma pressão para a adoção de um modelo de ajuste não recessivo. O crescimento dos primeiros anos do milagre foi facilitado pela utilização da capacidade ociosa entao existente, mas a partir de 1971, a demanda agregada em expansão estimulou novos investimentos privados. Em 1974, grande parte desses investimentos estava incompleta, ou tinha sido recentemente concluída. Uma forte desaceleração naquele momento implicaria riscos e custos elevados para as empresas investidoras, bem como para os bancos envolvidos no financiamento dos novos empreendimentos. O atendimento dessa demanda empresarial interessava ao governo que buscava a legitimidade do poder pelo crescimento econômico para assegurar a distensão lenta, gradual e segura.

A manutenção de um ritmo de crescimento acelerado que, se sabia, ampliaria o desequilíbrio externo, trazia consigo a ameaça de descontrole inflacionário seja pelo excesso de demanda ou pela necessidade de correções cambiais. Esse risco explica as inflexões da política econômica comandada pelo ministro Mário Henrique Simonsen, que ocupou a pasta da Fazenda durante todo o governo Geisel. A política monetária contencionista no entanto nao impediu que o crédito mantivesse taxas positivas de crescimento real até o fim do governo Geisel. Do lado fiscal, foi adotada uma política de contenção de gastos da administração pública direta (Ministérios).

Por outro lado, na contramão dos controles monetários e fiscal, os investimentos das estatais expandiam, elevando a taxa de investimento da economia, bem como a participação do governo na FBKF, que atinge 40%. Esse aumento é explicado exlusivamente pelas empresas estatais. Esse novo perfil da atuação do governo na economia, através das estatais, explica a compatibilização do forte crescimento dos investimentos governamentais com a manutenção de superávits primários nas contas públicas e com uma carga tributária estável.

Apesar disso, a dívida pública mobiliária federal se expandia em proporção ao PIB, puxada pelas operações de esterilização da entrada de capital no mercado cambial (venda de títulos para enxugar liquidez)
Efeitos práticos do II PND
As expectativas de mudança estrutural que motivaram o II PND foram em geral alcançados. 1) Avanço da ISI, que se manifestaria pela redução do coeficiente de importação de bens de capital; 2) redução da dependência externa em relação ao petróleo; e 3) aumento da capacidade exportadora do país, acompanhado de diversificação da pauta de exportações, em favor dos bens manufaturados e semimanufaturados (reduzindo, portanto o peso relativo dos bens manufaturados). Por conta da substituição de importações a contração das importações foi bem maior que a do PIB durante a recessão. O quantum de exportações cresceu continuamente a partir de 1978 (exceção de 1982, auge da recessão). O crescimento real das exportações torna-se sistematicamente superior às taxas de crescimento real do PIB. Além disso a pauta de exportação brasileira a partir do II PND o peso dos bens básicos nas exportações totais reduziu-se continuamente desde então de 65% em 1973 para 32% em 1984, sendo essa queda inteiramente compensada pelo aumento do peso relativo dos bens manufaturados.
Pol. Econ. e ajuste externo do Governo Figueiredo (1979-84)
Tres fases distintas quanto ao comportamento do PIB: 1979-80 elevadas taxas de crescimento; 1981-83, recessão; e 1984 recuperação puxada pelas exportações.

1979-80

Maxidesvalorização cambial de 1979 cumulada com reajuste das tarifas públicas (medidas para controlar os gastos públicos) gerou aceleração da inflação que triplica.

Reajuste salarial de anual passa a ser semestral e passa a haver indexação dos contratos com isso a inflação passa a ser inercial.

Criada SEST Secretaria especial para empresas estatais para controlar gastos das estatais.

Ajuste externo que se pretendia não recessivo combinando controles fixcal e monetário com ajustes de preços relativos que idealmente favoreceriam a balança comercial e recuperariam as contas públicas, resolvendo ao mesmo tempo os desequilíbrios externo e fiscal. Mas na prática ajustes de preços foram inócuos pq a inflação corroia rapidamente os aumentos reais

Recessão foi vitada por uma combinação de aumento das exportações e crescimento inercial dos investimentos públicos e privados do IIPND. Quanto ao BP, desequilíbrio não foi sequer amenizado pq: 1) a maxidesvalorização de 79 não se materializou em desvalorização real do câmbio porque foi corroída pelo rápido aumento da inflação; 2) apesar do forte crescimento das exportações o déficit comercial aumentou puxado pelos preços do petróleo; 3) aumento dos juros internacionais aumentou as despesas com rendas; 4) os superávits da conta de capital não foram suficientes para cobrir os déficits correntes, tornando o BP deficitário

1981-84

A partir de 1981 o modelo de ajuste adotado foi explicitamente recessivo com o objetivo de gerar excedentes exportáveis. A política monetária foi central, a manutentção dos juros reais elevados era a principal via de atuação. Forte recessão entre 1981 e 1983.

Com a moratória do México em 1982 os juros altos do mercado brasileiro não foram capazes de atrair capital suficiente para cobrir as nosvas despesas. Reservas internacionais cegaram ao equivalente a 2,5 meses de importação. Emprestimo do FMI injetou 4,2 bilhões de dólares na conta de capital, exigindo ainda mais rigor na política monetária restritiva (36% de queda real do M1 e 26% de queda do crédito ao setor privado). Nova maxidesvalorização de 30%, que, dessa vez, resultou em desvalorização real.

No biênio 1983-84 a política fiscal tornou-se também restritiva (o que não tinha ocorrido até 1982): a carga tributária aumentou e os investimentos públicos foram drasticamente cortados.

EFEITO TANZI
O aumento da inflação erodia a receita real do governo. Além disso, elevava os encargos da dívida pública, através da correção monetária. A maxidesvalorização cambial de 1979 e a política de juros altos a partir de então afetaram as despesas financeiras do setor público. Elevando os encargos da dívida interna (com juros reais e correção cambial) e externa (grande parte dela de responsabilidade do governo, devido às Resoluções 432/230 do Bacen que permitiam o depósito antecipado no Bacen da quantia em dólares devida por bancos e empresas. O que na prática transferia para o governo o risco cambial e os custos de futuras desvalorizações).
1984

Recuperação da economia mundial aumento das exportações e a recessão levava à diminuição das importações.

Considerando o crescimento real do PIB de 5,4% a queda das importações (de quase 10%) liderada pelo encolhimento de 7,4% do quantum, refletiu, fundamentalmente o sucesso do IIPND na substituição de bens de capital e petróleo. Ainda assim, o ajuste externo de 1084 caracteriza-se como parte do ajuste recessivo implementado a partir de 1981, já que refletiu a mudança na distribuição do PIB entre os componentes da demanda agregada claramente favorável à transferência líquida de recursos reais ao exterior (o que ocorre quanto o agregado das contas de comércio e serviços no BP é superavitário). Em 1984 o consumo a FBKF e as importações perdem participação no PIB, sendo essas perdas compensadas pelo aumento do peso relativo das exportações. ..

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