18/02/2013

Eficácia plena, contida e limitada

Por Danielle Denny

Respondendo a perguntas sobre aplicabilidade das normas constitucionais:

EFICÁCIA PLENA

Ninguém tem dúvida quanto a essas normas, como o próprio nome indica, possuem aplicabilidade imediata, direta e integral, não dependem de lei posterior que as regulamentem; produzem efeitos desde 1988, quando foi promulgada a Constituição, a matéria só pode ser contida por outro legislador constitucional, ou seja, quando houver uma nova assembleia constituinte e for feita outra constituição. Assim é a norma que determina que, todo o poder emanar do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente (art.1º. §único), esse direito vale desde 1988 e não pode ser limitado por legislador infraconstitucional ou por qualquer representante do Poder Público.  

Outros exemplos:
art. 5º, IX e XX
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; 
XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;

art. 15
Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII; V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.

art. 17, § 4o, arts.19 a 22, 24 a 28, caput, arts. 29 e 30, art. 37, III, art. 44, parágrafo único, art. 45, caput, art. 46, § 1o, arts. 48, 49, 51, 52, art. 60, § 3o, arts. 69, 70, 71, 76, 84, 101, 102, 103, 104, 105, 145, 153, 155, 156, art. 226, § 1o.

EFICÁCIA CONTIDA

A complicação começa com essas normas. Qual é a diferença entre contida e limitada? As contidas possuem aplicabilidade imediata e direta, são exigíveis desde 1988, mas podem ser contidas pela discricionariedade do Poder Público, em uma potencial decisão judicial analisando um caso concreto. São normas que possuem ressalvas, são válidas a menos que ocorra um fato específico. Dessa forma é o dispositivo “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei” (art. 5º., VIII). Dica: sempre que tiver expressões como “salvo disposição em lei”, é norma de eficácia contida.

Outros exemplos:
art. 5º XII, XIII, XXII
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
 XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
LVIII - o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei,
LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

EFICÁCIA LIMITADA

São as normas constitucionais principiológicas ou submetidas a limites de tempo e espaço, elas dependem de regulação infraconstitucional para serem aplicadas. A grande maioria dos dispositivos previstos na Constituição é desse tipo. Afinal, a regra é a norma fundamental ser genérica, inspiradora dos demais preceitos do ordenamento jurídico. Contra a inércia do legislativo, ou do poder público, em regulamentá-las cabem Ação Direta de Inconstitucionalidade por omissão ou Mandado de Injunção.

São exemplos:
art. 20, § 2º - A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei.

art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: I - importação de produtos estrangeiros; II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; III - renda e proventos de qualquer natureza; IV - produtos industrializados; V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; VI - propriedade territorial rural; VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.

art. 7o, XI, XX, XXVII, art. 25, § 3o, art. 32, § 4o, arts. 33, 88, art. 90, § 2o, 91, § 2o, 107, § 1º, 109, VI, 113, 121, art. 125, § 3o, art. 128, § 5o, art.146, art. 154, I, art. 165, § 9o, art. 163, arts. 170, art. 173, § 4o, art. 195 § 4o, art. 193, art. 216, § 3o, art. 218, § 4o.
.

17/02/2013

Direito, Internet e sustentabilidade

A importância de se garantir, por meio da cultura do ouvir, a ecologia da comunicação

Por Danielle Denny

Em certa reunião pedagógica de um curso de Direito, um dos professores, ao se apresentar, não lembrava o nome completo de sua disciplina, apenas Internet. Que curiosa força esse pequeno termo tem! Na grade de horários, o título completo é Relações Privadas e Internet. Mas realmente, o que marca é a última palavra. E estuda-la no âmbito jurídico vai muito além das relações privadas, é preciso abordar uma miríade de tópicos transdisciplinares que se interconectam, de forma pouco sistematizada, contrariando, de certa maneira, a regra da ciência que é a metodologia cartesiana.

Direito é uma relação entre duas ou mais pessoas, que pode ser expressa por uma regra, ou a disposição recíproca das partes de um todo. Direito em sentido fundamental, é uma técnica (no conceito platônico) que torna possível a coexistência humana. A característica mais marcante de uma técnica é a eficiência e a retificabilidade é a condição fundamental que permite à própria técnica conservar a sua eficiência e aumentá-la ainda mais.

Técnica eficiente, portanto, é aquela que pode ser, oportunamente, modificada, que consegue se adaptar às circunstâncias sem ser substancialmente mudada. O direito, dessa forma, precisa ter a capacidade de corrigir e de eliminar as próprias imperfeições, tornando-se mais ágil e, ao mesmo tempo, mais rigoroso. Ele não é constituído de mera coerência interna do sistema, nem de um juízo de valor, que busca um ideal pré-ordenado de justiça. É um juízo concreto e diretivo, capaz de influir no desenvolvimento da conduta humana.

Uma das características preponderantes da contemporaneidade consiste na aplicação cibernética, o Direito em sua constante transformação para adequar-se à realidade social, não pode deixar de assimilar e tirar vantagem dela.

A cibernética pode ser conceituada como uma transformação de um estado de coisas existentes, com um objetivo pretendido, segundo um programa suscetível de se modificar, mediante inter-relação de dados existentes, de acordo com o que foi determinado pelo organizador do programa. Todos os que quiserem aumentar a eficácia de sua ação, eliminar erros e evitar riscos, todos os que tiverem ideais a realizar ou pretenderem transformar situações, terão de levar em conta a cibernética.

Por outro lado, as externalidades decorrentes da informatização, precisam receber um tratamento adequado. A mão-de-obra que foi dispensada de seus empregos, em razão da automação, por exemplo, precisa ser usada em outros setores da economia. O inchaço populacional das grandes cidades ou de algumas regiões do país, devido ao êxodo rural e a migrações internas, cria uma enormidade de problemas socioambientais e econômicos que precisam receber o devido tratamento com processos inteligentes de organização planejada, para evitar o aparecimento de perturbações sociais que possam desestabilizar o sistema a tal ponto que gere até uma eventual substituição.

Do ponto de vista antropológico, o fato de planejar a direção é o que distingue o homem dos demais seres vivos. Tudo que coloca limitação a esta capacidade específica do homem, ou que impede a consciência dos efetivos processos e meios empregáveis, fazendo com que a tecnologia seja uma caixa preta, ameaçam o direito humano, previsto na nossa constituição como princípio fundamental, a dignidade humana.

Assim, é desumana a sujeição do homem ao mundo tecnológico, por ele próprio criado e é preciso que se estabeleça uma distribuição de trabalho entre o homem e a máquina, em que o ser humano possa ser aceito como mais do que uma fonte de erros descartável.

A manipulação do homem pelo homem, o condicionamento do indivíduo pelo grupo social em que vive, as intencionalidades de todo o conteúdo midiático produzido, a redução do ser humano a um meio para a consecução de um fim, em detrimento da conservação de sua dignidade como um fim em si mesmo justificam que seja buscada uma abordagem mais sustentável.

E sistemas sociais constituem, sempre, processo de comunicação, portanto, o desafio é buscar uma abordagem ecológica para os atos comunicativos. A obra de Vicente Romano, intitulada Ecologia de la Comunicación, ressalta essa importância de mudança de paradigmas para priorizar o ouvir, porque, escutando o outro, exercita-se a tolerância, o reconhecimento mútuo.

Devido às características contemporâneas, inclusive de escassez de tempo, fica cada vez mais difícil as pessoas dedicarem atenção aos outros, principalmente aos marginais da sociedade da comunicação, aqueles que não se fazem representar pelos formadores de opinião, nem estão aptos a se apropriarem dos meios para se fazerem ouvir, a grande parte das minorias, os sem voz, que permanecem excluídos do diálogo social.

Um pequeno, porém importante avanço no estudo dessa temática é o lançamento do livro do grupo de pesquisa Comunicação e Cultura do ouvir, justamente porque aborda, em vários artigos, análises sobre a Ecologia da Comunicação, interceptando, em muitos deles, os temas Direito, Internet e sustentabilidade.

Para mais informações sobre o livro clique aqui.