19/06/2012

Sustentabilidade empresarial independe do porte da organização


Por Danielle Denny

A maioria das empresas de pequeno porte adota algum tipo de prática sustentável: 70.2% realizam coleta seletiva, 72.4% controlam o consumo de papel, 80.6% a água, 81.7% a energia. Essa foi a constatação da pesquisa divulgada em maio/12 pelo SEBRAE – Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, que entrevistou 3912 empresários de micro e pequenos negócios em todo o Brasil.

O engajamento de toda a sociedade, principalmente das empresas, a despeito do seu tamanho, é fundamental para implementar os valores da sustentabilidade. Com a globalização, os agentes políticos nacionais perdem cada vez mais relevância, cedendo espaço para a iniciativa privada, que, por meio de sua atuação, inclusive transnacional, acaba substituindo o Estado em muitas de suas antigas atribuições.

O conceito do Relatório Brundtland é, desde 1987, ainda esclarecedor: “desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades”. Contudo, na prática, a aplicação dessa diretriz gera enormes controvérsias, dada a complexidade do tabuleiro político atual.

Como bem conceitua Robert Puttnam, enfrentamos jogos de dois níveis, cuja racionalidade de uma ação e' explicada pela atitude conexa que pode gerar em outro contexto. Assim, o que separava, dicotomicamente , os pequenos dos grandes, os poderosos dos periféricos, os ricos dos pobres, os vilões dos mocinhos se dissipou. Todos têm sua parcela de responsabilidade. As organizações, cada vez mais, são chamadas a sopesar a maximização dos lucros com o papel que têm a cumprir, para fomentar o desenvolvimento socioambiental.

John Elkington denominou essa nova realidade de “triple bottom line”, sendo que cada um dos três pilares da sustentabilidade (econômico, social e ambiental) devem ser geridos com compromissos públicos no âmbito das organizações. Não se trata de um modismo ou de um marketing corporativo para gerar imagem positiva de fachada. Envolve uma filosofia de gestão que deve permear toda a empresa e focar nos resultados efetivos.

Nao basta apenas cumprir as normas e diretrizes do Global Compact, da OCDE (Organização para a cooperação e desenvolvimento econômico), da Lei Sarbanes-Oxley ou ostentar relatórios e certificações como o Global Reporting Initiative (GRI), ISO 14000, Índice Dow Jones de Sustentabilidade (IDJS) ou ISE – Índice de Sustentabilidade Empresarial (BOVESPA). Todos esses modelos devem ser tomados como um convite à reflexão, uma métrica para possibilitar que os resultados sejam comparados.

Eles facilitam o relacionamento das empresas com os seus públicos e principalmente com os negociadores das Bolsas de Valores. Mas os indicadores refletem apenas parte do cotidiano empresarial nos relatórios, não espelham perfeitamente o dia a dia da gestão. Além disso, os custos, literalmente milionários para adaptação, impedem que muitas corporações se submetam. Dessa forma, o foco não pode ser os prêmios e certificados, mas sim, os resultados efetivos conseguidos com a administração responsável e ética.

A propriedade tem de ser lucrativa e cumprir a sua função social, conforme previsto na Constituição brasileira (Art. 5º, XXIII). As normas e o controle estatal estão cada vez mais exigentes e rigorosos, principalmente no que tange a aspectos ambientais e trabalhistas. Assim, cumprir a função social pode ser a opção mais rentável, uma vez que significa, além de economizar em multas e condenações, deixar de perder dinheiro, implementando processos mais eficientes e econômicos que evitem desperdícios, reutilizem e deem destinação adequada aos resíduos.

Além disso, uma empresa socioambientalmente comprometida experimenta ganhos d e reputação que podem ser capitalizados em outras áreas. De acordo com Mario Rosa, uma empresa com boa imagem pode comprar melhor, cobrar mais, contratar os melhores funcionários, custar menos e ser mais competitiva.

Para disseminar oportunidades nesse sentido, é indispensável a inovação, e empresas de qualquer tamanho podem surgir com produtos, ideias e processos novos. Nas estruturas menores e menos burocratizadas, o ambiente é ainda mais propício para converter essas inovações em estratégia de mercado ou de competividade. Assim, para as micro e pequenas empresas essa pode ser uma excelente oportunidade de negócio.

A DryWash é um exemplo. Para economizar os 300 litros de água que se usam para lavar cada carro em um lava-rápido convencional, o dono fez experiências químicas usando a batedeira da sogra e com isso desenvolveu uma formula pioneira em todo o mundo, hoje patenteada. Além dos royalties dos produtos, a DryWash fatura com a prestação de serviços de lavagem a seco e com uma ampla rede de franquias.

Com a mudança de valores da sociedade, os consumidores passaram a valorizar os progressos sociais e ambientais do setor privado, juntamente com preço e qualidade. Assim, o comprometimento socioambiental pode agregar valor e favorecer pequenos empreendimentos, na medida em que consumidores conscientes aceitam pagar um preço maior por um produto mais ecológico e privilegiam empresas locais.

O desafio de implementar os valores de desenvolvimento sustentável é comum, tanto para os grandes como para os pequenos negócios. Lucrarão mais os que conseguirem se antecipar, aproveitando a janela de oportunidade da Economia Verde, de baixo carbono e socioambientalmente responsável.

Rio + 20: o quê a iniciativa privada espera


Por Danielle Denny

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável é acima de tudo um evento diplomático. Portanto as articulações políticas entre as delegações dos diversos países já estão ocorrendo há meses. Na verdade, desde 2010 o Itamaraty está preparando a Rio + 20.  E nenhuma ruptura está anunciada, pelo contrário, pretende-se um encontro de verificação dos compromissos assumidos até o momento em reuniões passadas. Não vai ser conclusiva, nem sediará assinatura de tratados decisivos como houve na Rio 92 (os quais foram negociados por anos antes daquela conferência). Para a iniciativa privada, as expectativas seguem a mesma toada.

O empresariado faz parte do grande grupo heterogêneo chamado sociedade civil. E na Rio + 20 se fará representar pelo Business Action for Sustainable Development (BASD), formado por três grandes grupos: International Chamber of Commerce (ICC), World Business Council for Sustainable Development (WBCSD) e United Nations Global Compact (UNGC). Cada um desses congregam empresas individualmente e em conjunto, como as confederações de indústria, comércio e agricultura dos mais variados países.

Para Aron Belinky, da Vitae Civilis, a Rio + 20 é uma “peça em 2 atos”. Durante os 15 dias no Rio será o momento para a sociedade civil como um todo expressar seus interesses e prioridades. Serão mais de 500 side events no Riocentro, mais de 90 na Arena da Barra, mais de 700 na Cúpula dos Povos. No segundo ato, de implementação de politicas públicas, segundo ele, a sociedade civil precisará encontrar formas de agir e os canais de participação ainda precisam ser mais claros. Precisará haver pressão sobre os representantes políticos para que sejam convertidas em ações as prioridades que forem identificadas durante a conferência.

Para Marcelo Vianna, da ICC, o mais importante é o “day after da RIO + 20”, o que vai ser feito posteriormente, como os setores estarão organizados. Afinal “ninguém é contra as ações sustentáveis. A discussão é sobre como elas devem ser implementadas, assim, o plano de trabalho para os dias seguintes é o mais importante”.

A RIO + 20 tem como temática a economia verde no contexto da erradicação de pobreza e do desenvolvimento sustentável. Esse conceito de economia verde foi cunhado pelo Programa das Nações Unidas sobre Meio Ambiente (PNUMA), que elaborou em novembro de 2011 um relatório extenso de 631 páginas sobre o tema (disponível online em inglês e em português na versão resumida).

Nesse contexto, o BASD identificou 10 condições sistêmicas, que necessitam ser providas para que se chegue à economia verde, conforme bem explicou Olympio Barbanti Jr., jornalista, PhD em Políticas Sociais pela London School of Economics:
I - Inovação Social
1. Sensibilização (awareness) e compreensão – para que todos os setores adotem as prioridades da agenda de economia verde;
2. Educação e treinamento – que devem ser promovidas por agentes públicos, negócios e pela própria academia;
3. Emprego – promover oportunidades de trabalho formal e decente, mas não diferenciar “verde” de outras áreas da economia;
II – Inovação Ambiental
4. Promoção de eficiência energética e promover atividades econômicas com ganhos sociais e sem impactos ambientais;
5. Adotar um enfoque de ciclo de vida em todas as atividades econômicas;
III – Inovação Econômica
6. Fortalecer economia de mercado e inserir as dimensões da economia verde nas práticas de negócios internacionais, e torná-las operacional por meio de seu reconhecimento nos balanços das empresas;
7. Desenvolver indicadores, métricas, medidas de contabilidade e promover melhor geração e divulgação de relatórios;
8. Definir política de apoio e de regulamentação que propiciem decisões de investimento informadas para os investidores públicos e privados;
IV – Temas Transversais
9. Desenvolver processos de tomada de decisão que integrem dimensões de políticas ambiental, sociais e econômicas;
10. Criar estruturas de governança nos níveis local, regional, nacional e global que possam facilitar a colaboração e a formação de parcerias inovadoras que entre empresas, governo e sociedade civil.
Ainda de acordo com Olympio Barbanti Jr., adicionalmente às condições sistêmicas, o BASD apresentou 10 proposições de ações a serem tomadas:
1.       Acesso à Energia
a.       Deve-se investir em todas as fontes de geração; apoiar a iniciativa Energia Sustentável para Todos; expandir mercados e aumentar eficiência energética
2.       Agricultura e Segurança Alimentar
a.       Intensificar a produção sustentável de alimentos; fazer da agricultura um fator conducente da redução de pobreza, por meio da ligação de pequenos produtores com cadeias; produzir mais com menos; investir em pesquisa e desenvolvimento agrícola, na capacitação, e no compartilhamento de conhecimentos.
3.       Ecossistemas e da Biodiversidade
a.       Apoiar a iniciativa The Economics of Ecosystems and Biodiversity (TEEB); prover canais que possibilitem às empresas trabalhar mais estreitamente com os formuladores de políticas na concepção e implementação de políticas de biodiversidade e ecossistemas relacionados.
4.       Nexo entre Água, Alimentos e Energia
a.       Implementar uma abordagem integrada e inter-setorial para o planejamento e gestão da água, da energia e dos alimentos, e promover investigação, inovação, compartilhamento de conhecimento e acesso a tecnologias para se chegar à utilização eficaz e a uma distribuição equitativa desses recursos.
5.       Ciência, Tecnologia e Inovação
a.       Promover um ambiente político e regulatório que incentive investimentos estáveis e que permita pesquisas de longo prazo, incluindo proteções adequadas para os direitos de propriedade intelectual, e garantindo apoio para micro e pequenas empresas. Para tanto, governos devem procurar a cooperação internacional e parcerias público-privadas.
6.       Desenvolvimento Social, Direitos Humanos e o Papel das Empresas
a.       Atuar em consonância com os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Direitos Humanos e Negócios. Pôr ênfase nos direitos dos mais vulneráveis, especialmente para assegurar a gestão eficaz da terra, água, biodiversidade e de outros recursos naturais, capacitando-os e empoderando-os para participar de oportunidades econômicas, através de investimentos em igualdade de saúde, educação e gênero, sem negligenciar questões de governança (particularmente a corrupção). Criar incentivos para que empresas possam incluir pessoas pobres em suas cadeias de valor (como funcionários, fornecedores, clientes, etc) ou através do desenvolvimento de seu capital humano Criar incentivos às empresas para contribuir para o desenvolvimento social, econômico e institucional das comunidades locais, além de mitigar qualquer efeito adverso impactos que as empresas possam ter.
7.       Recursos e Gestão de Materiais
a.       Investir na estratégia 3R (reduzir, reutilizar, reciclar), incorporando-a aos modelos macro-econômicos e indicadores, de forma a orientar o consumidor, e o comportamento industrial e governamental. Estabelecer, tanto a nível global como no nacional, um sistema de contabilização de recursos materiais para acompanhar a sustentabilidade do uso dos recursos em relação a três medidas: (i) taxa de crescimento do consumo total (materiais primários e reciclados); (ii) a taxa de crescimento do uso de estoques pelo seu conteúdo líquido; e (iii) taxa de reciclagem.
8.       Parcerias Transformacionais
a.       Governos devem apoiar o desenvolvimento de “parcerias de transformação” que têm o potencial de transformar as formas pelas quais percebemos as metas de desenvolvimento uma vez que tais parcerias têm capacidade de tratar de questões sistêmicas; envolver todos as partes interessadas; expandir as competências essenciais de todos os parceiros, e criar capacidade interna de alavancagem.
9.       Urbanização
a.       Possibilitar o envolvimento dos negócios no início do processo de planejamento para a urbanização sustentável, que requer abordar adequadamente as dimensões social, econômica e ecológica de sustentabilidade, priorizando ações ajustadas às circunstâncias locais e regionais.
10.     Água para a Economia Verde e Alívio da Pobreza
a.       Melhorar os dados atuais e a capacidade de monitoramento sobre água e saneamento, que são largamente subestimados. Deficiências neste campo geram perdas para os negócios. O problema é maior na agricultura, que deverá considerar a melhoria dos processos e práticas agrícolas de sequeiro. Será também necessário melhorar significativamente a produção de água.

O setor privado, portanto, espera implementação (do que já foi decidido), integração (do social, econômico e ambiental) e coerência (entre o que se sabe e o que se faz). Dentre as diversas temáticas levantadas durante a Rio + 20, pontos mais relevantes têm de ser priorizados e, consequentemente, outros descartados. O mais importante é o censo de urgência, não temos mais 20 anos pela frente.

14/06/2012

Colírio


20120613 PP


Pedro Hensinas
23 anos
capoeirista
modelo

representante Monavie produtos nutricionais

fotografado por Danielle Denny em 13/06/2012

06/06/2012

Fichamento do livro A narração do fato de Muniz Sodré


Por Danielle Denny

 
… a frase do jornalista norte-americano Amus Cummings, ex-editor do The New York Sun (‘se um cachorro morde um homem, não é notícia, mas, se um homem morde um cachorro, é notícia’) inscreveu-se na tradição das redações de jornais como uma fórmula adequada à prática profissional, orientada pelo valor de excepcionalidade, de raridade ou de ruptura do padrão rotineiro de expectativas quanto aos fatos sociais. (O The New York Sun, fundado em 1833, é o primeiro exemplo de imprensa massiva nos Estados Unidos. Foi responsável pela passagem do jornalismo de notas sobre fatos sociais ou políticos de grande importância para o de notícias do gênero fait-divers do acontecimento miúdo, às vezes escandaloso.) (SODRÉ, 2009: 20)
O fato
Para começar, Kant: “Os objetos para conceitos cuja realidade objetiva pode ser provada (seja mediante pura razão, seja por experiência e no primeiro caso a partir dos dados teóricos ou práticos da razão, mas em todos os casos por meio de uma intuição que lhes corresponda) são fatos” (KANT, I. Crítica do juízo, § 91) (SODRÉ, 2009: 28)
O acontecimento
Incorporando a definição kantiana de fato como conceito para objetos cuja realidade pode ser provada – e, assim, como um espaço disponível ao observador para atribuição de algum sentido à ocorrência – somos levados a encontrar outro termo para a representação social do fato, em especial para a informação jornalística concretizada na notícia. Esse termo news, (...) bem pode ser o acontecimento. Na prática, pode ser tomado como sinônimo de fato sócio histórico. Mas enquanto o acontecimento se pauta pela atualidade, isto por uma experiência singular na temporalidade do aqui e agora, o fato, mesmo inscrito na história, é elaboração intelectual. (SODRÉ, 2009: 33)
... na televisão ou na rede cibernética, principalmente, sem a garantia de um jogo correto das fontes, é cada vez mais difícil separar o imaginário do real ou o verdadeiro do falso... a micronarrativa produz um conhecimento situado a meio caminho entre o senso comum e o conhecimento sistemático... senso comum é o nome para o conhecimento daquilo que os gregos chamavam de doxa, isto é uma experiência da realidade limitada à sensibilidade, às notas acidentais contingentes e variáveis, às representações sociais que reduzem a complexidade factual a imagens de fácil trânsito comunicativo – traduzidas em opinião... A lição implícita do jornalismo, entretanto, é não se pode fazer pouco caso do senso comum, por ser ele estabilizador da consciência e mobilizador do pertencimento à comunidade. Por outro lado, o conhecimento sistemático (metódico, objetivo, desvinculado dos valores etc ) diz respeito à ciência.(SODRÉ, 2009: 45)

...habituados que estamos a consumir o discurso informativo como uma objetivação dos fatos da atualidade cotidiana, deixamos de perceber que ali se constitui igualmente uma narrativa das práticas humanas, cuja função maior é chama a atenção da coletividade para o modo como tais práticas se organizam ou devem organizar-se dentro de uma delimitação temporal, de uma periodização. Assim, pode muito bem acontecer que a mediatização de aspectos críticos de uma determinada realidade social deixe o público em geral pouco informado sobre o que realmente está ocorrendo (e isto é cada vez mais frequente em virtude das flutuações da atenção e da memoria coletivas sob o influxo da mídia), mas ainda assim essa precária memória midiática é capaz de fazer emergirem novos atores sociais no espaço público, sejam eles os imigrantes ou os favelados nas periferias (SODRÉ, 2009: 69)

A notícia
... o acontecimento, materializado na forma noticiosa padrão, é o vetor para uma teoria da instantaneidade ou da temporalidade singularizada no fato social. Assim, notícia, a anglo-saxônica News of the day (notícia factual), constitui-se como o relato (micronarrativo) de um acontecimento factual, ou seja, inscrito na realidade histórica e, logo, suscetível de comprovação. (SODRÉ, 2009: 70)
... o fato em bruto (o “objeto atual”) determina o acontecimento, desdobra-se por meio de uma interpretação em notícia, que é uma estratégia ou um gênero discursivo suscetível de representar a ocorrência factual primeira e, eventualmente, desdobrar-se em novas interpretações. Mas são diversos os tempos e os modos de ocorrência implicados na notícia.(SODRÉ, 2009: 72)
Queremos deixar claro que o “paradigma do cachorro” – o da pura e simples ruptura da normalidade quotidiana ou, em último caso, a anomalia – não é teoricamente suficiente para definir a notícia. (...) Para nós, o verdadeiro traço em comum entre o homem que morde o pitbull, o pitbull que morde o homem, a chegada de uma delegação do FMI ao país e o assassinado de Kennedy é a marcação (semiótica, cultural) do fato. Esta é uma categoria oportuna para a compreensão do padrão valorativo do fato, que constitui a notícia. (SODRÉ, 2009: 74)
Fatos não marcados não significam fatos sem importância social e sim fatos não imediatamente relevantes para o cânone da cultura jornalística. São, portanto, normalmente desconsiderados pela marcação (pauta) da grande mídia, embora tenham alguma chance de aparecer em veículos alternativos ou serem objeto de análise em publicações de maior periodicidade (SODRÉ, 2009: 76)

A pontuação rítmica
O acontecimento, que movimenta a vida pública na sociedade moderna, é, assim o aspecto temporal do fato social. Inscrito na atualidade por meio de um artifício narrativo que o temporaliza à maneira de um gerúndio ( o tempo do está sendo), ele se presentifica, ou seja, o passado e o futuro são sentidos como um aqui e agora. Por isso, a notícia de jornal – no limite, uma reinterpretação histórica do ritmo interno da narrativa antiga – inscreve desde sempre uma diretiva de construção do tempo social pela pontuação no ritmo dos acontecimentos, que é de fato o caminho para a fixação temporal da atualidade num presente. (SODRÉ, 2009: 87)
O efeito SIG (Simultaneidade, instantaneidade e globalidade) já está definitivamente inscrito na temporalidade cotidiana, abolindo todas as distâncias espácio-temporais (SODRÉ, 2009: 89)
... dois níveis rítmicos: num primeiro nível, o que ritimiza o cotidiano são as rotinas, inscritas individual e coletivamente na vida social; num segundo nível, os acontecimentos, que pontuam – em diferentes escalas de intensidades – essas rotinas. A menos que seja totalmente imprevisto (portanto, a ruptura de um contínuo rotineiro, a exemplo da destruição das Torres Gêmeas), o acontecimento é uma pulsação, suscetível de tornar-se um ponto rítmico pela marcação do sistema informativo. (SODRÉ, 2009: 90)



SODRÉ, Muniz. A narração do fato: notas para uma teoria do acontecimento. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. 287 p. ISBN 978-85-326-3844-1.