ÉTICA
Por Danielle Denny
danielledenny@hotmail.com
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RESUMO
A importância da ética tem crescido
constantemente, em virtude do “efeito iceberg” comum na contabilidade
empresarial, a partir do séc. XX, em que aspectos tangíveis são contabilizados
e o que é realmente valioso não é calculado no balanço patrimonial nem na
demonstração dos resultados, contudo são o que mais agrega valor ao bem ou
serviço e decorrem direta ou indiretamente, em pequena ou grande medida das
atitudes éticas adotadas pelas empresas.
São esses valores intangíveis: goodwill,
marca, reputação, qualidade da governança, qualidade da gestão, histórico de
respeito aos direitos humanos, aspectos sociais e trabalhistas e a consideração
dos ecossistemas na comunidade onde a empresa opera, entre muitos outros.
Assim, não se pode mais planejar estrategicamente sem levar em conta os temas
éticos e, principalmente de sustentabilidade.
No Brasil o desafio é ainda maior, pois o tecido social está impregnado
pela corrupção, mas cabe aos jovens de hoje não comungar com essa bandalheira,
de que tudo é na base do jeitinho. É preciso romper com o conformismo de que as
coisas maléficas são imutáveis, um pouco de coragem pode ajudar. O ilícito não
pode ser parte integrante da profissão. Quando os profissionais chegam a ter
vergonha de serem honestos, os maus gestores públicos e privados se propagam.
O discurso de que "no Brasil não é bem assim, aqui, na prática a
teoria é outra”, só nos leva para um caminho pior
Sugestão de vídeos:
Um episódio do programa Aprendiz 4, em que Roberto Justus mostra que a
ética tem de prevalecer! Suborno é tão grave quanto roubo. Ética não tem grau,
ou tem ou não tem. Desculpa de que o Brasil é assim, é a maior tragédia deste
país! Somos os primeiros que têm de agir de forma diferente. Pisa na bola uma
vez e põe em xeque 26 anos de carreira exemplar! Dupla demissão!
Leonardo Boff fala sobre as raízes da Ética na religião e na razão e
sobre os princípios da Ética: cuidado com as coisas, respeito com as pessoas, responsabilidade
ilimitada, solidariedade,
A cantora de MPB, Ana Carolina, declama poema
"Só de Sacanagem" de Elisa Lucinda. “Meu coração está aos pulos malas
e cuecas viajam com o nosso dinheiro que era para pagar a saúde e a educação
dos mais pobres. Desde Cabral que todo mundo rouba. Eu sei que não dá para
mudar o começo, mas se a gente quiser dá para mudar o final"
O filme O Informante, baseado em história real de 1994, um ex-executivo
da indústria do tabaco (Russell Crowe) é convencido por um jornalista (Al
Pacino) a falar em público sobre a ética corporativa da indústria tabagista e
sobre a moral dos empresários de alto escalão que mentem em público e colocam
produtos ainda mais nocivos nos cigarros para aumentar o potencial viciante
deles, priorizando os lucros privados em detrimento do interesse público.
Ética, moral e valores
Ética é um termo que vem do grego e moral vem do latim, mas ambos
significam comportamento, costume. Portanto, etimologicamente,
"moral" e "ética" tem o mesmo significado. Contudo, a
partir de Hegel (1770 - 1831) moral passou a significar o conjunto de valores
individuais e a ética, de valores sociais. Assim, ética é a teoria ou ciência
do comportamento moral dos homens em sociedade
Com relação à moral, o indivíduo é exatamente aquilo que quer, a
consciência é o seu único juiz, pode estar de acordo com a ética de uma dada
sociedade ou contrário a ela. Ou o indivíduo é ético ou antiético, não existe
pessoa sem ética. E só são amorais aqueles incapazes de distinguir entre o
certo e o errado: as crianças e aqueles que não estão em pleno gozo de suas
faculdades mentais. Ressalva, para a legislação brasileira os índios também se
enquadram nessa categoria, pois são absolutamente incapazes.
Fichamento do livro Ética de Adolfo S. Vázquez:
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2000.
“Assim como os problemas teóricos morais não
se identificam com os problemas práticos, embora estejam estritamente
relacionados, também não se podem confundir a ética e a moral. A ética não cria
a moral. Conquanto seja certo que toda moral supõe determinados princípios,
normas ou regras de comportamento, não é a ética que os estabelece numa
determinada comunidade (...) A ética é a teoria ou ciência do comportamento
moral dos homens em sociedade. Ou seja, é ciência de uma forma específica de
comportamento humano. (...) A ética é a ciência da moral, isto é, de uma esfera
do comportamento humano. Não se deve confundir aqui a teoria com o seu objeto:
o mundo da moral. As proposições da ética devem ter o mesmo rigor a mesma
coerência e fundamentação das proposições científicas (...) A ética não é a
moral e, portanto, não pode ser reduzida a um conjunto de normas e prescrições;
sua missão é explicar a moral efetiva e, neste sentido, pode influir na própria
moral.” (VÁZQUEZ, 2000, 22-24)
“A moral efetiva compreende, portanto, não
somente normas ou regras de ação, mas também – como comportamento que deve ser-
os fatos com ela conformes. Ou seja, tanto o conjunto dos princípios, valores e prescrições que os
homens, numa dada comunidade, consideram válidos como os atos reais em que
aqueles se concretizam ou encarnam. A necessidade de ter sempre presente esta
distinção entre o plano puramente normativo, ou ideal, e o fatual, real ou
pratico, levou alguns autores a propor dois termos para designar
respectivamente cada plano: moral e moralidade. A moral designaria o conjunto
dos princípios, normas, imperativos ou ideias morais de uma época ou de uma
sociedade determinadas, ao passo que a moralidade se referiria ao conjunto das
relações efetivas ou atos concretos que adquirem um significado moral com
respeito à moral vigente. A moral estaria no plano ideal; a moralidade no plano
real. A moralidade seria um componente efetivo das relações humanas
concretas.(...) A distinção entre moral e moralidade corresponde assim àquela
que indicamos entre o normativo e o fatual e, como esta, não pode ser
negligenciada. A moral tende a transformar-se em moralidade devido à exigência
de realização que está na essência do próprio normativo; a moralidade é a moral
em ação, a moral prática e praticada. Por isso, lembrando que não é possível
levantar um muro intransponível ente as duas esferas, cremos que é melhor
empregar um termo só – o de moral, como se costuma fazer tradicionalmente – e não
dois.” (VÁZQUEZ, 2000, 65-66)
“De toda a exposição anterior podemos
deduzir uma séri de traços essenciais da moral, os quais permitem precisar o
que coincide com outras formas de conduta humana e, ao mesmo tempo, o que delas
a distingue. 1) A moral é uma forma de comportamento humano que compreende
tanto um aspecto normativo (regras de ação) quanto um aspecto fatual (atos que
se conformam num sentido ou no outro com as normas mencionadas). 2) A moral é
um fato social. Verifica-se somente na sociedade, em correspondência com
necessidades sociais e cumprindo uma função social. 3 ) Ainda que a moral
possua um caráter social, o indivíduo nela desempenha um papel essencial,
porque exige a interiorização das normas e deveres de cada homem individual,
sua adesão intima ou reconhecimento interior das normas estabelecidas e
sancionadas pela comunidade. 4) o ato moral, como manifestação concreta do
comportamento moral dos indivíduos reais, é unidade indissolúvel dos aspectos
ou elementos que o integram: motivo, intenção, decisão, meios e resultados, e,
por isso, o seu significado nào se pode encontrar num só deles com exclusão dos
demais. 5) o ato moral concreto faz parte de um contexto normativo (código
moral) que vigora numa determinada comunidade, o qual lhe confere sentido. 6) o
ato moral, como ato consciente e voluntário, supõe uma participação livre do
sujeito em sua realização, que, embora incompatível com a imposição forçada das
normas, não é com a necessidade histórico-social que o condiciona. Baseados nestes
traços essenciais, podemos afinal formular a definição seguinte: A moral é um
sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são regulamentadas as
relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade, de tal
maneira que estas normas, dotadas de um caráter histórico e social, sejam
acatadas livre e conscientemente, por uma convicção intima, e não de uma
maneira mecânica, externa ou impessoal. “ (VÁZQUEZ, 2000, 83-84)
“Como liberdade de escolha, decisão e ação,
a livre vontade acarreta, em primeiro lugar, uma consciência das possibilidades
de agir numa ou noutra direção. Contem
também uma consciência dos fins ou das consequências do ato que se pretende
realizar. Em ambos os casos, é necessário um conhecimento da necessidade que
escapa à vontade: a situação em que o ato moral se efetua, as condições e os
meios de sua realização etc. acarreta também certa consciência dos motivos que
impelem a agir, pois de outro modo se agiria-como faz, por exemplo, o
cleptomaníaco – de uma maneira imediata e irrefletida. (...) Liberdade da
vontade não significa, de modo algum, algo incausado ou um tipo de causa que
influiria na conexão causal sem ser, por sua vez causada. Livre não é
compatível – como já sublinhamos – com coação – quando esta se apresenta como
uma força externa ou interna que anula a vontade. O homem é livre para decidir
e agir, sem que a sua decisão e a sua ação deixem de ser causadas. Mas o grau
de liberdade está, por sua vez, determinado histórica e socialmente, pois sse
decide e se age numa determinada sociedade, que oferece aos indivíduos
determinadas pautas de comportamento e de possibilidades de ação. Em conclusão,
vemos que a responsabilidade moral pressupõe necessariamente certo grau de
liberdade, mas esta, por sua vez implica também inevitavelmente a necessidade
causal. Responsabilidade moral, liberdade e necessidade estão, portanto,
entrelaçadas indissoluvelmente no ato moral. “ (VÁZQUEZ, 2000, 131-132)
Valores morais e não morais “o uso do termo bom não pode levar a
confundir o bom em sentido geral, relatvo a qualquer valor (bom livro, boa
estrutura, bom relógio etc) e bom em sentido estrito, com significado moral.
Podemos falar da bondade de uma faca enquanto cumpre positivamente a função de
cortar para a qual foi fabricada. Mas a faca – e a função relativa – pode estar
a serviço de diferentes fins; pode ser utilidade, por exemplo, para realizar um
ato mau sob o ângulo moral, como é o assassinato de uma pessoa. Desde o ponto
de vista de sua utilidade ou funcionalidade, a faca não deixará de ser boa por
ter servido para realizar um ato repreensível. Pelo contrário, continua sendo
boa e tanto mais quanto mais eficiente tiver servido ao assassino, mas esta
bondade instrumental ou funcional está alheia a qualquer qualificação moral, apesar
de ter servido de meio ou instrumento para realizar um ato moralmente mau. A
qualificação moral recai aqui no ato de assassinar, para o qual a faca serviu.
Não é a faca – eticamente neutra, como o são usualmente os instrumentos, as
máquinas ou a técnica em geral – que pode ser qualificada de um ponto de vista
moral, mas o seu uso; isto é, os atos humanos de utilização a serviço de
determinados fins, interesses ou necessidade. (...) Ao estabelecer a distinção
entre os primeiros e os segundos, é preciso lembrar que os valores morais se
encarnam somente em atos ou produtos humanos e, entre estes, naqueles
realizados livremente, isto é, de um modo consciente e voluntário. “ (VÁZQUEZ,
2000, 149-150)
Sugestão de vídeos:
Mario Sergio Cortella, em Programa do Jô, explica a diferença entre
ética e moral. “Moral é a prática de uma ética. O princípio ético se transforma
em uma moral que se pratica. A moral é relativa. Ética tem uma tentativa de ser
universal.”
Artigo sobre ética, moral e valores:
Por Ercílio Denny
Moral
Toda moral é relativa, no sentido que corresponde a uma posição
livremente assumida. Há relatividade completa no significado em que nenhuma
regra absoluta limita a liberdade do homem.
O dever é o mesmo para todos os seres humanos e diferente para cada um,
na acepção de que cada pessoa deve orientar a sua vida, não para realizar a
perfeição abstrata e genérica, mas a do pleno desenvolvimento de suas
potencialidades, nas circunstâncias em que, concretamente, se encontra. Isso
faz recordar a parábola evangélica dos talentos, em que o Mestre exige mais
daquele a quem mais foi dado.
Por isso, apresenta-se a obrigação ética, de certo modo, com menos
precisão do que muitos a imaginam. A maior parte gostaria que se lhe
apresentasse um dever já feito, no qual não fosse preciso refletir, e que
resolvesse, de antemão, todos os problemas que a vida passa a apresentar.
Ora, isto é precisamente impossível. Grande parte das pessoas gosta de
"cumprir ordens". A vida só é meritória quando se aplica os
princípios no dia a dia. O dever fundamental, o primeiro, o que domina todos os
outros, é fazer, exatamente, o que muita gente quer, evitar: pensar nela,
preocupar-se com ela, refletir, formar-se para encarar a vida sob o ponto de
vista do aperfeiçoamento e do desenvolvimento, que se deve realizar.
A pessoa não está em ordem consigo mesmo se não fizer tudo o que puder
para se desenvolver, pois, enquanto não for perfeita cometerá erros por ação ou
omissão. Consentir em desenvolver as potencialidades em menos do que se pode, é
anuir em cometer muitos erros, pelos quais a pessoa tem de responder.
Encontram-se três etapas no dever humano: um absoluto absoluto, um
absoluto relativo e um relativo absoluto. O dever, que corresponde às
exigências específicas da espécie humana, é absolutamente absoluto, ou
incondicionalmente incondicionado. O dever, que corresponde à natureza
individual, é relativamente absoluto, visto ser absoluto num sentido e relativo
no outro. Por último, o dever, que se realiza por uma livre escolha, é
absolutamente relativo, pois só se realiza pela atuação da livre escolha.
O dever absolutamente absoluto é constituído de preceito universal (ex:
amar a si e o outro). O dever relativamente absoluto é formado de preceito
geral, aplicável a todo o ato e representa a intenção em cada ação (ex:
prudência, justiça, fortaleza e temperança). O dever absolutamente relativo
visa a concretude de uma ação (ex: quanto tempo devo estudar hoje).
Deve-se evitar o método de isolar cada ato, e de o submeter a um exame
sistemático em si mesmo, tratando cada ação como se pudesse agir sobre ela com
toda a liberdade, sem relacioná-la com o conjunto da própria vida. Este método
cria problemas insolúveis, pois quer reduzir o dever ao problema de fazer o bem
sem amá-lo, ou, pelo menos, abstraindo disto. É a atitude do perfeccionista,
que se preocupa com os mínimos detalhes. O dever, ao contrário, consiste em,
antes de tudo, em ter boa-vontade, em amar o bem, em fazer o que se pode...
Tudo, então, torna-se mais simples, pois centraliza-se na atitude fundamental
do espírito, na "optio fundamentalis".
Este dever é, ao mesmo tempo, mais severo e mais indulgente do que o
dever limitado à casuística de normas. Mais severo porque se opõe à satisfação
farisáica de quem cumpre, facilmente, o que se costuma chamar de hábito dos
deveres. Ensina que a sua obrigação vai muito mais longe, e que ele ainda nada
fez, estando apenas no início de seu desenvolvimento. Mais indulgente com
relação ao infeliz, vítima das circunstâncias, de um meio inadequado, de uma
educação defeituosa e de um temperamento difícil. Ele ensina a esta pessoa a
não desesperar, pois a única coisa que depende dela é a sua boa-vontade; que
ela está realizando a sua perfeição, desde que coloque os recursos de sua ação
livre a serviço da busca da perfeição.
Esta moral é profundamente humana, pois leva em conta as circunstâncias
próprias de cada um, mas exige de cada pessoa, que aproveite os recursos de que
dispõe. É só e tudo isto que exige.
Reina bastante confusão na maioria dos espíritos a respeito do sentido
da vida. Não se leva em conta, nem a unidade da vida, e nem a relação dos atos
entre si. Confunde-se o bem geral com os bens particulares. Não se percebe que
o bem em si não existe, para cada um, senão como seu bem próprio.
Concluindo, toda moral é relativa e absoluta ao mesmo tempo.
Inteligência e liberdade são condição para a moral
Quem diz dignidade, diz valor, acrescentando, ainda, alguma coisa. É um
valor especial e superior, dado ao homem por sua natureza inteligente e livre.
Consiste no fato de que o ser humano, por sua inteligência e sua vontade, é o
árbitro de seus atos, e pode ele mesmo se dirigir para um ideal de vida,
concebido com reflexão e realizado com liberdade.
Esta dignidade da pessoa e da natureza humana repousa, essencialmente,
sobre uma escala de valores percebida intuitivamente por toda a pessoa e que
coloca, em primeiro lugar, na ordem dos bens o que se relaciona ao elemento
espiritual. Desta dignidade, que constitui a pessoa árbitro do seu destino,
decorre que ela jamais deve ser tratada como um meio. A razão é um elemento
respeitável de cada ser humano, que lhe consagra e lhe confere uma imunidade.
Por seus dois constitutivos essenciais, inteligência e liberdade,
pode-se dizer que a dignidade humana é a condição primeira de toda a vida
moral. Sem ela não há apreensão do bem, da verdadeira obrigação, da
responsabilidade e do mérito. Tudo o que diminui um ou outro destes dois
elementos, leva à uma atenuação ou à um atentado à ética do indivíduo.
Dignidade humana é fundamento da moral
Pode-se ver na dignidade da pessoa o fundamento da moral. Esta tem por
fim a preparação do indivíduo à condição de homem. O fim humano sob certo
aspecto, é a perfeição da natureza, da cultura e o pleno desenvolvimento de
todas as potencialidades e faculdades, sob a direção da razão e da vontade.
A moral visa o desenvolvimento do próprio valor e da própria dignidade.
Deve trabalhar para manter a supremacia da razão na orientação da própria vida
e da própria atividade. Portanto, será bem moral tudo o que respeitar e afirmar
a dignidade humana em si e nos outros. Será mal tudo aquilo que atentar ou
tender a enfraquecer.
Moral pessoal e social
A moral pessoal pode ser construída assim: a) -- Tomar consciência da
própria dignidade, estimar a si mesmo, ter uma alta idéia da perfeição à qual
deve tender a personalidade; b) -- Respeitar a si mesmo, não tolerando nenhuma
submissão da razão e da vontade a outros elementos, e conseguir um
desenvolvimento harmonioso de si; c) -- Fazer-se respeitar pelos outros,
resistindo a todos os atentados cometidos por indivíduos e coletividades.
A moral social pode ser feita da seguinte forma: a) -- A justiça nada
mais é do que o respeito da dignidade humana no outro, que é a mesma em todos,
e constitui a base de todos os direitos. É em virtude desta dignidade que não
se deve causar dano ao próximo com relação à sua vida, á sua liberdade, á sua
reputação, á sua liberdade, ...; b) -- a caridade é o amor e a estima desta
dignidade no outro, que leva a fazer por ele tudo o que é possível ao
desenvolvimento de nobreza e grandeza que estão nele.
Alguns pensadores exageraram e deformaram este conceito. Kant (1724-1804),
por exemplo, e seus seguidores fizeram consistir esta dignidade numa autonomia
total, que levaria o indivíduo a ser senhor absoluto dos seus atos. E isto foi
levado a tal ponto que o dever, para ser dever, não deve ser imposto por
nenhuma autoridade superior à razão individual. Para eles, o princípio da
dignidade humana não admite que nenhum ser que pense, seja constrangido a
receber de fora os modos de pensar e de agir.
Se tratar de uma coação física, a afirmação é exata. Entretanto, se
referir à imposição do dever por obrigação moral de origem exterior ao
indivíduo, ela não procede.
A dignidade está ligada à perfectibilidade. Supõe que o homem não pode
encontrar nele mesmo sua própria perfeição, que ele não é o seu próprio fim,
mas que sua dignidade consiste em se dirigir a um fim superior a ele mesmo. Só
a verdade, o bem e o ser podem satisfazer as tendências do seu espírito.
Este fim não é facultativo. Ele se impõe. Daí a necessidade de uma
autoridade exterior e superior ao indivíduo. A dignidade humana consistirá em
aceitar conscientemente, e a seguir voluntariamente esta obrigação imposta pela
natureza das coisas, em conformar a razão e a vontade á inteligência e à
vontade do ser das coisas.
Em suma, a dignidade humana deve ser compreendida corretamente, e não
pode ser confundida com a autonomia absoluta. Deve ser o sentimento do próprio
valor: um ente inteligente e livre que tende para o ser das coisas, mas ente
imperfeito que depende deste ser.
A sociedade dura mais do que o homem, individualmente considerado. A
pessoa nasce numa sociedade, que existe antes dela, e continuará a existir,
quando ela vier a falecer. Ela tem, em primeiro lugar, a impressão de que algo
a ultrapassa, e de que ela recebe sem ter dado. De outro lado, o homem está apegado
a si mesmo e convencido da sua importância. Este duplo sentimento reflete-se
naquilo que está ligado à sua pessoa: ama a sua região, a casa onde cresceu, as
idéias, os hábitos e os costumes de seu meio social. Quer bem tudo isso, porque
é algo seu. Adota as crenças e os sentimentos do meio ambiente. É assim que é
formado o sentimento patriótico, feito de afeição e de orgulho.
Em seu estado espontâneo, este sentimento não é bom nem ruim, podendo
chegar a ser uma coisa ou outra. Em nome do patriotismo, são praticados as
maiores virtudes e os maiores crimes. O homem tem a impressão de que a pátria é
uma grande entidade, que ultrapassa a sua pessoa. Em razão disso, seu conceito
tem, amiúde, um conteúdo sacral.
A pátria pode tornar-se um ídolo, cujo bem constitui uma entidade em si,
diferente do bem dos cidadãos. Estes devem sacrificar-se à grandeza dela.
Dentro desta perspectiva, não é à pátria que compete fazer a felicidade dos
homens, mas a estes fazer a grandeza daquela. Entretanto, variadas vezes, alegando
o bem da pátria, o que é visado, de fato, é o poderio, o bem-estar e a
satisfação dos governantes. O absolutismo absorve os recursos do país em
proveito próprio, tentando convencer o povo de que a grandeza da pátria é o
maior dos bens.
Procura-se persuadir os povos de que se tem em vista apenas o seu bem,
despojando-os de seus recursos, principalmente de educação e de saúde, para uma
política de conquista e armamentismo.
Em princípio, todos os povos aspiram pela paz. Na prática, cada um deles
julga-se mais virtuoso do que o outro, identificando a virtude com o seu
próprio interesse. Beneficiar-se das vantagens um dos outros é, para cada povo,
beneficiar-se dos favores dos outros sem sacrificar os seus interesses. Nenhum
povo tem preocupação com a verdade e a justiça, quando as suas pretensões se
opõem às do vizinho.
Neste ponto, os governantes não se mostram superiores aos governados.
Eles participam, habitualmente, dos preconceitos e das paixões do povo. Não
existe classe dirigente que tenha espontaneamente, se reformada a si mesma, ou
que tenha renunciado a vantagens injustificadas, como não há povo que tenha
renunciado às conquistas, sem ser obrigado a isso.
O problema social constitui, também, um problema moral. As questões
técnicas tem por origem das suas principais dificuldades a imoralidade e a
corrupção.
Deve-se distinguir uma moral individual e uma moral coletiva. Na
prática, a moralidade coletiva é, geralmente, inferior à ética individual. As
classes sociais ou as nações são, entre si, menos honestas que os indivíduos, o
que deriva, em parte, do fato de que a imoralidade coletiva é acobertada pela
moralidade individual. O que mente, porque considera esta falsidade vantajosa
para a sua pátria ou para a sua classe social, julga fazer um ato de virtude.
Deste modo, quando uma nação renega a sua palavra, recusando-se a pagar as suas
dívidas, ou violando acordos internacionais, os membros da nação, e os
governantes, em primeiro lugar, persuadem-se de que fazem um ato de virtude,
porque o interesse superior da nação o exige.
É falso dizer que não há nenhuma moralidade coletiva. Existe alguma, mas
ela é inferior à individual. Esta inferioridade acentua-se pelo fato de que a
imoralidade coletiva pode, mais facilmente, cobrir-se de um véu de moralidade
aparente, e ser de mais difícil sanção. O receio de castigo não deixa de ser um
fator importante de moralidade para muitos indivíduos.
A moralidade coletiva é suscetível de desenvolvimento e de retrocesso;
ela pode progredir e regredir, dependendo, bastante, da mudança de valores
aceitos pela coletividade, como também, das circunstâncias e fatos, que
influenciam a vida social. Há condições que influenciam a moralidade coletiva,
como há as que inspiram a ética individual.
Ética e moral
Ética é um termo que vem do grego (éthos) e que significa comportamento,
costume. A palavra "moral" vem do latim (mos) e, também, significa
comportamento, costume. Portanto, etimologicamente, "moral" e
"ética" tem o mesmo significado. Foi principalmente com Hegel (1770 -
1831) que a moral passou a significar a moralidade individual, e a ética a
moralidade social.
Hoje, um termo mais em moda, que não tem ainda conotação pejorativa, é o
da "deontologia", termo grego (déon), que significa o "dever
ser".
Profissão ou ofício em grego é "kathékon", que é traduzido
para o latim por "officium", "munus",
"ministerium". Todas estas palavras envolvem o conceito de dever e de
serviço. Uma característica fundamental, que parece impor-se cada vem mais, é
que toda a profissão deve ser considerada numa perspectiva de serviço. Isto não
significa que não sejam legítimas outras finalidades pessoais, como o lucro.
Entretanto, todas devem estar subordinadas ao seu caráter social.
Ser um bom profissional é, antes de tudo, apreender as necessidades do
grupo humano em que realiza o seu trabalho, comunicando esperança e partilhando
alegria de viver. O exercício profissional é muito diferente de ostentar um
título ou de exigir respeito de seus interlocutores. Ele supõe extrema
atividade, doação permanente, preocupação com realizações, gosto de
responsabilidades, sincero e profundo amor pelos homens, perfeita dignidade de
vida.
Todo mundo se julga moralista, e pensa que pode falar sobre o bem e
sobre o mal, a vida e os seus valores, como se fala sobre a chuva e o bom
tempo, a doença e a saúde. Isto constitui um sinal de vulgaridade intelectual,
dizia Nietzsche (1844 - 1900) e, também, de decadência social. O sentimento
moral não consiste no que se sabe ou no que se pode, mas no que se quer.
"Tanto queres, quanto fazes", dizia um antigo. Em moral, o indivíduo
é exatamente aquilo que quer, na medida em que quer e tanto tempo quanto quer.
A consciência é o seu único juiz.
Recusar o dever é repudiar as condições da criação e a parte que nela
cabe ao homem. Agindo com retidão, a pessoa participa da criação, trabalhando
para a fundação de uma sociedade de irmãos e tomando sua parte de
responsabilidade no andamento do mundo. Cada movimento da natureza é uma
procura de equilíbrio entre um ser particular e o todo. Nisso consiste a ordem.
Assim, a ação moral deve estar em equilíbrio com o universo e, para tal, entrar
em suas leis.
Toda circunstância é um apelo ao qual a pessoa deve dar uma resposta. Os
acontecimentos falam: é preciso ouvir a sua linguagem. A profissão é o conjunto
das ocasiões que o indivíduo tem para viver, desenvolver e enriquecer a sua
vida. De estar em seu lugar no acontecimento de cada dia e de cada instante,
desempenhando, desse modo, seu papel no acontecimento universal.
Fazer bem o que se faz é muito mais importante do que fazer muitas
coisas. Quantidade e qualidade estão em desproporção quase infinita. Não se
trata de saber o "quanto", mas "o quê" e "o
como". É vão procurar a quantificação quando se trata da perfeição. Não é
o êxito que prova a legitimidade e o valor do trabalho, mas o testemunho da
própria consciência.
Quem pede à moralidade frutos imediatos, se acorrenta e se põe na
dependência de todas as coisas, porque os acontecimentos não obedecem aos
desejos dos homens. Quem faz o bem sem outra preocupação a não ser sua própria
retidão e a satisfação do amor, este é livre e chega sempre a bom resultado.
Semear sempre, sem esperar pela colheita.
A verdadeira vocação do homem é a de realizar plenamente a sua
personalidade servindo os seus semelhantes. O sentir-se útil através de uma
profissão é o meio particular de realizar esta vocação fundamental. Só numa
perspectiva de disponibilidade permanente em relação a outras tarefas possíveis
será isso possível. A idéia de profissão pode, ainda, ser de utilidade para
ajudar a solucionar o eterno problema da relação entre a pessoa e a sociedade.
Ética é comportamento, uso, costume, hábito
Na base da ética está uma experiência, pois ela significa comportamento,
uso, costume, hábito. O apriorismo ético é a negação da experiência. A moral é,
também um conhecimento, mas que tem, igualmente, importância prática. É através
dela que se recolhem os frutos da experiência da vida. Ela não pode se limitar
a ser uma axiologia, devendo-se ocupar de modo igual das coisas, dos
acontecimentos e do mundo, enquanto poder e força. Assim, ela também deve ser
uma ontologia.
A ética envolve tudo o que está ligado à liberdade humana e dela
decorre. Supõe, deste modo, uma atitude compreensiva e profética diante dos
acontecimentos. O seu fundamento é a hermenêutica ontológica do mundo.
O problema fundamental da ética é o do critério do bem e do mal.
Nietzsche (1844 - 1900) afirma que a vontade do verdadeiro estabelece a morte
da moral. Com efeito, a ética deve não só legitimar a ação humana, mas também
divulgar a mentira que ela comporta. O paradoxo está em que o "bem" é
colocado em dúvida. Nietzsche foi um grande moralista: "além do bem e do
mal" existe para ele uma moral suprema.
As palavras "bem" e "mal", "moral" e
"imoral", "superior" e "inferior" não expressam o
ser real, mas símbolos. Entretanto, estes não são arbitrários nem relativos,
mas podem ser universalmente válidos. A genuinidade do ser e a profundeza da
vida não são "boas" ou "más", "morais" ou
"imorais", mas apenas simbolizadas assim, para serem expressas nas
categorias do mundo. E este não constitui o ser, mas um estado do ser. Os
símbolos espaciais de "superior" e "inferior" podem
traduzir verdades de ordem moral, mas não constituem uma diferenciação ontológica.
Se a ética é simbólica, todas estas
diferenciações e avaliações também o são. O problema consiste em saber como
passar dos símbolos à realidade.
A própria existência da vida humana, com suas diferenciações e
apreciações, implica a liberdade. Em razão disso, a ética é a doutrina da
liberdade. A famigerada doutrina do livre arbítrio não corresponde totalmente a
esta e nem consegue atingí-la em sua profundidade. É uma adaptação da ética
normativa e jurídica. O livre arbítrio determina, para o homem, uma escolha
entre o bem e o mal, e a possibilidade de executar uma norma, que lhe é
imposta. O homem será "justo" se, depois de optar pelo bem, cumpre a
lei, e será considerado "injusto" se, depois de ter escolhido o mal,
negligencia a norma. A revolta de Lutero (1483 - 1546) contra a justificação
pelas obras comporta uma indiscutível profundeza. a justiça não vem da lei.
O "livre-arbítrio" pode se tornar uma fonte de determinismo: o
homem se encontra obrigado a escolher entre o que lhe é imposto, devendo
cumprir a lei, sob pena de ser responsabilizado. No entanto, a liberdade pode
ser entendida não só como possibilidade de realização de uma norma mas, também,
como uma força criadora e transformadora do mundo. A liberdade, condição
fundamental da vida humana, não pode existir sem a possibilidade do bem e do
mal.
A vida humana é composta de paradoxos, no qual o "bem" e o
"mal" se entrelaçam
A ética jurídica normativa, para o qual a liberdade é apenas a condição
de fazer o bem, não entende este problema. A vida humana é composta de
paradoxos, no qual o "bem" e o "mal" se entrelaçam e se
transformam um no outro. A tragédia da ética é, antes de tudo, a que seu
problema fundamental não é o da norma e nem o da lei, nem do bem e nem do mal,
mas das relações entre as pessoas e as coisas.
Existe uma interação contínua entre os indivíduos e seu meio ambiente
natural e social. A harmonia social contribui para o equilíbrio individual. Há
uma interdependência entre o bem estar individual e o social. As necessidades
do cosmo são as necessidades da pessoa, os direitos do indivíduo são os
direitos do planeta.
Contrariamente ao que se pensa, a moral não é "perfumaria" em
relação à ciência e à tecnologia, mas constitui a sua própria base e força
propulsora. A transformação para um sistema social e econômico equilibrado
exigirá uma mudança ética: da auto-afirmação e da competição para a cooperação
e a justiça social, da expansão para a conservação, do ter para o ser.
Ética e moral na sociedade contemporânea e no capitalismo
Na Antiguidade, a característica era a centralidade divina. A Revelação
divina inspirava a razão. Havia produção escravista ou servidão e autoridade
fundada na tradição. Na Modernidade, surge o Humanismo, no qual o homem passa a
ser o centro do universo e a razão ligada à ciência e política passa a ser a
fonte de iluminação (por isso o termo iluminismo). Busca regras gerais e
universais acessíveis pela razão. Na Pós-Modernidade consciência das limitações
e da existência intrínseca de conflitos.
Excertos bibliográficos:
BAUMAN, Zygmunt. Ética pós-moderna. 2. ed. São Paulo: Paulus, 2003.
(...) o pensamento e a prática morais da modernidade estavam animados
pela crença na possibilidade de um código ético não ambivalente e não aporético[1].
Talvez ainda não tenha encontrado esse código. Mas com certeza ele está à
espera na virada da esquina. Ou na virada da próxima. É a descrença nessa
possibilidade que é pós-moderna, pós não no sentido “cronológico”(não no
sentido de deslocar e substituir a modernidade, de nascer só no momento em que
a modernidade termina e desaparece, de tornar a visão moderna impossível uma
vez chegada ao que lhe é próprio), mas no sentido de implicar (na forma de
conclusão, ou de mera premonição) que os longos e sérios esforços da
modernidade foram enganosos, foram empreendidos sob falsas pretensões e são
destinados a terminar – mais cedo ou mais tarde – o seu curso; que, em outras
palavras é a própria modernidade que vai demonstrar (se é que ainda não
demonstrou), e demonstrar além de qualquer dúvida, sua impossibilidade, a
vaidade de suas esperanças e o desperdício de seus trabalhos. O código ético a
toda prova – universal e fundado inabalavelmente – nunca vai ser encontrado;
tendo outrora chamuscado muitíssimas vezes nossos dedos, sabemos agora o que
não sabíamos então ao embarcarmos nessa viagem de exploração: que uma
moralidade não aporética e não ambivalente, uma ética que seja universal e
“objetivamente fundamentada”, constitui impossibilidade prática; talvez também
um oxímoron, uma contradição nos termos. (BAUMAN, 2003, 15)
Sugestão de vídeos:
O professor Luiz Felipe Pondé discorre sobre a pós-modernidade ser antes
de tudo um tipo de consciência diante dos fracassos da utopia moderna. A
aceleração do tempo é intrínseca, corremos sobre uma fina camada de gelo se
pararmos afundamos. E não temos garantia de nenhuma relação, elas são líquidas.
Na modernidade se pretendia haver solidez e a característica era a busca dessa
verdade solida que era racionalmente alcançável. O Medieval tinha fé em Deus. O
Moderno acreditava no progresso alcançável pela razão. O pós moderno está
consciente de que há um vazio, pode-se seguir qualquer direção progredir ou
regredir:
Luiz Felipe Pondé “O problema humano é moral. Jornalista tem poder então
tem drama ético ainda maior que a maioria das pessoas.
Entrevista com Zygmunt Bauman
Ética e moral nas organizações
Na antiguidade, a ética vigente considerava o lucro um pecado e toda a
aquisição de riquezas acima do necessário à sobrevivência era excesso que
pertencia à sociedade e deveria ser entregue à Igreja Católica, para
distribuição em forma de benefícios e serviços aos necessitados Com a reforma
protestante e a ética calvinista, a acumulação de capital e o lucro passaram a
ser vistos como agradáveis a Deus, legitimou-se a riqueza e o fruto do
trabalho, como sinal de eleição por Deus. A partir da consolidação do capitalismo o lucro passou a ser visto
como justa recompensa por serviços prestados e produtos oferecidos.
Questionamentos sobre a postura das organizações:
Quão morais são os resultados?
Benéficos para quem? Realmente benéficos para o coletivo?
Problemas éticos contemporâneos nas organizações:
Como equacionar interesses individuais e responsabilidade social?
Como perseguir o lucro sem ferir os interesses dos stakeholders?
Como agir moralmente se todas as atividades são mercantilizadas?
Exemplos de ações que são consideradas
imorais no mundo corporativo:
–
Desfalques
–
Dívidas fiscais fraudadas, evasões fiscais
–
Propinas
–
Tráfico de informações privilegiadas e
espionagem industrial
–
Pirataria
–
Ataques de hackers
–
Contratação de executivos concorrentes para
obtenção de informações confidenciais
–
Fraudes produtos (peso, medida)
–
Subornos, extorsões, doações ilícitas a
políticos
–
Lavagem dinheiro
–
Furtos
–
Fraudes em balanços
Para muitos: para ganhar dinheiro é preciso ser
pragmático. Preceitos filosóficos e religiosos só atrapalham.
Mas no ambiente
das organizações: Stakeholders e contrapartes são vulneráveis a produtos,
ações e mensagens das organizações. As decisões organizacionais não são
neutras. As organizações, ao decidir, fazem escolhas entre diferentes cursos de
ação e consequências. Cidadania disposta a retaliar as empresas, mídia papel
ativo e capitalismo social se consolida. Organizações tem Imagem a resguardar,
patrimônio essencial para a continuidade do negócio. Se produtos deixam de ser
confiáveis, deixam de ser consumidos. Não se consegue desvincular moral e
interesses empresariais / moral e pressões sociedade civil.
Organizações tem de fazer mais do que manda a lei, pois transcendem as
responsabilidades legais por 3 razões:
–
Degradação do meio ambiente pelo esforço
produtivo
–
Assimetria de informações que as empresas
possuem a respeito dessa degradação
–
Incapacidade do Estado de dar conta de suas
obrigações
Excertos bibliográficos:
SROUR, Robert Henry. Poder, Cultura e Ética nas Organizações. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2005
(...) a natureza das empresas não é amoral, pois suas atividades não
pairam acima do bem e do mal. Se assim fosse, as operações econômicas das
máfias seriam legítimas (...) queiram, ou não, as empresas convivem com os
padrões morais que suas contrapartes partilham. (...) as empresas têm uma
imagem a resguardar, patrimônio essencial para a continuidade do próprio
negócio. A imagem da empresa não pode ser vilipendiada impunemente, nem pode
ser reduzida à mera moeda publicitária, porque ela representa um ativo
econômico sensível à credibilidade que inspira (...) Em primeiro lugar, não há
como desvincular moral e interesses empresariais, ou moral e pressões operadas
pela sociedade civil. Assim, o importante não é saber se a empresa dispõe de
uma “essência moral”, mas se as consequências de suas decisões são ou não
benéficas para a maioria de suas contrapartes (...) Em segundo lugar, vale a
pena não confundir moralidade e legalidade (...) Por exemplo, no Brasil de hoje,
é: legal e moral fabricar detergentes biodegradáveis; legal, porém imoral,
produzir certos pesticidas ou projetar filmes pornográficos; ilegal e moral
jogar no jogo do bicho ou comprar algum gadget contrabandeado; ilegal e imoral
praticar o tráfico de drogas (...) Em terceiro lugar, se as empresas permitirem
que se formem moralidades alternativas em seu seio, moralidades que estejam em
desacordo com sua própria cultura organizacional, correm o risco de ficar sem
identidade (...) como as contrapartes da empresa dispõem de certa soma de
poder, elas podem se mobilizar e retaliar a empresa que desrespeitar normas
básicas do trato com o público. (SROUR, 1998: 292)
BETIOL Luciana S. (e outros). Compra sustentável: a força do consumo
público e empresarial para uma economia verde e inclusiva, FGV, São Paulo,
2012. Disponível em: http://www.gvces.com.br/arquivos/130/CompraSust_web_dupla.pdf:
O poder do consumo dos setores empresarial e governamental é estratégico
para a conquista de um novo patamar ecosocioeconômico. Apesar das barreiras,
naturais quando se mexe em hábitos já arraigados na gestão, aos poucos a
sociedade compreende as conexões existentes entre aquilo que compramos e a conservação
dos recursos do planeta para o suprimento das necessidades atuais e futuras,
dentro de padrões justos e equitativos. Nesse cenário multiplica-se o conceito
de “compras sustentáveis”: aquelas que consideram fatores sociais e ambientais
juntamente com fatores financeiros nas tomadas de decisão de compras. Segundo o
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), trata-se de olhar
para além dos tradicionais parâmetros econômicos (preço, prazo e qualidade) ao
tomar decisões com base em avaliação do ciclo de vida dos produtos, os riscos a
ele associados, as medidas de sucesso e implicações para o ambiente e para a
sociedade, podendo incluir aspectos como uso de água e energia, geração de
resíduos e emissões de GEE, diversidade étnica e de gênero, segurança no
trabalho e no transporte de cargas, direitos humanos, compras locais e de
pequenas empresas (BETIOL, 2012, 22)
Todos os atores envolvidos nas relações de consumo e produção impactam e
são impactados mutuamente. Cada ator deve repensar as suas formas de consumir e
de produzir, utilizando os meios disponíveis para fomento de um sistema com
mais atributos de sustentabilidade. (...) Ao se engajar em uma proposta de
desenvolvimento sustentável, o poder
público deve interceder para transformar padrões produtivos e as formas de se
comprar e consumir. Para isso, pode promover estilos de vida e comportamentos
mais sustentáveis, remodelar sua própria infraestrutura, elaborar normas e
criar incentivos econômicos favoráveis à conservação dos recursos naturais e à
felicidade humana. Isso significa, entre outras ações, abolir ou revisar
políticas que dificultam o consumo e a produção sustentável, criar políticas
que promovam e proporcionem padrões de vida fundados em bem-estar, e melhorar o
desempenho e os procedimentos das contratações públicas. Visando induzir a
transformação e adaptação do mercado, o poder público pode instituir subsídios
e incentivos fiscais a atividades mais sustentáveis – como a produção
agroecológica, por exemplo – e, por outro lado, eliminar os incentivos e
aumentar a tributação de atividades que geram impactos negativos aos
ecossistemas e à sociedade, como as indústrias altamente dependentes de
petróleo. Ainda que todas essas ações sejam realizadas, é essencial que a
administração pública faça suas compras e contratações de forma sustentável,
sendo exemplo para a sociedade e para as empresas, fomentando um mercado mais
equitativo e ético (BETIOL, 2012, 24)
(...) há espaço para evoluir no sentido de um tratamento mais integrado
de atividades hoje pontuais e no ingresso em temas que não constavam na agenda
das instituições:
•
Estabelecer padrões mínimos para a gestão de compras, considerando atributos de
sustentabilidade.
•
Trabalhar com sistemas de medição de desempenho, reportá-los e submetê-los à
verificação por terceira parte a fim de dar transparência e demonstrar evolução
nas atividades de produção e consumo sustentáveis.
•
Disponibilizar informações ao comprador por meio de banco de dados online com
indicação de itens, produtos e serviços, bem como critérios específicos que
facilitem a prática da compra sustentável.
•
Investir em sistemas de capacitação e formação de colaboradores.
•
Criar um órgão de controle e certificação nacional, o que pode popularizar e
reduzir o custo de produtos e serviços com atributos de sustentabilidade.
•
Cooperar: há ganhos potenciais que podem emergir da parceria entre grandes e
pequenas empresas, governos, órgãos de controle e outros setores públicos,
ONGs, institutos de tecnologia e centros de estudos e pesquisas.
•
Trabalhar com atributos de sustentabilidade ligados à precaução e não somente à
prevenção de danos previstos.
• Aderir
a sistemas de autorregulação, com padrões de desempenho mínimos, tanto para
produção quanto para consumo sustentável, indo além das determinações legais.
•
Trabalhar junto ao Poder Público na transformação dos avanços advindos de
sistemas de autorregulação em normas de aplicação em todas as empresas,
fomentando um círculo virtuoso de evolução.
•
Trabalhar a formulação pública de instrumentos econômicos para produção e
consumo sustentáveis, de modo a assegurar e ampliar mercados com essa
característica.
•
Dar transparência a processos produtivos, à origem e à qualidade de insumos
utilizados.. (BETIOL, 2012, 130)
QUESTÕES:
É ou não ético
roubar um remédio cujo preço é inacessível, a fim de salvar alguém, que, sem
ele, morreria? Seria um erro pensar que, desde sempre, os homens têm as mesmas
respostas para questões desse tipo. Com o passar do tempo, as sociedades mudam
e também mudam os homens que as compõem. Na Grécia Antiga, por exemplo, a
existência de escravos era perfeitamente legítima: as pessoas não eram
consideradas iguais entre si, e o fato de umas não terem liberdade era
considerado normal. Hoje em dia, ainda que nem sempre respeitados, os Direitos
Humanos impedem que alguém ouse defender, explicitamente, a escravidão como
algo legítimo. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Fundamental.
Ética. Brasília, 2012. Disponível em: . Acesso em: 16
jul. 2012 (adaptado).
Com relação a ética e cidadania, avalie as afirmações
seguintes.
I. Toda pessoa tem direito ao respeito de seus semelhantes,
a uma vida digna, a oportunidades de realizar seus projetos, mesmo que esteja
cumprindo pena de privação de liberdade, por ter cometido delito criminal, com
trâmite transitado e julgado.
II. Sem o estabelecimento de regras de conduta, não se
constrói uma sociedade democrática, pluralista por definição, e não se conta
com referenciais para se instaurar a cidadania como valor.
III. Segundo o princípio da dignidade humana, que é
contrário ao preconceito, toda e qualquer pessoa é digna e merecedora de
respeito, não importando, portanto, sexo, idade, cultura, raça, religião,
classe social, grau de instrução e orientação sexual.
É correto o que se afirma em
A I, apenas.
B III, apenas.
C I e II, apenas.
D II e III, apenas.
E I, II e III.
Resposta E
Quanto às regras gerais de conduta, os participantes de um
negócio na BM&F deverão observar:
a) A legislação e a regulamentação em vigor, os princípios
de probidade e boa-fé e os estatutos sociais, as regras e os procedimentos da
BM&F
b) Seus próprios valores, inexistindo um procedimento padrão
para a tomada de decisão de acordo com as regras seguidas pela BM&F
c) As regras morais e cívicas que vigoram na sociedade, onde
inexistem regras a serem seguidas
d) As regras apresentadas a cada área, que devem ser
seguidas somente em casos específicos
Resposta A
Os princípios constantes do Código de Ética da BM&F devem:
a) Impor normas rígidas aos participantes e aos sistemas de
negociação e/ou aos sistemas de registro. As normas devem ser abrangentes o
suficiente de tal forma que, associado a cada desvio de conduta, existir uma
norma que pode ser aplicada
b) Fornecer uma noção breve e intuitiva das normas
intrínsecas seguidas na sociedade, de tal forma que o esperado é que os
participantes nos mercados sejam educados e tenham bons tratos
c) Nortear a conduta dos participantes nos mercados e
sistemas de negociação e/ou ainda dos sistemas de registro, incumbindo ao
Comitê de Ética decidir quanto da sua aplicação e propor sua modificação a
qualquer tempo
d) Ser seguidos pelo Comitê de Ética de maneira informal,
uma vez que inexiste um sistema de penalidades
Resposta C
Manifestações públicas em nome da BM&F:
a) Podem ser feitas por qualquer um de seus funcionários,
pois cuidados a respeito desse assunto são desnecessários, já que é impossível
que se forme distorções a partir dessas manifestações
b) Devem ser feitas com muito cuidado, com o objetivo de
evitar distorções no processo de formação de preços nos mercados administrados
pela BM&F
c) Podem ser feitas pelos detentores de cargos
administrativos elevados e manifestações realizadas em nome próprio se
desvinculam das manifestações feitas em nome da BM&F
d) Estão proibidas a qualquer membro e, uma vez feitas, os
responsáveis responderão de acordo com o Código de Ética
Resposta B
Ética é:
a) um conjunto de valores morais e princípios que norteiam a
conduta humana na sociedade.
b) um conjunto de comportamento correto e relacionado à
conduta humana dentro de uma sociedade organizada.
c) a maneira como os seres humanos se comportam uns com os
outros.
d) o princípio fundamental para que o ser humano possa viver
em família.
e) um comportamento que se deve ter apenas quando se estiver
trabalhando.
Resposta A
A ética serve para que se possa existir certo equilíbrio e
funcionamento social de qualidade, fazendo com que ninguém saia prejudicado.
Neste ponto de vista, a ética, embora não possa ser confundida com as leis,
está diretamente voltada com:
a) a educação das pessoas
b) o sentimento de justiça social
c) o medo da sociedade de errar
d) a educação dada na infância
e) o pensamento de pessoas que possuem conhecimentos profundos
Resposta B
A ética é construída por uma sociedade com base:
a) na genética que se passa por geração
b) na educação que é dada nas escolas
c) nos ensinamentos oferecidos nas faculdades
d) nos meios de comunicação como TV e rádio.
e) nos valores históricos e culturais.
Resposta E
Um ser humano que não segue a ética da sociedade a qual faz
parte é denominado de:
a) antiético
b) antissocial
c) imoral
d) excluso ou excluído
e) moralista
Resposta A
A ética na área de pesquisas biológicas é denominada:
a) bioética
b) ética na saúde
c) ética na ciência
d) ética social
e) ética profissional
Resposta A
Sobre a proposta de lei de iniciativa da Câmara dos
Deputados que visa a criminalizar a publicação pela mídia de informações
sigilosas relacionadas a processos criminais julgue verdadeiro ou falso.
( ) Trata-se de um
cerceamento à liberdade de expressão e uma tentativa de coibir a boa prática do
jornalismo investigativo.
( ) Está de acordo
com a constituição que visa a criminalizar jornalistas pela publicação de
qualquer tipo de documento público sigiloso.
( ) Um documento
reservado ou secreto da Justiça, da polícia ou do Ministério Público deve ter a
sua confidencialidade mantida pelo agente responsável no âmbito do Estado. Já o
jornalista que recebe uma informação de interesse público, sigilosa ou não, tem
o dever de publicá-la.
( ) Ao propor que
jornalistas passem também a ser responsáveis criminalmente pelo vazamento de um
documento sigiloso – ao publicar o seu conteúdo – a Câmara estará criando uma
lei da mordaça incompatível com o livre exercício da imprensa no país.
Resposta V, V, F, V
Sobre o caso Burson-Marsteller Facebook e Google julgue
verdadeiro ou falso.
( ) A
Burson-Marsteller agiu dentro de suas atribuições regulamentares de agência de
relações públicas.
( ) Para favorecer
o Facebook, a Burson-Masterller recrutou jornalistas e blogueiros para
prejudicar a imagem do Google.
( ) Para denegrir o
Facebook, a Google usou a assessoria Burson-Masterller.
( ) O Facebook
contratou a Burson-Marsteller, do grupo WPP, para influenciar jornalistas e
técnicos em segurança a elaborar matérias que questionassem a prática do Google
de reunir informações de certas contas de usuários do Facebook e de outras
redes sociais a fim de montar uma lista de "relações sociais" de cada
usuário na Internet. O Facebook informou previamente que estava por trás da
campanha.
Resposta F, V, F, F
Sobre o caso da Escola Base julgue verdadeiro ou falso.
( ) As acusações
tidas como verdadeiras e publicadas na imprensa foram: abuso sexual, uso de
substância entorpecente e transmissão de doenças sexualmente transmissíveis.
( ) O direito à
informação contém o direito de ser informado e o dever de informar. Os
jornalistas agiram de acordo com esse dever, pois divulgaram o que declarava o
servidor público estadual, Delegado de Polícia, presidente do inquérito
policial, de modo imparcial e verídico.
( ) Nada foi
encontrado nas diligências de busca e apreensão realizadas na Escola Base e nas
residências dos acusados.
( ) A liberdade de
imprensa é um direito constitucional (art. 139, III e 220, § 1º). Mas nenhum
direito é absoluto. Os seus limites também constam da constituição: a dignidade
da pessoa humana (art. 1º, III); a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas (art. 5º, X); a presunção de inocência (art. 5º, LII); o
devido processo legal (art. 5º, LIV); a ampla defesa (art. 5º, LV).
Resposta V, F, V, V
Sobre os conselhos na área de relações públicas julgue
verdadeiro ou falso.
( ) Compete ao
CONFERP: criar resoluções e outros atos que disciplinem a atuação das regionais
e dos profissionais. Com isto, é estabelecida uma unidade de procedimentos que
caracterizam a profissão em todo território nacional. Compete aos Conselhos
Regionais cumprir e fazer cumprir as normas que regem a profissão e realizar as
atividades de fiscalização e orientação ético-profissional em suas respectivas
jurisdições.
( ) Uma empresa
cujo objeto seja prestação de serviços de Relações Públicas para obter registro
no Conselho Regional não precisa ter profissional técnico responsável formado
em Relações Públicas. .
( ) O Conselho
Federal e os Regionais de profissionais de Relações Públicas mantêm Comissão de
Ética para: assessorar na aplicação do Código de Ética e julgar as infrações.
( ) Uma empresa
cujo objeto seja prestação de serviços de Relações Públicas para iniciar suas
atividades precisa ser obrigatoriamente registrada no Conselho Regional.
Resposta: V, F, V, V
Julgue verdadeiro ou falso.
( ) A decisão do
Supremo Tribunal Federal (em 2009) que derrubou a Lei de Imprensa, lei que,
desde 1967, regulou e puniu as atividades jornalísticas, foi um marco histórico
a favor do jornalismo e impediu que novos casos de censura continuassem a
surgir no Brasil.
( ) Sem a Lei de
Imprensa, tornou-se comum o uso dos Código Civil para evitar publicações. Três
artigos desse Código se tornaram os novos inimigos da imprensa. O de número 17
diz que o nome da pessoa não pode ser utilizado em publicações para expô-la ao
"desprezo público". O artigo 20 diz que o uso da imagem da pessoa
pode ser proibido, "a seu requerimento", para proteger sua fama,
honra e respeitabilidade. Por fim, o artigo 21 diz que a vida privada é "inviolável".
( ) No Brasil são
bastante comuns as liminares, decisões provisórias, nas quais, na dúvida, o
juiz impede temporariamente a publicação de uma reportagem.
( ) Mesmo que as
liminares sejam logo derrubadas pelos tribunais de Justiça, podem causar
prejuízo irreparável à imprensa, pois, para o jornalista, é imediato o
interesse de divulgar fatos do dia ou da semana. Se o jornal não puder publicar
determinada matéria no dia, ela pode simplesmente perder interesse no futuro.
Resposta: F, V, V, V
Ética nas palavras de Ercílio A. Denny
Artigos publicados no Jornal de Piracicaba em diversas datas
ETICA
A ética da lei não existe apenas enquanto ética social. Ela se torna,
também, uma ética filosófica, que vai buscar o seu fundamento sobre a liberdade
e a autonomia, isto é, sobre a faculdade de se reger por leis próprias ou
ainda, de escolher as leis que regem a sua conduta. Tornando-se filosófica,
esta ética é normativa e idealista. Ela não é autoritária e heterônoma, ou
seja, não recebe do exterior a lei a que deve se submeter.
O caráter autônomo deste tipo de ética revela o seu caráter jurídico,
porque a autonomia é, apesar de tudo, uma “nomia”, ou seja, uma lei, uma norma.
A máxima moral kantiana, segundo a qual o homem deve ser tratado não como um
meio, mas como um fim em si mesmo, é comprometido pelo fundamento legalista da
ética, porque todo homem se torna um instrumento de realização de uma norma
abstrata, impessoal, universalmente válida.
Desta maneira, a ética é livre, pois ela comporta uma lei em si mesma,
mas o homem não, pois não pode dispor de si e nem é autônomo, estando
subordinado integralmente ao preceito e à norma. É em razão disso que Kant
(1724 - 1804) rejeita a parte emocional da vida. Para ele, a pessoa não é um
valor, mas apenas um princípio formal, universal e legalista. Ele não dá espaço
à individualidade, ao problema ético em sua unicidade, que exige solução única
e criativa. A ética legalista de Kant se opõe ao eudemonismo, isto é, da
felicidade enquanto fim da vida, e aceita o princípio abstrato e normativo do
bem, negligenciando a situação da pessoa humana. O fato concreto e individual
escapa sempre do pensamento legalista. Ele sempre valoriza o bem abstrato,
esquecendo-se da concretude da situação humana.
Este tipo de pensamento, que é velho na História, acredita que a
perfeição humana está no “adimplemento” da lei. Afirma que o homem é
essencialmente bom, não precisando de nenhuma ajuda para agir bem. Contra este
moralismo e racionalismo é que se revoltou Lutero (1483 - 1546). Todo moralismo
é um juridismo fingido, que ignora deliberadamente o indivíduo, a pessoa, o ser
vivo. O normativismo ético-jurídico só é aplicável aos casos gerais, mas não se
adapta à concretude, que exige uma solução individual e criadora.
Toda a dificuldade do problema está em que a ética, jurídica é
realizável. Pode-se cumprir a lei até os mínimos detalhes e se tornar “justo”
segundo ela. Esta situação alimenta a soberba humana. O ser humano passa a
acreditar que a perfeição consiste em cumprir as exterioridades da lei. O fingimento
legalista é um elemento tão profundo e persistente da natureza humana, que ele
desfigura todo o sentido da vida: o indivíduo se considera justo, puro eleito e
salvo pelo fato de ser um cumpridor das exteriordades normativas. A ética
legalista é realizável, mas ela é incapaz de lutar contra os pensamentos, e de
transformar o estado interior e psíquico do ser humano. Em si, ela não implica
a “metanoia” (conversão interna).
Em nome da justiça, do amor ou de qualquer outra intenção, a lei não
pode ser abrogada, mas cumprida. As avaliações, segundo a lei são simples e
fáceis. Entretanto, as apreciações exigidas de um homem consciente e
responsável são extremamente difíceis e complexas. “Fazer justiça” não é,
apenas, a dedução de uma solução a partir de uma norma geral. As apreciações
justas devem sempre superar o legalismo, entretanto, sem cair na anomia, que
gera o arbítrio. Deve-se ver, com clareza, que o legal nem sempre é o justo e
nem constitui o direito. Este é uma realidade bem mais ampla que a norma.
A lei, se bem que ignore a pessoa viva, concreta, individual e única,
não conseguindo penetrar em seu íntimo, entretanto, ela a protege dos atentados
e das violências dos outros indivíduos. Mesmo que o homem odeie, ele não pode
roubar, matar ou praticar qualquer violência. Não se pode descumprir a norma,
sob o pretexto de ser autêntico. O que procede da intenção é, sem dúvida,
superior ao que resulta da lei. Entretanto, o superior não abole o inferior,
mas completa-o. As duas ordens coexistem.
O conflito que se segue entre a lei e a inovação, entre a ética jurídica
e da criatividade, se encontra em todos os problemas éticos concretos. Em
certos momentos, é a ética normativa que se mostra hostil à liberdade, e em
outros, ao contrário, é a intenção e a criatividade que atrapalham. Assiste-se, pois, a um duplo
processo: de uma parte, a intromissão de um juridismo na ordem da inovação, e,
de outra parte, a ingerência de um princípio criativo, já desfigurado pelo
juridismo, na ordem da lei. Tanto um como outro destes processos alienam o
homem. Constata-se como a vida é mutilada pela lei, onde ela deveria ser
orientada pela criatividade, e, também, quanto ela é deformada pela inovação
misturada com a violência, onde dever-se-ia deixar à lei a defesa dos direitos
imprescritíveis.
A corrupção em todos os campos da vida pública obedece os fatores
vinculados a um crescente individualismo na vida social e a um abandono
daquelas opções que reconhecem a pessoa humana como a parte mais valiosa e
importante de uma sociedade.
Quando o cidadão se torna indivíduo, o único que importa é o sujeito
mesmo e o que lhe interessa. Neste caso, não há um mundo articulado mas milhões
de pequenos mundos, que definem as suas fronteiras em razão de suas próprias
conveniências. A partir desta perspectiva as leis não são mandados de
cumprimento obrigatório. Seu adimplemento dependerá da conveniência para cada
um. Se bem que, em razão da coerção cada vez maior do direito, o descumprimento
das normas pode causar-lhe maiores prejuízos. só em razão disso é que a
legislação é “aturada”.
Este isolamento do homem parece paradoxal, numa época em que o mundo
está atulhado de informação, que ele não tem tempo nem em pensar em processar.
O sujeito sentado frente ao televisor ou ao seu computador é a quem ela é
dirigida, e é a partir daí que ele vê o mundo. Cada dia aparece mais claro que
a busca exagerada da informação é um afastamento da formação. O mundo é
apresentado através de seus resultados, isto é, os produtos, aos quais só tem
acesso os que tem o dinheiro para a compra destes bens.
Bens, que poderiam ser chamados de incorpóreos passaram a ser estimados
apenas como meios para a consecução de fins tangíveis. A paz social e a
segurança jurídica são apreciadas tão só enquanto benéficas à aplicação do
capital, que permite a ampliação do mercado de consumo. O mercado parece ser o
centro de orientação de toda a construção social contemporânea.
Como não há acordo básico do que é o “ser”, o único ponto referencial é
o “ter”. Esta referência é tangível e percebida por todo o mundo. Imersa neste
mundo é que entra a corrupção. Corromper é o ato pelo qual se incita uma pessoa
a preterir os seus deveres para com os demais, em troca de um benefício
individual para si ou para outrem.
Enquanto a pessoa tem consciência de suas obrigações para com os demais,
e encontra nesse comportamento um reconhecimento social, as possibilidades de
aceitar suborno são bem tênues. Ao contrário, quando as obrigações sociais não
estão definidas, ou o seu cumprimento não é valorizado, então, não há nenhum
critério de comportamento. Neste ambiente, a corrupção grassa: tem-se vergonha
de ser honesto.
A luta contra a corrupção se complica quando a população tem um duplo
critério com relação a ela. De uma parte, ela entende que as pequenas
gratificações que se outorgam a funcionários de baixo escalão constituem uma
espécie de complemento de salário a que eles tem direito De outro lado, ela se
escandaliza com atos de corrupção maiores, quando, com raridade, são alardeados
pelos meios de comunicação. Estes atos ímprobos só são divulgados porque houve
uma colisão de interesses entre as classes dirigentes; caso contrário, não
seriam publicados. Nestes dois casos, o aliciamento é uma questão quantitativa
e não qualitativa, é um problema de conveniência e oportunidade, e não assunto
permanente. Afirma-se, de forma coloquial, que “é preciso saber quando fazer e
como fazer”. Portanto, o problema não é fazer, mas escolher as circunstâncias
adequadas para estas ações, que desagregam uma convivência ordenada.
Neste contexto, o homem passa a desconfiar de todas as utopias, deixa de
crer na História como projeto. Aderindo ao pragmatismo, passa a desconfiar e a
desrespeitar todas as instituições. O futuro deixa de existir e a memória
desaparece. Havendo permissividade plena, ele perde a noção do bem e do mal,
desaparecendo ou relativizando o sentido de culpa. Instalado o individualismo
exacerbado, não há compromisso além daquele que tem para consigo mesmo. A
informação é substituída pelo conhecimento. O esoterismo é estabelecido como
porta de escape para o desconhecido. A lei é vista como um obstáculo de
percurso a ser superado.
Este cidadão não pode ter ética, e em seu redor só há leviandade e
corrupção. Este ser humano de enriquecimento fácil, de consumismo, da fuga
através da droga, é que forma a sociedade e lhe transmite os seus “valores”.
Há, pois, uma cultura de corrupção, com o ser humano cada vez mais adaptado a
ela, que precisa ser superada...
O sistema ecológico do mundo é um complexo que tem caráter global.
Trata-se de um único conjunto de interrelações, de um único todo e de um todo
único, que constitui o espaço vital chamado terra. A consciência ecológica deve
se referir à globalidade, e a proteção ambiental deve se direcionar para o
todo.
Meio ambiente diz respeito a todos, esteja ele doente ou não. Os homens
estão dentro deste planeta para sobreviver ou morrer. O sistema ecológico
terrestre constitui um bem comunitário com o qual todos os homens escaparão ou
perecerão. Todos os habitantes da terra repartem o destino do ecossistema que
os rodeia. Se o meio ambiente pertence a todos, a responsabilidade por ele
também.
Gerações futuras, que acabaram de adentrar o planeta, devem encontrar
aqui um lar habitável. Seres humanos, que ainda não nasceram, também têm
direito a uma casa confiável e ecologicamente suportável.
Proteção ambiental é uma questão de honestidade para com os
descendentes. No âmago da questão, a terra está emprestada a esta geração, para
que a administre e a proteja de forma responsável e cuidadosa. Meio ambiente é
herança, que cada geração deve à seguinte. Ter consciência ecológica é possuir
a visão das diversas gerações. Proteção ambiental significa atender às gerações
futuras, um serviço ecológico à humanidade de amanhã. Poluição ambiental é
descaso frívolo de uma herança, desperdício irresponsável de um capital
ecológico, creditado em mãos supostamente fiéis.
Para o bem da vida no futuro, há necessidade de assumir uma posição
correta sob o ponto de vista ético, e ter em conta que a proteção do ambiente é
uma tarefa comunitária. Todos fazem parte da História ecológica. A visão
egoísta das necessidades ambientais gera o idiota ecológico. Na etimologia
grega, “idiota” (tó ídion) é o que só considera a si próprio e só conhece o seu
ponto de vista. Idiotice ecológica embota a sensibilidade para o caráter
coletivo do ambiente e de seus recursos.
Há necessidade de uma ciência ecológica geral para defender o homem daquela especialização
científica que gera o isolamento total do indivíduo. A virtude da sabedoria
gera a capacidade de estimular a compreensão das relações essenciais.
Raciocinar é o primeiro passo para agir de forma inteligente. Inteligência leva
à capacidade de pensar em escala temporal ampla, e planejar o final ou o
resultado do desenvolvimento com responsabilidade. Desta maneira, proteção
ambiental inteligente é, antes de mais nada, prevenção ambiental, com medidas
preventivas e profiláticas.
Há que se ter capacidade de aprendizado, pois sem ela, sob condições
normais, nenhum ser humano consegue alcançar conhecimentos ecológicos que o
habitem a tomar decisões. É preciso estar aberto para aprender e disponível
para se deixar orientar por outros. Há necessidade de se deixar ensinar e de
escutar informações. Antes de se tomar uma posição, deve-se estar ciente tanto
dos argumentos favoráveis quanto dos contrários.
A inteligência, na proteção ambiental, cabem três trabalhos: a) colocar
o raciocínio a serviço da compreensão das interrelações ecológicas; b)
predispor o indivíduo para a escuta; c) tornar a pessoa capaz de tomar
decisões, de tal modo que a ação é sua consequência.
À natureza cabem direitos na medida em que ela tem prerrogativa a
reconhecimento, existência, dignidade e respeito. Ela constitui um valor por si só, tem direito vital devido a seu
todo e sua beleza. A riqueza do vivo já é por si só um valor que deve ser
respeitado. É injusto considerar a natureza essencialmente matéria prima para o
desejo construtivo humano e recurso para a sua vontade produtiva. É contra a eco-justiça
quando a natureza é utilizada só como objeto de mercado e, desta maneira, é
despida de sua dignidade.
Os que não são capazes de ver sentido na contemplação descompromissada
se desintegram espiritualmente e reduzem-se moralmente. Num mundo em que a
beleza desaparece, a vida perde o seu sentido e se torna um absurdo. Quem
quiser ver a beleza na natureza não pode avaliá-la friamente, classificá-la
imparcialmente e catalogá-la esquematicamente. Precisa, sim, olhar com
admiração a natureza e respeitá-la.
A distância entre o homem de colarinho branco e o do uniforme azul, de
um tempo, está sendo progressivamente atenuada. O aumento do período terciário
da economia, isto é, o da prestação de serviços, e o desenvolvimento
tecnológico aumentaram a independência, a criatividade e a capacidade de
decisão, que parecem caracterizar a “profissionalidade”. Hoje há um número
grande e variado de atividades laborativas. Isto tem como conseqüência que a
ética profissional tende a distinguir-se sempre menos da ética do trabalho.
No atual contexto social, com relação à profissão, emergem posições
contraditórias. De um lado a supervalorização e quase sacralização de algumas
profissões, é acompanhado, de outro lado, pela subvalorização de outras,
determinada pela ideologização da vida social em seu conjunto. No plano da
consciência profissional, as posições de “mística da profissão”, com caráter
totalizante, se embatem com concepções tecnocráticas que desembocam na
“neutralidade ética”, a qual exalta a correção técnica, isolada e separada do
contexto social.
As grandes mudanças quantitativas, qualitativas e culturais acontecidas
a partir da década dos anos cinqüenta causaram embaraço na reflexão sobre a
ética profissional. Enquanto até aquela época o universo profissional, ainda
relativamente estável e bem determinado, aceitava a elaboração precisa de
normas éticas comportamentais, hoje tudo se tornou mais difícil e problemático.
A dinamicidade e complexibilidade do social e da atividade humana tornam as
pessoas mais cautelosas na determinação normativa e na própria fundamentação da
ética profissional.
A reflexão ética, antes de se preocupar com os “comportamentos”, deve
refletir sobre os “posicionamentos” para verificar quais são os valores
privilegiados e a sua razão, a nível de escolha da profissão. Hoje encontram-se
teorias e práticas inspiradas em um “decisionismo ético” que, considerando
impossível a justificação da escolha dos valores, preocupam-se apenas com a
coerência categoriais, sucessivas a tal escolha.
Parece, portanto, que a escolha da profissão deva considerar-se neutra
porque de todo afastada e separada do contexto social. Entretanto, esta
neutralidade é contestada quando a profissão é considerada na sua relação com o
social, e nos seus efeitos, que podem ser considerados positivos ou negativos
para o humano.
Atendendo à atual situação cultural parece que a maior parte dos homens,
vivendo sob a espada de Dámocles do desemprego estrutural, desenvolva a própria
atividade com u’a margem sempre mais restrita de livre escolha e com forte
propensão ao ganho, visto como principal se bem que não única preocupação.
Existe uma tendência de viver da profissão e não viver para a profissão. Esta
não é mais vista tanto como meio de realização pessoal e serviço social.
Muitas profissões no passado, como a medicina e o direito, elaboraram
códigos de comportamento denominados “deontologia profissional”. Tais códigos
almejam dar as regras para uma relação correta entre o profissional e o
cliente. Na complexidade do viver social e frente a novos problemas emergentes
no exercício da atividade profissional, estes códigos aparecem muito defasados,
havendo necessidade de atualização, como aparece no caso da bioética.
Na ética profissional existe a teoria separatista, que elabora uma disciplina
baseada apenas em princípios válidos apenas dentro de uma profissão. A teoria
oposta afirma que as prescrições baseiam-se em princípios universais válidos.
Na base da teoria separatista existe uma argumentação que prescinde do conflito
de valores, sendo meramente deontológica. A aceitação dos valores em jogo e do
seu conflito, indica uma argumentação de cunho teleológico.
O problema central da ética profissional não é só a constituição de um
ordenamento jurídico-político, ou a revisão de códigos deontológicos já
superados, mas a pesquisa e a fundamentação de critérios ético-normativos à
altura dos problemas e das interrogações que se põe na consciência de quem
exercita uma profissão.
É comum opor-se a política à moral. Pelo menos no plano teórico, são
considerados estranhos uma à outra, pertencentes a dois domínios bem
diferentes.
Quer se considere sob o plano teórico (ciência política) ou sob o plano
prático (ação política), a política compreende o conjunto de tudo aquilo que se
relaciona ao estado e ao governo. Ora, existe aí uma ordem de coisas que
parece, à primeira vista bem diferente daquela dos valores éticos.
POLÍTICA COMO ESTRANHA À ÉTICA
O “realismo” político sustenta que a política tem os seus fins próprios:
a sociedade não tem outro dever que o de conservar-se, e o papel do estado e do
governo é o desta manter. Se elas se deixassem levar por escrúpulos éticos,
correriam um risco de infidelidade à sua missão específica.
É sobretudo Maquiavel (1496-1527) que ligou seu nome ao realismo político:
De fato, a maneira como vivemos é tão diferente daquela como deveríamos
viver que quem despreza o que se faz pelo que deveria ser feito aprenderá a
provocar a sua própria ruína, e não a defender-se. Quem quiser praticar sempre
a bondade em tudo o que faz está condenado a penar, entre tantos que não são
bons. É necessário, portanto, que o príncipe que deseja manter-se aprenda a
agir sem bondade, faculdade que usará ou não, em cada caso, conforme seja
necessário.
Não é necessário que um príncipe tenha todas as qualidades, mas é
necessário que as aparente todas.
Ousaria mesmo afirmar que possuí-las todas, e sempre as observar, chega a ser
perigoso, mas a aparência de possuí-las todas é útil...Deve-se entender que um
príncipe não pode observar tudo o que é considerado bom nos outros homens,
sendo muitas vezes obrigado, para preservar o Estado, agir contra a fé, a
caridade, a humanidade e a religião.
É assim que a crueldade é bem empregada quando é ditada pela necessidade
de conseguir o poder, e a má fé é sempre necessária àquela que quer conseguir
um poder maior.
Na conduta dos homens, especialmente dos príncipes, da qual não há
recurso, os fins justificam os meios, Portanto, se um príncipe pretende
conquistar e manter um Estado, os meios que empregue serão sempre tidos como
honrosos, elogiados por todos, pois o vulgo se deixa sempre levar pelas
aparências e resultados; o mundo se compõe só de pessoas vulgares e de umas
poucas que, não sendo vulgares, permanecem isolados quando a multidão se reúne.
Nota-se que esta doutrina é fundada sobre um pessimismo profundo e um
desprezo em relação a um ser humano.
Sendo obrigado a agir como um animal, deve o príncipe imitar a raposa e
o leão, pois o leão não pode se defender das armadilhas, e a raposa não consegue
defender-se dos lobos. Aqueles que desejam ser apenas como o leão não
compreendem que um governante prudente não deverá agir com boa fé quando, para
fazê-lo, precisa trabalhar contra seus interesses...E nunca faltaram razões
legítimas para encobrir a inobservância das promessas...Mas é necessário
disfarçar bem este caráter, e dissimular perfeitamente; os homens são tão pouco
argutos, e se inclinam de tal modo às necessidades imediatas, que quem quiser
enganá-los encontrará sempre quem se deixa enganar.
Podem-se encontrar concepções análogas entre os defensores da “razão de
Estado” e dos regimes autoritários. É assim que para Hobbes (1588-1679) os
homens, por sua natureza, são levados a se suportar que associar-se. A origem
da sociedade não está na simpatia, mas no temor recíproco. O estado de natureza
é o da “bellum omnium contra omnes” (guerra de todos contra todos) reinando a
força bruta. A natureza humana é egoísta e utilitária. A tendência fundamental
do homem, então, é a busca da paz e da segurança, conseguida através do temor
(“terreur”). Daí é que nasce o Estado absoluto: os indivíduos, ao dar-lhe a
vida, renunciam a seus interesses em favor do soberano. Direito é apenas o
mandato de quem tem o poder sobre os outros. O soberano não está obrigado a observar
as leis do estado. Aristóteles (384-322A.C.) teria cometido um “pernicioso
erro” ao afirmar a soberania das leis e não dos homens. O poder do governante
não pode ser abolido pela vontade daqueles que o instituíram.
Qualquer que seja a inspiração, todas as doutrinas que repousam sobre o
“realismo” só aceitam as chamadas “relações de fato”. Elas desconhecem que a
vida social não é constituída apenas de relações materiais, de oposição de
força, de conflitos de interesse mas, também, de embates culturais, valorativos
e de visões do mundo. Reduzindo o que deve ser ao que se faz, nega-se o
progresso e o aperfeiçoamento do ser humano.
POLÍTICA SUBORDINADA À ÉTICA
Em oposição às doutrinas que negam a ética em benefício da política,
encontram-se aquelas que rejeitam a especificidade própria da política e
querem-na absorver dentro da moral. Pode-se considerar a doutrina de Platão
(429-348 A.C), sobretudo na “República”, como a expressão desta corrente.
Segundo o pensamento platônico, o fim do estado é o de fazer reinar a virtude
e, consequentemente, o governo deve ser entregue aos sábios e filósofos.
Enquanto que na “República”, o pensamento platônico conta quase que
exclusivamente com a educação dada pelo Estado aos indivíduos, na “Leis”, a
virtude é obra do legislador e, definitivamente, o fruto da coação. Pode-se
ligar a essa tendência à maior parte dos utopistas sociais e aos construtores
das cidades ideais.
Esta tendência parte do pressuposto de que a moral é regra universal da
conduta humana e, por conseguinte, a política constitui a aplicação de regras
morais à ação do Estado e do governo. Há, com certeza, nesta posição um
desconhecimento das condições concretas no seio das quais se coloca, sempre, o
problema político. Uma política “a priori” é insuficiente e incompleta: é mais
seguro analisar as potencialidade do povo, os costumes e os meios de que se
dispõem para fazer o bem. Não se parta de uma “tábula rasa”, mas de um dado
preexistente, com qual é necessário contar: o povo a ser orientado, seu temperamento,
sua História, seus costumes, suas tradições...
Montesquieu (1689-1755), no início do “Espírito das Leis”, afirma que as
leis civis e políticas de cada nação
devem ser tão adequadas ao povo para qual foram feitas que, somente por
um grande acaso, as leis de uma nação podem convir a outra. Cumpre que se
relacionem à natureza e ao princípio do governo estabelecido ou que se pretende
estabelecer, que elas o formem, como as leis políticas, quer elas o mantenham,
como fazem as leis civis. Devem as leis ser relativas ao físico do país, ao
clima frio, quente ou temperado; à qualidade do solo, à sua situação, ao seu
tamanho; ao gênero de vida dos povos, agricultores, caçadores ou pastores; deve
relacionar-se com o grau de liberdade que a constituição pode permitir; com a
religião dos habitantes, suas inclinações riquezas, número, comércio, costumes,
maneiras. Possuem elas, enfim, relações entre si sua origem, com os desígnios
do legislador e com a ordem das coisas, sobre as quais são elas estabelecidas.
É preciso considerá-las em todo esse aspecto.
Existe, portanto, um elemento de determinação que não pertence à moral.
É muito sedutora a doutrina que estabelece como função do Estado a
implantação de virtude. Entretanto, ela é perigosa em sua aplicação. Se o fim
do Estado é a virtude, ela significa que o cidadão não é muito virtuoso e, como
consequência, a entidade estatal é perfeita. Daí é reclamada a intervenção
estatal na vida familiar, na vida privada e, mesmo, na consciência. Se os
antigos, frequentemente, identificavam a política com a moral, isto acontecia
devido ao fato de não distinguir o domínio do homem privado e o daquele do
cidadão, e não se conhecia a liberdade da vida privada, nem a liberdade de
educação e nem a liberdade religiosa. Com efeito, toda política, todo o sistema
de governo implica uma espécie de sanção. É justamente aqui que existe a
diferenciação entre o domínio e a política, onde reina “direito de guerra” e a
moral, fundada, apenas, sobre a boa vontade e a autonomia pessoal, que convém
apenas “ao estado de paz”.
A POLÍTICA COMO ÉTICA DE GRUPO
Norberto Bobbio afirma que uma das interpretações da dicotomia entre
política e moral mais conveniente é a weberiana, enquanto distingui entre a
ética da convicção e a ética da responsabilidade. Existe uma diferença
fundamental entre agir segundo uma ou outra das morais. Segundo a primeira, a
pessoa deve fazer o possível, deixando o resultado “nas mãos de Deus”, enquanto
pela segunda é preciso responder pelas consequencias previsíveis das próprias
ações.
Segundo Bobbio, o universo da moral e da política move-se no caso de
dois sistemas éticos diferentes e até antagônicos. Mais do que imoralidade da
política e “neutralidade” da moral, dever-se-ia falar de do universos éticos,
movidos por princípios diversos, conforme as diversas situações em que se
encontram e agem. Os atores destes dois
mundos agem seguindo o caminho tão diferente, que raramente se encontram: de um
lado está o homem de fé, o profeta, o pedagogo, o sábio, que tem os olhos
colados na cidade celeste, do outro, o homem de Estado, o condor de homens, o
criador da cidade terrena. O que vale para o primeiro é a pureza de intenções e
a coerência da ação com intenção; para o segundo o que conta é a certeza e a
eficácia dos resultados. A famigerada imoralidade da política está fundamentada
numa moral diferente daquela do dever pelo dever. Segundo a moral política
deve-se fazer tudo o que está ao próprio alcance para realizar o fim proposto,
pois, sabe-se, deste o início, que será julgado com base no sucesso. Assim,
tem-se dois conceitos de virtude: o clássico e o maquiavélico. Para o primeiro,
“virtude” é a disposição para o bem moral, que é contraposto ao útil, e o
maquiavélico para qual a virtude é a capacidade do governo forte e sagaz que,
usando conjuntamente as artes da raposa e do leão, triunfa no intento de manter
e consolidar o próprio poder.
O critério da ética da convicção é, de forma geral, usado para julgar as
ações individuais, enquanto o critério da ética da responsabilidade é empregada
no julgamento das ações de grupo, como povo, nação, igreja, classe, partido...
A diferença entre ética individual e a ética de grupo é que embasa a diferença
entre a moral e a política. O que obrigatório para o indivíduo pode o não ser
para o grupo o qual pertence. Exemplo disto é a violência, de que forma geral é
vedada à pessoa e que, no entanto, é justificada quanto praticada pelo grupo.
Ainda de conformidade com Bobbio, a oposição entre moral e política
entendida como o contraste entre a ética individual e a de grupo, mostra e
explica o conceito de “razão de Estado”. Esta noção é constituída pelos
princípios e máxima, segundo os quais as ações seriam condenadas se praticadas
pelo indivíduo, mas que, quando praticadas pelo governante ou por quem exerça o
poder em nome do Estado, não só são justificadas, mas também exaltadas e
glorificadas. Assim, outro dos modos de mostrar a diferença entre a moral e a
política é o fato que o Estado tem razões que o indivíduo não tem ou não pode
fazer valer, quando tal diferença se refere aos diversos critérios segundo os
quais se consideram boas ou más as ações desses dois campos. O acerto de que a
política é a razão do Estado encontra correspondência na afirmação de que a
moral é a razão do indivíduo. A história secular do conflito entre a moral e a
política se vale do contraste de que as duas razões quase nunca se encontram.
É necessário, ainda, deixar claro que a razão de Estado é apenas um dos
aspectos da ética de grupo, se bem que seja o mais evidente, em razão do Estado
ser a coletividade em seu mais elevado grau de expressão e de potência. Sempre
que um grupo social age em própria defesa contra outro grupo, se apela a uma
ética diversa da geralmente válida para os indivíduos, uma ética que responde à
mesma lógica da razão de Estado. Desta forma, ao lado da razão de Estado, na
História, conforme as circunstâncias, aparece uma razão de partido, ou de
classe, ou de nação... possuindo o princípio da autonomia, como a política com
a mesmas circunstâncias. Esta autonomia de princípios e regras de ação vale
para o indivíduo dentro do grupo.
MORAL SOCIAL
Estudando o caráter pessoal da moral, pode-se cair no erro de tratar o
homem como ser isolado. Entretanto, ele é um ser que vive em sociedade, devendo
levar em conta seus semelhante.
A moral, propriamente dita, é social, porque a pessoa vive em sociedade.
É nela que o homem encontra os seus semelhantes. Estes é o espaço do respeito e
da ajuda mútua.
O problema ético e político te como base uma questão ontológica, como
por exemplo, a semelhança dos homens entre si devido à sua natureza. A regra
moral não resulta apenas da consideração do homem individual, mas também
relacionado com o outro. Há necessidade de se questionar, numa sociedade
organizada, até onde o indivíduo deve se sacrificar pelo todo. Assim é que os
problemas da ética social tem, também, um caráter pessoal, características da
moral.
Como exemplo, pode-se examinar a circulação de automóvel. Coloca-se,
assim, o problema moral de saber em que medida o motorista deve respeitar o pedestre.
Constitui um direito arbitrário, observável apenas em algumas circunstância?
Constitui matéria da moral individual ou social? É obrigatório respeitar o
regulamento de trânsito? Deve-se respeitar o sinal vermelho, à noite, com risco
de ser assaltado? Podem-se propor, ainda, outras questões, toda de caráter
pessoal. Todas estas questões são de caráter moral, de atitude pessoal. Não são
questões sociais, se bem que sejam de moral social. A questão social consiste
em saber organizar a sociedade, que é coisa bem diferente. Constitui questão
social saber se deve-se ou não regulamentar a circulação de veículos, como,
também, a maneira como ela deve ser feita. Enquanto faz parte da moral saber se
a pessoa deve ou não observar este regulamento. São dois planos diferentes. O
plano moral é o da autonomia da pessoa. Pelo fato do ser humano ser dotado de
razão e, em consequencia, portador do livre arbítrio, o que a pessoa faz só
depende dela e, tudo o que ela quer se impor acontece porque ela quer. Ela pode
preferir morrer a obedecer.
A questão social consiste em saber como deve se organizada a sociedade.
Todas as questões sociais se ligam de uma forma ou de outra a esta primeira.
Questão social é o estudo do meio de levar os homens a se comportar de uma
determinada maneira. A organização social pode ter por finalidade ajudar os
homens a praticar a virtude, portanto, a moral.
A moral social não deixa de ser moral, tendo, portanto, um caráter
pessoal. É chamada “social” em razão do objeto ao qual ela se aplica. Neste
sentido, podem-se Ter morais especiais, aplicáveis as todas as formas de
atividade humanas: medicina, odontologia, comércio, engenharia, agricultura...
Estas morais que tratam da maneira como deve-se comportar no exercício de determinada
atividade não constituem problemas de regulamentação social destas atividades e
nem constituem problemas técnicos. O problema moral do agricultor será exercer
bem a sua profissão, e o aspecto técnico da agricultura indicará as condições
do bom exercício da profissão. A questão social da agricultura será saber como
determinar o lugar dos agricultores na sociedade, d modo que eles desempenhem
os serviços que eles são chamados a prestar. A moral social do agricultor
colocará questões relativas àquilo que ele deve fazer aos seus semelhantes,
àquilo que eles esperam dele.
A moral social não se liga, portanto, ao que e chama de “questões
sociais”. Estas constituem problema de organização da comunidade, enquanto as
questões morais reportam-se às atitudes pessoais. Sempre que se emprega o termo
“moral”, há a exigência de um julgamento racional: um poder moral é o que se
impõem ao espírito e não só as atitudes externas (implica uma adesão íntima).
Na organização social, apenas secundariamente preocupa-se com a
moralidade dos atos. O que se tem em vista é um resultado objetivo. Assim,
estabelece-se um regulamento trânsito para evitar acidente. A finalidade
precípua da norma é evitar desastres, sem ter em vista, nos primeiros, a adesão
pessoal. Ao contrário, a preocupação da ética é unicamente com assentimento
pessoal do que dirige o carro.
Conclusões
Em princípio, a moral é a regra geral da conduta humana. Ela se aplica,
pois, à vida privada e a publica, à família e nas relações internacionais.
Ela deve fornecer diretrizes para a política como o uso boa fé, o
respeito à palavra dada, a fidelidade nos contratos, o respeito à pessoa humana
e seus direitos, o que implica rejeição de procedimentos degradantes como a
tortura, a “lavagem cerebral”, a propaganda enganosa... Há liberdades naturais
que independem da lei civil, mas que reconhecidas e garantidas por esta norma,
constituem as “liberdades civis”. A verdadeira política mantém estas liberdades
essenciais, em razão da dignidade humana.
O Estado não se confunde com a sociedade. Esta tem um espírito, que é
constituído de um conjunto de valores coletivos. O Estado seria infiel ao seu
papel se não respeitasse e promovesse setes valores, que constituem um ideal
coletivo.
Isto não quer dizer que ele tem por missão “fazer reinar a virtude”. Nem
deve, também, querer “corrigir tudo”, mudar o “espírito geral” de uma nação e
nem, sob o pretexto de moralização, mudar este espírito geral. Seu papel é
outro. Ele deve formular claramente e fazer respeitar as regras, que protegem
os valores fundamentais, isto é, o direito. Este, com efeito, constitui o liame
entre a política e a moral. O direito deve ser considerado sagrado por parte de
quem governa. Todas política deve obedecê-lo. Deve-se diferenciar entre o
“moralismo político”, que reduz a política a uma questão de habilidade e
esperteza, e a “política moral”, que tem por fundamento a idéia do direito.
Este, certamente, pode ser considerado como o “mínimo ético”.
Não se quer afirmar que a habilidade nada tenha a ver com política. É
sempre evidente que a conduta do Estado e seu governo exigem sempre alguns
elementos técnicos, algumas competências especiais, que não constituem o
apanágio da moral. Assim é que um sistema tributário não deve ser apenas justo,
mas, também, eficiente, o que supõe do político um mínimo de competência
econômica. Entretanto, esta só não basta: ela deve estar a serviço de uma idéia
diretora, que só pode ser ditada pelo direito.
Em suma, política e
moral não se confundem, pois cada uma delas tem o seu papel próprio.
Entretanto, a política, se bem que
situada num outro plano, tem ligação com a moral: é uma atividade a serviço de
um valor.
Na fenomenologia da experiência humana, na sua estrutura essencial, há
uma correlação necessária, porque a priorística é intuitivamente evidente,
tanto da parte objetiva quanto na subjetiva desta. Não existe uma realização do
valor eticamente significativo, que não seja ao mesmo tempo atualização da
pessoa no ato da resposta.
A experiência ética é uma experiência pessoal em um sentido singular:
apenas a pessoa pode intencionar o valor e torná-lo historicamente presente na
ação e no tempo. O valor ético encontra a sua realização plena na pessoa. As
diversas dimensões da experiência ética convergem na construção da pessoa como
sujeito ético capaz de uma resposta ao valor.
A experiência ética foi descrita, em sua essência, como experiência de
uma resposta ao valor. Os âmbitos concretos nos quais o valor pode ser
realizado são: a) aquele das ações, no qual a vontade realiza um papel
fundamental; b) aquele dos atos imanentes ou das respostas afetivas e, enfim c)
aquele das virtudes, que definem as características permanentes e a qualidade
ética constitutiva da pessoa.
A pessoa é o sujeito de cada uma destas esferas, que definem aspectos
diversos da experiência ética entendida fundamentalmente como resposta ao
valor.
Uma reflexão atenta à experiência, não pode não levar em consideração,
também aquela das respostas e das virtudes. Só assim esta toma consciência da
amplidão do fenômeno ético e da qualidade do valor ético na sua realização
histórica.
Três são os elementos que definem a esfera da ação na sua essencialidade
ôntica: a) antes de mais nada, o conhecimento de um estado de coisas; b) em
segundo lugar, um ato de vontade motivado pelo estado de coisas; c) e, em
terceiro lugar, a fazer existir o estado de coisas procurado. Em cada ação
eticamente boa, a vontade do sujeito deve ser uma resposta ao valor e ao estado
de coisas que é realizado, ou seja, o objeto da ação um bem portador de um
valor eticamente relevante.
Além da esfera da ação, a esfera das respostas oferece à reflexão ética
um segundo âmbito de pesquisa. Este pode ser diferente daquele das ações porque
tem como objeto os atos da vontade ou da afetividade, que permanecem imanentes
ao sujeito. A ética da pessoa não é definida apenas por suas ações, mas também
por suas atitudes interiores.
O nível de profundidade último da liberdade da pessoa se exprime no ato
de aprovação ou de desaprovação das próprias emoções ou dos próprios
sentimentos, daquilo que, em uma palavra, alimenta a esfera emotiva.
Com a sanção ou a desaprovação, a liberdade assinala, por assim dizer,
as reações espontâneas da pessoa, conferindo a estas o caráter de moralidade ou
de imoralidade, da resposta ao valor ou do fechamento a este. Através deste
exercício, a pessoa realiza em nível mais profundo a própria liberdade.
O último âmbito de realização do valor ético é definido pela esfera das
virtudes. Esta disposição não identifica apenas disposições com referência ao
agir. Com a virtude se refere a uma qualidade do caráter da pessoa e, mais
precisamente, uma resposta ao valor. Em particular, aquela atitude fundamental
que exprime a tomada de posição última da pessoa com relação ao bem.
O tema da atitude fundamental é essencial para a compreensão da virtude.
Qualquer virtude supõe uma resposta fundamental a uma esfera de valores, uma
resposta que é determinação concreta daquela atitude fundamental. Uma atitude
geral se torna virtude quando forja a personalidade inteira e assinala
essencial e profundamente o caráter.
O caráter habitual da virtude não é aquele da repetição, porque a
virtude não pode ser pensada como um meio em vista da ação. O risco de
interpretar a virtude como uma pura disposição para a ação parece constituir o
ponto fraco da doutrina aristotélica.
A identificação do justo como meio entre dois extremos não exprime a
qualidade específica de toda a atualização da experiência moral consistente na
resposta ao valor. A dialética entre virtude e vício não é decidida pela
equidistância entre os dois extremos, mas pela determinação da liberdade da
pessoa que responde ao apelo do valor ou se fecha na imanência do próprio
interesse.
As ações, as atitudes internas e as virtudes constituem as três
dimensões da experiência ética. Estas circunscrevem os âmbitos concretos de uma
duplice atualização: aquela do valor no seu incarnar-se histórico, e o da
pessoa na sua identidade própria de sujeito ético.
A experiência ética é, na sua essência, a experiência de um encontro
entre o valor e a pessoa no ato de uma resposta, de um ato de liberdade.
Afirma-se que a ética morreu. Existe gente que pensa que o que morreu
foi a ética kantiana, a ética dos deveres individuais. Em uma ética assim o que
importa é o móbil da ação e não os seus resultados, a boa vontade e não as
consequências boas.
O mundo de hoje não precisa da ética dos heróis, dispostos a
sacrificar-se. Este tipo de moral está afastado porque a boa vontade individual
é impotente para defender os direitos de todos os homens frente às violações
diárias. Além disso, a modernidade supõe a diferenciação funcional de
diferentes esferas sociais, que conta cada uma com uma lógica própria e uma
autonomia relativa. Diante delas o indivíduo se sente cada vez mais impotente.
Por isso precisaria de uma ética que coordenasse as ações individuais de uma
forma tão inteligente que o resultado final fosse o maior bem possível para
todos, independente da boa ou má vontade do indivíduo. “O que importa, acima de
tudo, não é a boa vontade, mas que o bem aconteça” (K.O.Apel).
A chave da ética dos novos tempos democráticos não é o respeito à lei,
mas a sagacidade do entendimento; não é a boa vontade, mas os bons resultados.
Daí que a antiga moral do indivíduo deva ser superada por uma ética das
instituições.
Isto resultaria particularmente compreensível no âmbito da economia
moderna, que se caracteriza pela divisão do trabalho, trocas anônimas,
crescente interdependência e elevada complexidade. Para o resultado de um processo
com estas características são irrelevantes tanto os motivos da ação individual
como as suas consequências. Resultado total é o produto de incontáveis ações.
Sem contar com o resultado de que a ação da pessoa não só depende dela mas
também do que as demais fazem. É necessário substituir a lógica da ação
individual pela lógica da ação coletiva ou, ao menos, complementar com ela.
A racionalidade da economia moderna se caracteriza por mecanismos que, à
primeira vista, estão disputados com as exigências de u’a moral kantiana. Se os
agentes econômicos só são movidos pelo lucro e pelo proveito, e se a pedra
angular da economia moderna é a competência, parece que não há lugar para a moral.
Uma concepção da atividade empresarial moderna, tomada em sua integridade,
contém aspectos morais que os agentes econômicos devem atender, se querem levar
adiante a tarefa que lhes é própria. Para que isto seja um fato, há que se
contar com uma opinião pública crítica e com empresários dispostos a
confrontar-se criticamente com sua própria atividade empresarial.
A moral não pode ser nunca algo acrescentado de fora ao ser do homem ou
a uma atividade concreta, mas seu próprio desenvolvimento quando está em seu
próprio campo de ação. A ética nunca pode constituir em algo suplementar, vindo
de um tribunal alheio, mas no pleno exercício da própria atividade em uma
sociedade que se compreende historicamente.
Entender a moral em outro sentido está levando a autores como Habermas a
procurar liberar o direito e a política da ética como se os juízos éticos
constituíssem uma ingerência externa para estes âmbitos. Suposto isto, se
compreende que Habermas distinga entre a ética, que consistiria na realização
correta de uma política legítima, ligada com as formas de vida de uma
comunidade concreta, e a moral, que consistiria no cumprimento de deveres
universalizáveis. Uma e outra estariam subordinadas ao gênero supremo do
discurso racional, que seria moralmente neutro.
Se ao tratar de moral não se começar a casa pelo telhado, falando de
normas (Apel, Habermas), princípios de justiça (Rawls) ou regras (Buchanan),
mas de “vita activa” (H. Arendt), das atividades pelas quais os seres humanos
desenvolvem suas vidas, deve-se reconhecer que a moral de tais atividades
consiste em sua plena realização.
A MORAL NA ATIVIDADE EMPRESARIAL HODIERNA
Na sociedade hodierna, o pleno desenvolvimento de uma atividade requer
atender ao menos quatro pontos de referência: em primeiro lugar, as metas
sociais pelas quais cobra o seu sentido; em segundo lugar, os mecanismos
adequados para alcançá-las; em terceiro lugar, aparece o marco
jurídico-político correspondente à sociedade em questão; e, em quarto e último
lugar, surgem as exigências da consciência moral crítica.
Numa sociedade pós-industrial estas exigências são as mesmas do nível
pós-convencional. Isto significa que as instituições devem reconhecer que todos
os atingidos por decisões e normas são interlocutores válidos, ou seja, que as
normas que regular as atividades devem ser aceitas por todos eles através de um
diálogo racional.
O primeiro ponto de referência é que qualquer atividade social cobra
sentido porque busca uma determinada meta e assim se converte no que alguns
denominam de “prática”. Justamente uma “prática” é uma atividade cooperativa
que busca determinados bens internos, diferentes dos de outras práticas. Para
alcançá-los, é preciso que os que participam desta prática desenvolvam certas
virtudes que compõem o “ethos” próprio desta atividade. As diferentes práticas
se caracterizam pelos bens que só através delas se conseguem, pelos valores que
se descobrem na perseguição destas metas e pelas virtudes exigidas para a sua
prática.
Sem instituições seria impossível desenvolver estas práticas. Por isto
importa estabelecer, junto à ética individual, uma ética das instituições dando
apoio às práticas. Por causa disso é também necessário estabelecer uma ética
das atividades ou das práticas que sustente a ética das instituições.
A partir desta perspectiva, a atividade empresarial se caracteriza por
buscar um determinado bem interno, ou seja, a satisfação das necessidades
humanas, constituindo o segundo ponto de referência, através de mecanismos
específicos como o mercado, a competência é a busca do proveito. Isto exige o
desenvolvimento de valores peculiares como a busca da qualidade e a otimização
dos recursos, especialmente os humanos.
O terceiro ponto de referência é o respeito à legislação vigente, que
marca as regras do jogo da empresa e das demais instituições. Entretanto isto
não basta, já que a legalidade não esgota a moralidade. Não só porque a
legalidade pode deixar lacunas, mas porque o âmbito do dever nunca está
totalmente positivado e nem é conveniente que o esteja.
A legislação deve ater-se àquilo que todos poderiam querer. Isto
significa que o consenso é necessário para legitimar o marco econômico.
Entretanto, consenso não significa “pacto de interesses setoriais”, mas acordo
em torno ao “interesse universalizável”, em torno do que todos poderiam querer.
No quarto e último ponto de referência, o consenso é exigível porque
fala-se da atividade empresarial em sociedades cuja consciência atingiu o nível
moral pós-convencional. Na linha kantiana do termo moral, que constitui o ponto
de referência de u'a moral crítica, qualquer atividade ou instituição que
pretenda ser legítima deve responder às exigências de justiça que sua sociedade
coloca e que correspondem ao nível de consciência moral no qual se encontra.
Segundo isto, “só seriam válidas normas de ação com as que poderiam estar de
acordo todos os possíveis atingidos como participantes de um discurso prático”
(Habermas).
A partir do ponto de vista de uma consciência moral crítica, que
alcançou o nível pós-convencional, são válidas as normas de ação com as que
poderiam estar de acordo todos os atingidos por elas, porque satisfazem, em
terminologia kantiana, interesses universalizáveis.
A OPINIÃO PÚBLICA COMO LUGAR DA MORAL
A consciência moral crítica é uma exigência que nunca pode
institucionalizar-se totalmente, mas tem um lugar privilegiado de expressão em
uma sociedade moderna, ou seja, o de uma opinião pública crítica, tal como a
entendeu certa tradição kantiana.
Ao menos desde o século XVIII, o conceito de publicidade está ligado ao
mundo político. O poder político é público. Suas metas e seus efeitos são
públicos. Em razão disso, precisa de uma legitimação pública.
Kant utiliza o conceito de publicidade em um duplo sentido: como
princípio do ordenamento jurídico e como método do iluminismo.
Como princípio de ordenamento jurídico, a publicidade é condição
indispensável da justiça das leis. Por isto, a fórmula transcendental do
direito público diz: “são injustas aquelas ações que se referem ao direito de
outros homens e cujas máximas não suportam ser publicadas”.
Na obra de Kant se entrecruzam duas formas de entender a publicidade: a
representativa, pela qual o soberano representa o povo, e a republicana, na
qual o soberano continua governando a "res publica", mas tem de
promulgar as suas leis de acordo com o que “todos poderiam querer”. Em virtude
deste entrecruzamento, sempre é o soberano o que assume o papel de representar
o povo, o qual está juridicamente ligado ao soberano, enquanto que este fica
obrigado com o povo apenas moralmente.
O segundo conceito de publicidade kantiana é o entendimento da
publicidade como método do iluminismo, ou seja, é o “uso público da própria
razão por parte dos cidadãos que tem maturidade”. São os cidadãos “ilustrados”
os que devem criticar publicamente os poderes públicos. A liberdade de imprensa
é o principal direito do povo.
A sociedade, em seu conjunto, está estruturada em dois âmbitos: o
público, correspondente ao poder político, e o privado. Entretanto, neste
último cabe distinguir entre a esfera correspondente à família e à troca
mercantil, e a publicidade política dos “lustrados”, que medeia entre o Estado
e a sociedade através da opinião pública.
A partir desta perspectiva, a “res publica” o é porque tem como objetivo
o bem público, mas também porque preconiza como procedimento para alcançá-lo a
criação de um espaço público no qual os cidadãos podem deliberar acerca do que
lhes importa. A existência deste espaço público é “conditio sine qua non” para
a opinião pública e a crítica ao poder político e, em última instância, para a
moralidade do político.
O liberalismo político de John Rawls aceita a dupla linha apontada por
Kant no conceito de publicidade, se bem que “domesticando” a razão pública. Na
realidade, a estrutura da sociedade mudou desde o século XVIII. Em primeiro
lugar a forma política de governo é a democracia e, portanto, os cidadãos
exercem publicamente a própria razão, não para criticar o soberano, mas para
constituir juntos uma ordem legítima e justa. Em segundo lugar, a economia e a
empresa já não fazem parte da esfera privada, mas passaram para a esfera
pública por suas repercussões nesta e precisam, deste modo, de legitimação. Daí
as mudanças, também, nos dois conceitos de publicidade.
No que se refere ao princípio do ordenamento jurídico, considera Rawls
que a estabilidade da ordem política exige a promulgação de alguns princípios
de justiça que possam ser aceitos por todos os membros da comunidade política.
Daí que idealiza uma condição tal que qualquer cidadão poderia estar de acordo
com tais princípios. Uma vez decididos os princípios públicos de justiça, como
aplicá-los?
USO PÚBLICO DA PRÓPRIA RAZÃO E OPINIÃO PÚBLICA
Para John Rawls, utiliza publicamente sua razão o cidadão moderno que
trata de apresentar aquelas razões que os demais cidadãos podem aceitar, seja
qual for a sua teoria compreensiva do bem. Quem assim procede cumpre o dever
moral de cidadania, que consiste em reforçar o consenso já existente em uma
sociedade democrática em torno de um mínimo de justiça.
A conveniência em uma sociedade pluralista é possível porque todos
compartilham esse mínimo. É um dever moral cível reforçá-lo para fortalecer a
coesão da comunidade política.
A razão pública o é em um tríplice sentido: a) porque, como razão dos
cidadãos iguais, é razão do público; b) porque seu objetivo é o bem público; c)
porque o seu conteúdo é público.
O conteúdo da razão pública é a concepção política de justiça e a podem
aceitar todos os cidadãos. Caso contrário, não ofereceria uma base pública de
justificação. Rawls insiste em que esta idéia de razão pública é essencialmente
política. Também é certo que o seu exercício constitui o dever moral da
cidadania. Serão cidadãos maduros, imbuídos deste dever de cidadania, os que se
dispõem a fazer uso público da própria razão, que aqui busca o consenso com os
demais cidadãos em tudo aquilo que seja possível estar de acordo.
Este concordismo liberal, do qual ele compartilha, tem uma posição
positiva pois destaca que, em sociedades pluralistas e multiculturais, a
construção da vida em comum exige união de esforços. Mas tem também o
inconveniente de ser conformista de adaptar-se facilmente ao que já existe.
Este conformismo afeta muito especialmente o âmbito econômico, já que
Rawls reconhece que, no que se refere à distribuição justa dos bens materiais,
a base mais ampla que pode ser alcançada é a de um “mínimo social”, que cubra
as necessidades básicas de todos os cidadãos. Ao contrário, o princípio da
diferença, segundo o qual a distribuição desigual da riqueza só é justa se
favorece o menos favorecido, não parece que possa alcançar um amplo acordo em
sua sociedade e por isto fica excluído das “essências constitucionais”.
No liberalismo político, o uso público da própria razão perdeu a
capacidade crítica de que gozava na proposta kantiana. Esta capacidade crítica
é recuperada por Habermas. Este se situa na linha de Kant. Para ele, sem
publicidade política crítica é impossível uma democracia autêntica. Ela
representa o elemento mediador entre a sociedade civil e o poder político.
Entretanto, as mudanças estruturais sofridas em uma como no outro obrigam a
modificá-la consideravelmente.
O poder político não se legitima mediante um hipotético contrato social,
mas comunicativamente, que foi como se manifestou a soberania do povo.
Portanto, o poder administrativo deve legitimar-se através da comunicação e não
recorrendo a pressupostos tradicionais ou autoritários, mas a argumentos
capazes de convencer os interessados por seus projetos. Daí a necessidade de
escutar a cidadania, que se expressa através de uma opinião pública não
institucionalizada.
A opinião pública é composta por aqueles cidadãos que possuem algumas
antenas especiais para perceber os efeitos dos sistemas, já que são afetados
por eles. É certo que é o poder institucionalizado o que toma as decisões.
Entretanto, o poder público deve perceber e tematizar os problemas da sociedade
comunicando-se com os que são potencialmente atingidos.
ÉTICA EMPRESARIAL E OPINIÃO PÚBLICA
Para Habermas é preciso criar o espaço institucional para o espaço
público. Mas a publicidade é, em princípio, um fenômeno social elementar, uma
estrutura de comunicação enraizada no mundo da vida através de sua base
sócio-cívica. Este espaço social é também um espaço público, no qual é possível
encontrar-se com liberdade.
Habermas continua deste modo a tradição kantiana de uma publicidade
preocupada pela “res publica”, que funciona como “consciência moral” do poder
político, porque lhe recorda que deve tomar as decisões atendendo “àquilo a que
todos poderiam querer, ou seja, a interesses universalizáveis”. E, como na
tradição kantiana, a publicidade pertence à sociedade civil. Entretanto, em
Habermas, produziram-se ao menos três mudanças substanciais com relação ao
pensamento de Kant.
A primeira mudança foi no conceito de sociedade civil. Em Kant se
tratava de “sociedade burguesa”, que Hegel caracterizou com o “sistema de
necessidades”, ou seja, um sistema de mercado de trabalho e de troca de
mercadorias. Ao contrário, para Habermas, a sociedade civil não inclui o poder
econômico e a compõe aquelas associações voluntárias, não estatais e não
econômicas, que constituem as estruturas comunicativas do mundo da vida. Estas
associações percebem os problemas dos âmbitos privados do mundo vital, buscam
interpretações públicas para seus interesses e experiências sociais e
influenciam na formação institucionalizada da opinião pública.
A segunda mudança foi que os sujeitos dessa opinião pública não são como
em Kant, os “ilustrados”, mas aqueles sujeitos, atingidos pelos sistemas, que
defendem interesses universalizáveis e colaboram, portanto, na tarefa de formar
uma vontade comum discursiva e por meio do diálogo.
A terceira mudança é que Habermas vai além de Kant, ao pretender que as
exigências geradas pela opinião pública se institucionalizem, ao menos em
parte, convertendo-se em um autêntico poder comunicativo através do poder
político.
Também Habermas não vê a necessidade de legitimar a atividade econômica
a partir da opinião pública. Isto não deixa de ser uma grande lacuna. Hoje em
dia se requer que qualquer atividade com metas e repercussão social possua
legitimação. Portanto, também a atividade econômica.
A moral de uma atividade social consiste em buscar desenvolvê-la de modo
que alcance seu objetivo e eficácia vital. No que se refere à atividade
empresarial é necessário investigar que bens internos busca, que valores aspira
realizar e que virtudes exige. Sabe-se que em uma sociedade moderna
pós-industrial com democracia, alcançou-se um nível de consciência
pós-convencional, segundo o qual toda pessoa é um interlocutor válido.
As regras do jogo da economia devem submeter-se ao marco constitucional
que é objeto de um consenso. Nele se encontra já incorporado uma instância
moral.
As exigências dos interlocutores válidos recordam que é preciso revisar
constantemente a ordem econômica para que se oriente por interesses
universalizáveis. Estas exigências se canalizam através de uma opinião pública
crítica que, a partir de interesses universalizáveis, obriga a reintepretar a
constituição.
Para que a opinião pública seja um verdadeiro lugar do moral é preciso
potencializar o dever de cidadania, já que as exigências de cidadãos egoístas
carecem de qualidade moral. Tal cidadania deveria convidar não só ao
concordismo, mas sobretudo à crítica, porque a concórdia poderia conseguir-se à
custa de sacrificar os interesses universalizáveis em benefício dos interesses
particulares. A publicidade política deve ser ampliada para uma publicidade
econômica.
No passado, no clima de estabilidade de um mundo solidamente
estruturado, a ética podia, com uma certa facilidade, dar diretivas simples e
claras com a convicção sincera de resolver qualquer problema. Hoje, em um mundo
em contínua transformação, caracterizado por um progresso sem precedentes mas,
também, pela emergência de problemas graves, a discussão tornou-se mais
complexa. A revolução tecnológica tornou possível um aumento do bem-estar,
antes impensável mas, também, criou riquezas imensas, de um lado, e miséria
imensa do outro, constituindo uma ameaça constante à paz.
O aparecimento de um sociedade multicultural, multirreligiosa e
multiética abriu novos horizontes mas, também, criou transtornos,
incompreensões, fundamentalismos, ódios raciais. Nesta nova realidade, é
preciso compreender que a ética deve levar em conta que ela é desvirtuada ou
refutada, ignorada ou conhecida só no aspecto externo. Deve-se perscrutar,
pois, qual é o sentido da crise que se atravessa, quais os problemas devem ser
solucionados antes, como interpretar a realidade que aparece.
Em uma sociedade em contínua mudança não é estranho a criação de
oposições, divisões, modos diferentes de viver as coisas. Além deste fato
inevitável, o que mais preocupa é a difusão de uma concepção subjetivística do
juízo ético. É muito difundida a opinião segundo a qual é o próprio sujeito que
estabelece o que é justo e aquilo que não o é. Normas e valores tidos antes
como absolutos se tornaram objeto de escolha por parte dos indivíduos. Esta
situação, mais que fruto de contestação de normas particulares ou de tomadas de
posições por princípio, parece ser a expressão de um transtorno que toca a
pessoa no mais profundo do seu ser.
Atinge, pois, um grande número de pessoas que parecem incapazes de enfrentar
o risco de empenhar-se em escolhas definitivas de vida, a espontaneidade dos
que parecem deixar-se orientar por escolhas de vida definitivas, dos que deixam
ser guiados apenas pelos sentimentos, incapazes de reconhecer e aceitar os
limites do real. Em tudo isto influenciou a transformação das condições de
vida, ou seja, a dificuldade de reconhecer pontos de referência importantes na
pluralidade atual de propostas de sentido, o multiplicar-se de expectativas em
uma situação em que o bem-estar chega muito rapidamente.
Quem se acostumou desde criança a ver realizado cada desejo seu estará
pouco preparado para enfrentar os conflitos inevitáveis da existência, a
compreender o valor da renúncia, das chamadas “virtudes negativas” necessárias
para saber reconhecer que a longo prazo pode dar sentido à vida. Aparece aí uma
fragilidade que pode ter graves consequências. Isto é confirmado pelas notícias
nas quais se vê que por motivos fúteis, como o fato de ir mal em um exame ou
uma desilusão afetiva, podem ser suficientes para gerar gestos desesperados e
violentos.
Decisivo tanto para o bem como para o mal foi o crescimento exponencial
das telecomunicações e da informática nos últimos tempos, permitindo o acesso a
u’a massa sempre maior de conhecimentos, mas não fornecendo os instrumentos
para geri-la e avaliá-la criticamente. Com efeito, para fazer frente à
concorrência, os meios de comunicação e, em particular, à televisão deixam-se
levar pela audiência, nivelando por baixo seus programas, em detrimento da
informação e do estudo dos problemas do mundo contemporâneo. A mídia cria
necessidades artificiais para pessoas que não têm como satisfazê-las.
ÉTICA E NOVAS ORIENTAÇÕES
A prevalência progressiva da imagem sobre a palavra e a reflexão acentua
a tendência a preferir o sonho à realidade, uma alteridade virtual e
manipulável a uma relação empenhável com pessoas verdadeiras. A incapacidade de
empenhar-se em um projeto de vida leva à banidade, à obscenidade ao desencanto.
Neste mundo que muda velozmente, o que parece ser mais necessário não
são tanto os juízos éticos, quanto um esforço para procurar compreender os
motivos daquilo que está sucedendo, do transtorno criado por problemas novos
para os quais não se está preparado, pela inquietação provinda daqueles que
perderam pontos de referência e esquemas interpretativos reconhecidos, há um
tempo atrás, como certos e bons. Nesta situação é necessária a presença de
homens capazes de compreender o mundo de hoje com as suas alegrias e as suas
angústias, e de transmitir uma esperança que desafie todas as provocações da
vida.
Na desorientação de um mundo na procura de novos equilíbrios estão
inseridos os mais diversos messianismos, ideologias que trouxeram a guerra e a
ruína e hoje estão acabando, mesmo se a reação a elas parece ser o messianismo,
a longo prazo também danoso, de uma economia sem controles, que governa as
enormes potencialidades da técnica e da ciência, buscando apenas o lucro, sob a
ótica de um pragmatismo crescente.
Não obstante o aumento do bem-estar, o futuro começa a causar medo: o
crescimento da separação entre o primeiro e o terceiro mundo; armas sempre mais
potentes ao serviço de interesses antagônicos; a dificuldade de compreensão
entre povos e culturas; a incapacidade de controlar a economia, que impede um
acordo sobre os desequilíbrios ecológicos e impede o sacrifício da humanidade
de amanhã em razão dos interesses imediatos do homem atual. O homem de hoje
parece estar sempre ameaçado por aquilo que produz. O otimismo racionalista,
que via na História o avanço vitorioso da razão, parece que levou à tentação do
desespero.
É um pensamento que não foi entendido como contemplação e procura da
verdade, mas como razão instrumental ao serviço de fins utilitarísticos de
fruição e de poder. Cresce o culto do progresso e do sucesso, mas raramente se
pergunta qual deve ou possa ser o ponto de chegada, o fim. Aceita-se que
progresso e sucesso sempre são benéficos ao homem, e nunca maléficos.
É uma opinião amplamente aceita. Nesta linha a Escola de Frankfurt
mostrou como a lógica do cientismo positivista privilegia o útil em detrimento
da visão de fim, o capital ou os interesses da ideologia com relação à pessoa.
Esta visão está na base das tragédias do século XX. O que se coloca em questão
não é a ciência enquanto tal, mas a ilusão de que a ciência possa dar a solução
para todos os problemas.
De fato, as grandes potencialidades da técnica foram usadas sem a
referência a uma idéia adequada do homem, da sua dignidade e das suas
exigências, terminam por fugir ao controle para se tornar instrumento de
dominação, que submete a pessoa a forças impessoais. Horkheimer afirmou que a
máquina tomou o lugar do condutor e corre sem guia pelo espaço. Quanto mais o
indivíduo se preocupa em obter um poder sobre as coisas, tanto mais as coisas o
dominam: o ter é se substitui ao ser, as coisas mensuráveis e controláveis à
pessoa e ao seu mistério.
ÉTICA: MEIOS E FINS
Estabelecida a lógica do ter sobre a do ser, não existe a possibilidade
de u’a moralidade em sentido exato, reconhecimento e atenção ao fim, ao bem, e
se torna normal pensar que tudo aquilo que é útil e tecnicamente possível seja,
automaticamente, bom e lícito.
Sob esta base, no campo médico, onde os desenvolvimentos são bastante
velozes, é inevitável que, na utilização das tecnologias mais avançadas , os
interesses imediatos de cada paciente e sobretudo dos grandes grupos
financeiros, prevaleçam sobre valores de fundo, como o respeito pela vida de
todos. O risco da prevalência dos meios sobre os fins se refere não só à
bioética, mas a todos os campos da moral. Particularmente é inquietante sua
incidência sobre o equilíbrio profundo da pessoa, que se arrisca de perder,
progressivamente, o sentido de um absoluto capaz de dar unidade a uma vida.
A idéia de que com o dinheiro, com o bem-estar e a satisfação de desejos
imediatos, se possam resolver todos os problemas do homem, a sua procura
interminável de felicidade, como as suas angústias e suas incoerências, cria
expectativas irrealizáveis, que tiram a responsabilidade da pessoa e que a
levam, mais tempo ou menos tempo, à desilusão.
Quando a solução dos problemas da pessoa é limitada apenas por
instrumentos técnicos, antes ou depois se vai ao encontro de uma grande
frustração. É o que acontece, por exemplo, com o problema da tóxico-dependência
distribuindo metadona, esquecendo os problemas da pessoa tóxico-dependente e de
todos aqueles que se arriscam de se tornar.
A tensão para o absoluto, que torna inquieto o coração do homem, só pode
encontrar resposta em uma esperança que vá além de qualquer realidade
particular. Se se quer sufocá-la, a inquietação do desejo encontrará saídas
alternativas das mais variadas, em coisas que escravizam o homem, na fuga da
realidade com drogas ou com a violência ou, mais frequentemente, em drogas
conciliáveis com a vida burguesa como o dinheiro, o poder, as modas do
momento.
Diminuindo a referência a um fim transcendente, o sentido ético perde a
sua consistência, arriscando a reduzir-se a um moralismo inconsequente, que
atrapalha a tomada de consciência do próprio comprometimento nas contradições
da sociedade. Evita-se tocar nas raízes do mal, procurando bodes expiatórios
para a situação. Sob esta ótica, diante de fatos alarmantes como a difusão das
drogas, da AIDS, de novas formas de delinquência, a preocupação dominante tende
a se tornar aquela de defender o próprio espaço, suposto seguro de todos estes
riscos.
A periculosidade desta situação é mostrada bastante. U. Galimberti, por
exemplo, volta muitas vezes para o tema da técnica, que não reconhece como
limite nem a natureza, nem Deus, nem o homem, mas apenas a situação dos
resultados conseguidos. Ela não promove um sentido, não redime, não revela a
verdade. O mesmo autor observa como na “aldeia global”, onde qualquer diferença
é escondida, a pessoa concreta, reduzida a unidade intercambiável no anonimato
da cidade, onde o que vale é o dinheiro e o sucesso, desorientada frente a uma
pluralidade de propostas, que não tem instrumentos para avaliar, arrisca-se em
não ser capaz de realizar uma escolha autônoma de valores ou, reagindo, de cair
no fundamentalismo de uma defesa da própria identidade cultural ou religiosa
sentida como ameaçada. A consequência é que a capacidade de agir supera aquela
de pensar. Sua cultura é manipulada porque nega-se a liberdade de pensamento.
ÉTICA E SENTIDO
É urgente colocar-se a questão se a ética está em condições de contestar
ou ao menos de orientar com eficácia a lógica do pensamento instrumental, de
uma produção bastante em si, de propor pontos de aproximação sobre o modo de
regular a convivência em um mundo multicultural.
A posição de quem, como Galimberti, que considera ineficaz a exigência
da autoridade das normas frente ao poder da economia e dos instrumentos da
formação do consenso, e vê a necessidade de analisar os problemas que de tempos
em tempos se apresentam, em um contexto de tolerância e respeito da legalidade.
É preciso recordar que a exigência pura de um ideal é frágil e que, para criar
condições de um crescimento efetivo, deve ser acompanhado de uma adequada
análise dos dados. Ao contrário, se se quiser contrapor à lógica utilitarística
a consideração do bem efetivo do homem, e conservar em certa medida a liberdade
frente à pressão dos condicionamentos, são batalhas perdidas desde o início,
pois o círculo vicioso do útil se torna um círculo sem saída.
Para conseguir esta liberdade não basta a simples lembrança de uma
norma, na direção do formalismo do “dever pelo dever” de Kant, mas é necessária
uma instância axiológica incondicionada, um fim que pode ser querido
absolutamente porque se revelou o único capaz de responder às exigências
humanas de fundo, de convencer a mente e mover o coração, de infundir uma
esperança capaz de resistir aos desmentidos da vida.
É esta esperança que torna possível uma conversão que não é angústia por
sentido de culpa inconsciente, mas descoberta capaz de dar à existência no seu
conjunto um sentido e uma direção unitária, além da lógica do ter e dos
interesses imediatos. Esta escolha de um sentido e de um valor último, é além
do mais a condição que permite estabelecer com todos aquela relação de diálogo
que se revela indispensável em um mundo multicultural.
Em um mundo caracterizado por uma grave desorientação no plano dos fins,
a primeira função da ética é transmitir uma força capaz de transformar a
pessoa, abrindo-a ao mistério do outro. Quando no centro da ética não se coloca
o outro mas a defesa narcisística da imagem de si, se constróem atitudes
profundamente não idênticas.
A auto-suficiência de quem não quer reconhecer a verdade dos próprios
limites e incoerências, não entregando-se à esperança, é a essência última do
erro. É a busca de segurança em si mesmo, nos próprios ídolos, nas
racionalizações com as quais se quer dar a todo custo uma boa justificação. O
discurso vale tanto para o libertino, que fundamenta a sua segurança na recusa
de qualquer lei, e vale também para o formalista, que conta vantagem de uma
observância rigorosa, prescindindo da verdade da relação com o outro, que é o
verdadeiro sentido e escopo da lei.
A lei, indicação formal daquilo que é bom, não move a vontade, não muda
o coração, não torna o homem capaz de fazer o bem, e nem mesmo de escolher e
assumir livremente os valores e as normas. É, porém, indispensável enquanto
coloca o homem frente à sua verdade e aos seus limites. Somente com uma nova
perspectiva é que se torna possível u’a mudança, que não nasce de uma
imposição, mas é fruto da conversão do coração, da descoberta daquilo que
responde efetivamente às exigências mais profundas do homem. Só saindo de si
mesmo e lançando-se à gratuidade do amor é possível encontrar o caminho da
realização de si.
Em um mundo que se encontra em uma difícil passagem cultural, rico de
instrumentos mas privado da prospectiva de um fim, capaz de recompor em uma
unidade a sua fragmentação de propostas e de contrapropostas de regionalismos e
fundamentalismos. No atual impasse de um utilitarismo fechado no ter é
necessária uma reação profética, um anúncio de esperança de um sentido que não
é possuído mas oferecido ao homem e lhe permita instituir uma hierarquia de
valores entre as diversas realidades do seu mundo.
A pesquisa é a alma da ciência. As tentativas, as hipóteses, as
experimentações e as verificações são os instrumentos usuais com os quais o
médico desenvolve a sua prática profissional.
A complexidade e a riqueza do organismo humano, a complexidade e a
riqueza de cada expressão do fenômeno vida são tais que não consentem um
conhecimento exaustivo, completo, dado uma vez para sempre e mediante o qual
está em condição de entender todo o comportamento normal ou patológico do corpo
humano. As conexões que resultam sempre mais numerosas e implicantes, as
ligações que o mundo corpóreo humano tem com o universo inteiro, no intercâmbio
substancial entre o microcosmo e o macrocosmo, tudo isto, unido à vontade de
saber, de compreender e de modificar, que é típica do homem, coloca a
necessidade de pesquisa em primeiro lugar e a mostra como meio essencial de
conhecimento.
O que é novo, na época contemporânea não é tanto esta consciência de
procurar sempre respostas novas a perguntas emergentes, quanto o de verificar
se os objetivos da pesquisa foram colocados. De um procurar que tinha por
objeto o dado de fato, muitas vezes tratado na sua condição patológica que deve
ser colocada sob terapia, hoje se vai passando a determinar como objeto de
pesquisa aquilo que de mais íntimo o homem tem, isto é, a sua determinação
humana, a modalidade específica do seu ser no mundo, em uma palavra, a sua natureza.
O progresso das ciências biológicas e o crescimento de disponibilidades
de instrumentos de análise colocam hoje o homem não só em condição de observar,
mas também de examinar a própria vida. Cai, de alguma forma, o muro que
escondia o mistério. A vida se torna livro aberto cujas páginas são sempre mais
claramente compreensíveis.
O positivismo, como atitude filosófica e cultural, contribuiu muito para
fazer a medicina sair de uma condição de adolescente, empírica mas pouco
científica. O resultado foi o de tirar o cuidado da saúde e intervenções
ditadas mais por pré-compreensões ideológicas, algumas vezes até mágicas, do
que de conhecimentos científicos apropriados. Crescendo a medicina como
ciência, o centro de atenção mudou, levando em consideração o único dado
positivo e real à disposição: o corpo.
O desenvolvimento das ciências médicas consentiu uma pesquisa sempre
mais detalhada do corpo e de seus componentes, deixando passar uma repartição
setorial deste, a fim de observar cada canto e explorar cada meandro do seu
mistério. Surgiu u’a medicina altamente especializada que colocou em crise não
só velhos critérios de estudo, mas também das próprias estruturas sanitárias.
A concentração sobre o corpo, sobre a sua conduta e seu funcionamento
que o tipificam, fez com que muitos cientistas reduzissem o homem a mero
mecanismo biológico. Surgiram assim uma pesquisa e uma prática médica que
acreditavam que o corpóreo e a sua mecânica fossem o objeto adequado da própria
obra. O mecanicismo em biologia e em medicina foi a grande bandeira sob a égide do qual se desenvolveram as
empresas mais significativas e importantes do século XX, tanto no campo da
diagnose, como naquele da terapêutica.
Mas a insídia escondida sob os rompantes entusiasmados do progresso se
revelou em pouco tempo. Não faltou gente na época que protestou e alertou
frente à tendência reducionista mecanicista, em vista de um novo caminho tido
por necessário.
Uma ou outra pessoa reagiu contra os abusos perpetrados por médicos, que
nos campos de concentração nazistas submeteram seres humanos a experiências
desumanas e realizaram programas de eutanásia ofensivas à dignidade humana. A
opção de tais médicos nada mais é do que o resultado da formação que receberam:
ver no homem apenas um objeto a administrar, nada mais do que u’a máquina para
fazer funcionar ou fazer parar.
ÉTICA E PESQUISA MÉDICA
O reducionismo mecanicístico pode produzir uma separação da pessoa
humana, repropondo por um outro caminho a concepção dualística do homem composto
de alma e corpo, típica da filosofia helenística. A alma privilegiava o
elemento espiritual, ocultando o valor do corpo. Este exalta a corporeidade em
seu aspecto biológico, ocultando as dimensões do espírito.
O efeito é o mesmo, se bem que as variáveis sejam diferentes. O homem
perde a sua totalidade, despedaça a sua unidade e arruina a sua peculiaridade.
Pode-se dizer que o homem como pessoa é excluído do campo da pesquisa e da
cura. Ele é deixado fora da porta do laboratório e do hospital. Apenas entram o
seu corpo, os seus órgãos as suas funções biológicas.
Uma vitória sobre a escravidão do mecanicismo só pode ser obtida
mediante uma transformação da pesquisa. A necessidade de uma nova tipologia da
pesquisa leva à hipótese de u’a medicina antropológica. “Introduzir o sujeito
na biologia”, “medicina voltada ao doente”, “humanizar a medicina”, são estas
as pistas paralelas e convergentes de um caminho que conduz à compreensão do
homem, em sua unidade e totalidade, como centro, sujeito e critério de cada
pesquisa.
Uma pesquisa para o homem. Esta é a grandeza de um discurso ético. Não
se pode negar que sempre a pesquisa e a prática em medicina tenham sido
sustentadas por uma preocupação ética fundamental e intrínseca. O homem, a sua
natureza, a sua vida e a sua saúde eram entendidos como bens a salvaguardar e
proteger. A ética médica era a ciência que ditava os comportamentos concretos
para a salvaguarda e a defesa da vida. O “ethos” da profissão médica era, antes
de tudo, um “ethos” de controle, de vigilância sobre as fronteiras que não
deviam ser ultrapassadas, ou até de freios que deveriam ser acionados.
Muita importância, em tal quadro de valores, era atribuída à
consideração dos meios empregados, da sua taxa de risco, calculada isoladamente
do que em relação ao conjunto. O juízo ético sobre uma prática de pesquisa ou
de terapia era formulado com os critérios com que se chama hoje de “ética
deontológica”. A bondade da ação era tirada da própria ação, vista na sua
objetividade materializada.
Os limites de tal impostação se tornam ainda mais vistosos se e quando
esta produz juízos éticos que colocam na sombra, ou algumas vezes negam o mundo
complexo, suas intenções, dos seus móbeis e das finalidades que este se propõe.
A reviravolta antropológica, que a partir do existencialismo colocou o
homem e o seu viver concreto no centro de toda a consideração, contribui para
criar novas fronteiras e para criar novos espaços para a intervenção e
valorização ética, também no campo biomédico.
Introduzir o sujeito na biologia implica uma dupla realidade. Significa
tratar o ser sobre o qual e pelo qual se faz pesquisa e terapia como sujeito
tipicamente humano, reconhecendo-lhe dignidade e respeito. Mas pode significar,
também, em uma linguagem mais ampla, colocar-se na pesquisa biológica com
intenções, atitudes e qualidades substanciais de pessoa humana. Ser sujeito da
pesquisa, ser protagonista como pessoa, termina por atribuir a necessidade
intrínseca de dar uma validade ética à própria obra. E esta dimensão ética não
é definível se não em relação ao sujeito, às suas intenções e aos seus fins.
Tomás de Aquino (S. Th. I – II, 20, 2c) afirma que a bondade ética é
fruto de quatro elementos: o sujeito que age, a ação produzida, o fim a atingir
e as circunstâncias que interferem. A contemporaneidade de cada um dos
elementos, autônomos mas convergentes, permite a recuperação do sujeito que age
com a responsabilidade e a densidade do seu ser pessoa e, ao mesmo tempo, pela
finalidade que dá valor e qualidade a uma ação. A instância ética é algo a mais
que um simples controle. Colocando em questão a honestidade do sujeito e as
finalidades positivas que ele se propõe, a dimensão ética constitui um convite
e estímulo ao desenvolvimento pleno e
harmônico da pessoa, à comunhão entre homens e mulheres, à responsabilidades
diante do cosmo, ao inserimento consciente na História.
ÉTICA DA RESPONSABILIDADE E PESQUISA BIOMÉDICA
A bondade ética é processo. É caminho para a perfeição, para a harmonia.
É relação. É tensão na participação e no crescimento da comunhão, na qual a
pessoas se tornam elas mesmas e, em conjunto, todas formam a família humana.
A ética da pesquisa biomédica é, antes de mais nada, ética da
responsabilidade com relação à humanidade do homem e da família humana. Ética
da responsabilidade com relação à História e ao seu futuro. Ética da
responsabilidade com relação ao cosmo e ao seu equilíbrio. Para compreender em
profundidade a ética da pesquisa é preciso ter presente uma atenção à pesquisa
da ética.
O que se quer dizer é que nas preocupações do biólogo e do médico, como
de qualquer cientista, deve existir em primeiro plano a pesquisa constante da
dimensão ética, que consiste na responsabilidade. Tudo isto pode ser condensado
na imagem de uma ética que, em vez de trincheira delimitadora, é vista como
reservatório de significados.
A ética da pesquisa biomédica deve trilhar este caminho que constitui
hoje a única forma de legitimar a sua existência e o seu avançar. Uma pesquisa
para o homem deve concorrer para a construção do bem humano, para aquela parte
que constitui o seu campo específico. Mas o bem humano se constrói não através
de objetivos pragmáticos e ocasionais, mas através de um investimento amplo e
articulado das diversas potencialidades disponíveis.
Ética da responsabilidade na pesquisa poderá acompanhar o cientista em
cada fase de seu procedimento: o ajudará a esclarecer melhor os pontos de
partida de onde sai e os pontos de chegada para onde vai. Poderá ainda fornecer
o sentido de orientação de cada caminho de experimentação, que deve ser
pensado, cumprido e orientado na prospectiva do dom de si e das próprias
capacidades para o bem da pessoa e da comunidade humana, afim de que a pessoa e
a comunidade cresçam na consciência da própria dignidade de seres inteligentes,
livres e solidários.
Algumas vezes a ética da responsabilidade na pesquisa poderá também
sugerir a parada no caminho que, em vez de levar a u’a melhoria qualitativa da
pessoa e da comunidade, busca a vontade de poder de sucesso e de prestígio.
Estes limites, entretanto, antes de ser denunciados pelo poder político e
regulamentados pelo legislativo, deveriam ser analisados interiormente pela
própria pessoa e pela equipe que se aplica à pesquisa. Os seus motivos não
podem ser ditados pelo fechamento ao novo ou pelo medo do desconhecido, mas
deveriam ser inspirados pelo respeito da dignidade da pessoa humana que é um
ser dinâmico.
A responsabilidade da pesquisa desenvolve uma exigência altamente
educativa, por meio da qual os pesquisadores se sentem chamados a uma
consciência e constante indagação prudencial daquilo que pode verdadeiramente
concorrer ao bem do homem, ao crescimento do seu sentido humano, mais do que ao
aumento de seus bens.
O problema da qualidade de vida é um dos temas mais tratados na cultura
hodierna. A solicitação do cuidado da saúde atribuiu a cada homem e a cada
categoria profissional uma grande responsabilidade com relação à vida, que hoje
não é mais objeto da ciência médica, mas de cada uma das ciências, de cada um
dos pensamentos e de cada uma das ações.
O agrônomo, o dentista, o engenheiro, o advogado, o técnico, o médico, o
político, todos os homens são provocados, cada um a seu modo, a levar a sério o
bem fundamental que é a vida e fazê-la crescer sob os diversos aspectos. O homem
e a sua vida são objeto de atenção de cada ciência particular e de cada
disciplina em sua especificidade. Mas por nenhuma delas pode ser compreendida
de maneira exaustiva e total. Entretanto, o homem não pode sofrer uma separação
que o diminui e ofende.
Poderá ajudar, com distinções oportunas, quando se deva falar de
progresso científico e quando de progresso tecnológico. As consequências das
duas preocupações são diversificadas: o tecnológico é essencialmente voltado ao
ter, enquanto o científico ao ser.
ÉTICA, PESQUISA E BEM DA HUMANIDADE
A pesquisa no campo da biologia humana tem por objeto a vida do homem,
mas no sentido de respeito da totalidade. Existem grandes possibilidades de
intervenção no código genético humano, para modificações tanto terapêuticas
como modificativas. A pergunta inquietante que hoje se levanta é sobre a
legitimidade de tais intervenções delicadas, podendo só receber uma resposta
adequada de pessoas que não reduzam o homem a mera quantidade.
Não ama o bem humano e da humanidade do homem quem quer manipular a
herança genética para desenvolver nele os elementos que incentivam a capacidade
de produção, a capacidade agressiva, a vontade de domínio e de propriedade. O
homem não se define por aquilo que tem, pelos bens que possui, pelas coisas que
pode produzir, pela força que pode exercitar. O homem se define por aquilo que
é, pelo bem que está em grau de desejar, de dividir e de promover. Pelos
valores de solidariedade e de doação que pode realizar.
Quem pesquisa ou, como se diz, quem trabalha no campo da engenharia
genética, tem o dever fundamental de mostrar a que idéia de homem ele se refere
e inspira. Se ele tiver uma imagem antropológica privada de sua totalidade,
reduzida apenas ao homem do fazer e do ter, mais do que do ser, então há que se
ter preocupação com o rumo que a pesquisa trilhará.
Fazer crescer o homem em liberdade e dignidade será possível também, no
futuro, através de engenharia genética. Este futuro da humanidade é bem vindo
pois fará com que ela dê um salto qualitativo muito grande.
A vida, objeto da pesquisa médica, é vida do homem em sua plenitude. Uma
vida segundo a qualidade tipicamente humana que se define não tanto pelo
funcionamento correto da máquina biocorpórea, quanto pela capacidade de
aceitar-se como pessoa e pela vontade de melhorar a própria existência e a do
outro. Aqui o homem se reconhece como cruzamento vital de dimensões múltiplas,
as quais, apenas quando presentes ao mesmo tempo, garantem verdade e dignidade
à sua vida. Servir a vida quer dizer servir o homem no seu desenvolvimento
integral, no crescimento de sua qualidade humana, feita de alegria de existir,
gratidão pela vida recebida como dom, responsabilidade pelo ambiente,
solidariedade com os homens, abertura ao cosmo, ao ser.
A este tipo de totalidade, que pode ser chamada de intrínseca à pessoa,
verifica-se um outro tipo de totalidade que faz referência à família humana. O
destino do homem sobre a terra só pode ser compreendido integralmente na sua
dimensão planetária. O homem é um todo que misteriosamente se torna parte de
uma totalidade que o circunda e o transcende, e que é a humanidade inteira. O
bem de cada um e o bem da humanidade não são duas realidades que se excluem ou
que se contradigam. Na verdade se trata de um único bem que apenas por motivos
patológicos pode dividir-se e colocar em conflito as partes.
A pesquisa no campo da vida humana é sempre a pesquisa do bem para toda
a humanidade. Os profundos desequilíbrios econômicos, sociais e culturais
transmitem a imagem de um mundo dilacerado, onde estabelecem rachaduras,
criando a linha de separação entre o Norte e o Sul, entre a opulência e a
ameaça para a sobrevivência, entre o desperdício e a privação.
Uma pesquisa ao serviço da vida não pode criar um álibi e estabelecer
barreiras protetoras frente aos grandes problemas que surgem das diferenças
sócio-econômicas. Promover a vida não é só promover toda a vida, mas também
promover cada vida. A seu modo, também a pesquisa biomédica deve concorrer para
a superação da divisão do mundo entre o Norte e o Sul, que ofende o homem e
mata a humanidade, quem sabe mais do que as guerras, que também destroem.
ÉTICA, PESQUISA E SABEDORIA
Uma ética da responsabilidade deve saber encontrar equilíbrio na
repartição dos recursos destinados à pesquisa e à melhoria das mais diversas
situações de vida da família humana.
Não se pode permanecer surdo aos gritos de protesto e aos pedidos de
ajuda dos povos explorados e abandonados em condições indignas do homem e,
depois aplicar energia e capitais em projetos que tem pouca relevância social e
menor prioridade. Também aqui não se deve esperar ou exigir a ação ou a
vigilância dos organismos internacionais existentes. É preciso, antes de mais
nada, a consciência de ser um humano em escala planetária.
Se são numerosos os males dos quais parece sofrer a humanidade
contemporânea, entretanto numerosos podem e devem ser os remédios propostos.
Todos voltam para a sua raiz que é o homem, o seu coração, a sua
disponibilidade para o bem, o seu empenho para uma verdadeira e plena
humanização.
O homem é a medicina para o homem. Compreender a validade terapêutica e
humanizante que está em cada ser humano só pode romper com o imobilismo que
tenta invadir a pessoa, quando aparecem os grandes problemas humanos. Não pode não
suscitar em mulheres e homens de boa vontade as energias mais escondidas mas
mais atraentes, para dar um futuro diferente à humanidade, tanto para
libertá-la das divisões e da catástrofe total, quanto pelo abuso do equilíbrio
no ecossistema.
Procurar a vida, promovê-la, ajudá-la a reproduzir-se, são todas
expressões da grande função da ciência, e que a humanidade tem entre as mãos.
Mas é exigível uma grande sabedoria. A exclusão da sabedoria na economia, na
ciência e na tecnologia foi uma coisa que o homem até podia permitir-se, quando
os seus sucessos em tais campos eram muito relativos. Entretanto hoje, que ele
obteve bons resultados, o problema do sentido e da ética ocupa a posição
central.
Uma reflexão que se inspire na ciência e na sabedoria da comunidade
científica mundial deve iluminar a humanidade sobre as consequências da
pesquisa científica e, especialmente, aquela que se refere ao homem, afim de
que, de uma parte sobre posições anticulturais que retardam o progresso da
humanidade e, de outra parte, não se ofenda aquilo que o homem tem de mais
precioso, ou seja, a dignidade da sua pessoa, destinado a um progresso na
unidade de seu ser físico, intelectual e psíquico.
O pesquisador que ama a humanidade do homem não esconde os riscos e
enganos aos quais estão expostos a pesquisa e progresso. A primeira inquietação
é se o progresso torna a vida mais humana, mais digna do homem.
Nenhum limite, nenhum tabu deve existir para a pesquisa quando esta é
direcionada pelo respeito das condições humanas de existência, diante dos quais
o biólogo, o médico e o cientista devem colocar-se à escuta das inspirações do
bem que brotam da consciência e que se originam do diálogo interdisciplinar com
qualquer um que diga uma palavra a mais para entender o mistério do homem.
Estes são os desafios e as responsabilidades com os quais se deve medir
a pesquisa hoje. Cabe compreender que a pesquisa estimula a compreensão do
mundo, estimulando-a e abrindo-a a horizontes cósmicos e humanos globais.
Os cientistas tem a responsabilidade de realizar a síntese harmoniosa
entre a ciência e a visão prudencial do mundo, garantindo uma finalidade humana
para a pesquisa.
O despertar crescente de interesse pelo problema ético afeta sempre mais
numerosos campos da vida humana, da política à economia, da genética à
ecologia, das pesquisas sobre a inteligência artificial aos problemas jurídicos
da informática. A ética tradicional é de toda inadequada para resolver alguns
dos problemas complexos que são colocados pelo desenvolvimento da tecnologia e
dos progressos no campo médico, biológico, cibernético, informático...
A sociedade contemporânea se encontra frente a uma questão que jamais
como agora foi colocada com tal urgência e dramaticidade. Trata-se da escolha
entre o desenvolvimento incondicionado da pesquisa científica e de implementar
todas as possibilidades que esta comporta, ou a limitação das aplicações no
campo tecnológico, genético, informático, por motivos de defesa ambiental, de
utilização correta dos recursos naturais, de respeito pelas tradições culturais
de diversos povos, de atenção à dignidade do homem e de cautela frente a
eventuais formas de manipulação do indivíduo e da espécie.
Naturalmente que se coloca o problema de ver quem tem autoridade e a
competência para estabelecer os códigos de comportamento correto, com relação
aos encaminhamentos e às metodologias da pesquisa científica e das aplicações
relativas, como também para garantir os controles necessários.
O crescimento do conhecimento sempre foi visto como um valor, que deve
ser promovido e favorecido de qualquer maneira. O crescimento do conhecimento
científico, de uma forma geral, não pode fugir desta regra. A ciência não é uma
forma de conhecimento objetivo e neutro. Esta afirmação é fruto da crítica da
ideologia cientificista e positivista que caracterizou o desenvolvimento da
sociedade na época moderna, e quer recordar que existe uma estreita relação
entre os métodos com os quais são conduzidas as pesquisas científicas e os
escopos ou utilizações que seguem delas.
Não se coloca em discussão o conteúdo particular de cada lei científica,
mas o contexto no qual tal conteúdo é interpretado e no qual são legitimadas as
aplicações particulares. A ciência não é, pois, em formalismo abstrato,
rigoroso em seus métodos justamente porque desligado de qualquer consideração
de caráter humano. Ela sempre se coloca mais como parte de um saber realizado
em razão da exigência humana geral e universal. Coloca-se então a pergunta
sobre a qualidade e a natureza das relações entre ciência e ética. Relações que
a crise ambiental e os riscos da manipulação genética chamaram em causa.
A ecologia é hoje um assunto da moda, mas pouco se fez para a defesa do
ambiente e para a pesquisa de um modelo de desenvolvimento econômico e
industrial respeitoso da natureza e dos seus equilíbrios. Este atraso é devido
não só à responsabilidade dos governantes e dos técnicos, mas também de cada
pessoa, enquanto com o seu estilo de vida consumístico, contribui para
sustentar um sistema econômico que desperdiça os recursos, em vez de
administrá-los e recitá-los de modo natural.
Na pesquisa o que é essencial é a harmonia com a natureza, entendida
como realidade entregue à guarda do homem, pela qual ele tem responsabilidade
perante as futuras gerações. O desenvolvimento, a vontade de planificação que o
governa, o uso dos recursos e a maneira de utilizá-los não podem ser separados
do respeito pelas exigências éticas. Uma destas impõe limites ao uso da
natureza. O domínio dado ao homem não é um poder absoluto, nem se pode falar em
liberdade de “usar e abusar “ ou de dispor das coisas como melhor lhe
agradar.
CIÊNCIA E ÉTICA: DESENVOLVIMENTO CONTEMPORÂNEO
O instrumento que deveria consentir a compreensão da realidade natural
com o fim de utilizá-la de modo equilibrado e ordenado é a ciência. na
realidade, o desenvolvimento da ciência e da técnica criou uma série de
problemas (questão ambiental, desequilíbrios norte-sul, crise das culturas
tradicionais, esgotamento e sabedoria nem sempre coincidem.
Os desenvolvimentos da pesquisa científica nestes últimos decênios
mostraram progressivamente como a imagem positivista e mecanicista fosse de
todo inadequada, colocando também em evidência que a natureza não é um sistema
estacionário regido por poucas leis simples e facilmente conhecidas.
Em particular, a natureza não é um sistema reversível em confronto com
os sistemas simples que se estudam em mecânica. Qualquer intervenção humana
sobre a natureza deverá, portanto, levar em conta esta complexidade e irreversibilidade,
enquanto não é possível remediar os danos provocados por qualquer intervenção
humana sobre o ambiente, com a intervenção de um sinal oposto. Existem limites
além dos quais o sistema sofre modificações irreversíveis, no sentido em que o
nível de envenenamento e o grau de exploração dos recursos de um ambiente
natural apresentam valores de início além dos quais não é possível chegar sem
comprometer de modo definitivo a possibilidade de sobrevivência do próprio
ambiente.
Não se pretende aprovar um certo catastrofismo ecológico que está em
moda em determinados ambientes, e que se arrisca a criar apenas confusão, sem
chegar a esclarecer indicações sobre o estado real do problema e os oportunos
remédios. A insistência sobre o medo da catástrofe e sobre o dever de
sobrevivência não servem para esclarecer o resultado real no plano cognoscitivo
e sobre o ético do problema. A ética não se fundamenta sobre o negativo, sobre
o medo, mas sobre o positivo, sobre os fins determinados a realizar, e estes
fins estão inscritos na natureza do homem.
A ciência contemporânea colocou em evidência que o mundo não é
constituído de um conjunto de coisas, mas de um conjunto de fenômenos
interagentes. Isso aparece, pois, como um processo em que a matéria e a energia
se transformam continuamente, no qual a vida pulsa em todas as suas
manifestações e no qual o homem, com a sua inteligência criadora, realiza novos
horizontes ou possibilidades para a sua existência. Todos os sistemas
conhecidos, dos sistemas físicos àqueles sócio-econômicos, seriam constituídos
de partículas que se associam e se combinam, em razão de acontecimentos que
fazem surgir novas propriedades da combinação de elementos, que sozinhos não
dispunham de tais propriedades.
Compreende-se assim a importância assumida pela teoria geral dos
sistemas como ciência que tende a dar um enquadramento e uma caracterização
rigorosa a conceitos como o de finalidade, funcionalidade, estrutura
hierarquizada, totalidade ordenada, organismo, desenvolvimento, que são fundamentais
para compreender o comportamento de muitos processos em campos como o das
ciências biológicas, das ciências humanas, das ciências sociais. Tais conceitos
não são uma sobrevivência “metafísica” e aparecem irredutíveis aos conceitos
tradicionais das ciências químico-físicas, ou seja, aos conceitos de
quantidade, causalidade e ação recíproca.
A termodinâmica clássica, condicionada por tecnologias ligadas aos
problemas energéticos colocados pela revolução industrial e pelo
desenvolvimento das primeiras máquinas a vapor, é orientada a encontrar um
enquadramento dos fenômenos físicos dentro de esquemas teóricos lineares. Por
isso essa se limitava ao estudo de sistemas próximos ao equilíbrio
termodinâmico, isto é, sistema fechado, ideais, para os quais o estado final é
o de mínima turbulência, ou seja, de máxima homogeneidade, que corresponde à
perda de qualquer conteúdo de informação.
CIÊNCIA E ÉTICA: UNIVERSO, NATUREZA E HISTÓRIA
Sistemas longe do equilíbrio termodinâmico têm um comportamento não
linear, que pode dar lugar ao aparecimento de reações químicas que se comportam
de maneira rítmica e coerente, como também à formação de processos de
auto-organização que dão lugar a estruturas altamente não homogêneas,
caracterizadas por um aumento de informação. Acontecem reações que levam o
sistema de um estado menos ordenado a um mais ordenado.
Pode-se falar de uma nova coerência, de um mecanismo de comunicação
entre as moléculas. É interessante que tal tipo de comunicação parece ser a
regra do mundo da biologia. Talvez é a base verdadeira e própria da definição
do sistema biológico como um todo. Começa-se a ver como, partindo da química,
pode-se construir estruturas complexas, formas complexas, algumas das quais
podem ter sido percorridas pela vida. O que parece certo é que estes fenômenos
que acontecem longe do equilíbrio ilustram uma propriedade surpreendente e
essencial da matéria: pode-se dizer que as estruturas se adaptam às condições
externas, como um tipo de mecanismo de adaptação pré-biológico.
Em condições de afastamento do equilíbrio termodinâmico, a matéria
parece ser muito sensível às condições do mundo externo, pode reagir com
grandes variações a pequenas causas, pode dar lugar a bifurcações. Na
proximidade dos pontos de bifurcação é impossível prever com certeza qual ramal
o sistema escolherá cada vez e para qual estado final se dirigirá.
Compreende-se pois o liame com a teoria da informação. As ciências naturais e
as sociais apresentam “inícios”, ou efeitos de “gatilho”, que desencadeiam
processos não compatíveis com a exiguidade das causas. Estes efeitos de início
ligados a problemáticas da instabilidade e de bifurcações, explicam como a
informação, que pode ser considerada como uma pequena quantidade de energia,
está em grau de produzir grandes efeitos se utilizada de modo oportuno.
Parece correto afirmar que a matéria, desde a origem do universo, está
se transformando, se tornou a base de cada complexidade crescente, e neste
processo começou aprender a incorporar e a transmitir informação. A velha dicotomia
ente espírito e matéria não se supera se não se reconhecer à matéria um
estatuto muito particular, aquele de ser veículo de qualquer coisa “imaterial”,
a informação. A matéria decai e se renova, mas o que permanece é a informação
que nos simples agregados de moléculas tem a sua primeira natureza: é memória
do forma.
Enquanto cada estrutura física, quer se trate de galáxias, de estrelas,
de homens, se transforma e se separa, permanece e aumenta constantemente a
informação que as bases materiais transportaram. O que é chamado de matéria e
quem sabe apenas a origem de uma informação em contínuo crescimento. Isto
implica um grande aumento de significado na História do universo.
As leis da mecânica clássica tem um caráter determinístico e são
invariáveis com relação ao tempo. Tudo isto favoreceu a idéia de um perfeita
controlabilidade do sistema físico e de uma ilimitada possibilidade de
manipulação e de transformação da realidade natural. Esta ilusão diminuiu
quando a ciência descobriu a complexidade da realidade da natureza e as
numerosas relações que existem entre os diversos níveis sobre o qual se
estrutura a própria realidade.
A idéia de que muitos processos físicos sejam irreversíveis, que a
muitos destes esteja associado um aumento de informação local, que cada evento
pode desencadear efeitos de gatilho, parece indicar que o homem está imerso em
uma História evolutiva que tem uma escala cósmica. Tal História não é fruto do
“acaso” e da necessidade, mas tem caracteres de unicidade e de irrepetibilidade,
é continuamente aberta à novidade e à emergência de estruturas mais complexas,
às quais correspondem potencialidades mais amplas.
CIÊNCIA E ÉTICA: PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO
O caráter de historicidade e de irrepetibilidade do universo constitui a
base para uma reflexão de caráter ético, que no âmbito da ciência clássica
parecia de todo impossível. As ações humanas tem um caráter ético porque não
obedecem a simples esquemas de causalidade linear, mas podem influir de modo
diferente sobre o curso dos acontecimentos, determinando ao menos em parte a
estrutura da sociedade e as condições de vida das gerações futuras.
As ações humanas não se inscrevem simplesmente no quadro do mundo, mas
criam o mundo e podem influir de modo decisivo no curso da História. A realidade,
seja aquela natural seja aquela histórico-social, não é uma estrutura para
atingir livremente para a satisfação egoística das necessidades humanas, mas um
sistema de inter-relações em cujo interior os homens estão inseridos e que
devem contribuir para defender e desenvolver de modo correto.
Uma das característica do psiquismo humano consistiria na perda de
certos comportamentos inatos, fixados no DNA, que seria compensada pelo aumento
da comunicação e das relações sociais, com um maior desenvolvimento do
adquirido, a partir ainda da primeira infância. O homem no início da sua
História sofreu como cada outro animal a lei da evolução biológica, mas a
partir de quando deixou de lado os automatismos esclerosados e se beneficiou
das primeiras tradições, participou ativamente de sua evolução.
Ele é o único ser vivo que foi, com certeza, parcialmente artesão de si
mesmo. Daí resulta evidente a importância da cultura, que constituiria o
prolongamento direto da evolução biológica e cósmica, e estaria ligada ao
desenvolvimento da comunicação e da cooperação no interior das comunidades
humanas.
O desenvolvimento cultural humano seria determinado pela cooperação além
da competição. A cultura é a mente de grupo do “homo sapiens” e depende da
cooperação. Parece que existe uma estreita ligação entre a ética e as condições
de desenvolvimento da sociedade, entre a definição de valores ou de finalidade
a ser buscada no âmbito dos grupos sociais e as capacidades dos próprios grupos
de desenvolver relações corretas, tanto no próprio interior como nos confrontos
do mundo externo.
Deve-se recordar a tal propósito que a epistemologia contemporânea
reconheceu o papel fundamental desenvolvido pelo sistema de valores, ou visão
de mundo, adotado por uma comunidade, cuja função parece ser aquela de permitir
a um determinado grupo de dar sentido à atividade do seu mundo externo, dedicando uma atenção
seletiva ao próprio ambiente, e reduzindo pois, em termos de exigência do
grupo, a quantidade de informação a elaborar. O próprio conhecimento científico
aparece como um possível modo de interpretar a realidade, e é no âmbito das
ciências humanas que o momento hermenêutico se torna dominante com relação
àquele explicativo.
A preocupação pela ética, a necessidade de uma sua fundamentação
coerente e de um liame constante entre reflexão ética e observação empírica
giram em torno de um problema fundamental, ou seja, aquele do dever de
sobrevivência para a espécie humana. Tal dever não deve ser entendido de modo
egoístico como resposta ao medo da catástrofe.
A questão da sobrevivência se torna objeto de decisão e de reflexão
especificamente éticas, na medida em que a sobrevivência está ligada à defesa
do caminho realizado pela humanidade na tentativa de buscar determinados fins e
estes fins devem ser aqueles inscritos na natureza humana. Pode-se estabelecer
como hipótese que o objetivo ao qual deve tender a comunidade humana seja
aquele de formas sempre mais aperfeiçoadas de cooperação e de integração
social.
CIÊNCIA E ÉTICA: SISTEMA DE VALORES
As diversas civilizações são capazes de desenvolver uma identidade
histórica, na medida em que são capazes de exprimir um nível de auto-realização
ética, mais pertinente ao daquele das civilizações que a precederam.
Em outras palavras, pode-se dizer que existe interdependência entre as
condições econômico-sociais e os valores que caracterizam as modalidades de
organização de uma determinada sociedade. O problema da cooperação está ligado
à definição dos fins e valores a realizar no âmbito da sociedade humana. Isto
reconduz ao problema da relação que deve existir entre ética e política.
O sistema de valores não é um simples reflexo da prática, mas um fator
que guia o processo de leitura e de interpretação dos dados e das informações
que um determinado grupo social recebe de seu mundo exterior. Pode-se dizer que
a teoria está ligada à prática de um modo circular. Em cada construção formal
que se propunha a descrever e dar razão à experiência estão sempre presentes
explícitas a dados empíricos não deduzíveis da teoria. De outra parte, é
impossível reconduzir tudo o que é objeto do pensamento à sua base estritamente
empírica, ao puro dado. Em razão disso pode-se afirmar que toda observação
pressupõe uma teoria.
A extinção do socialismo real não deve levar a crer que no interior do
mundo ocidental não estão presentes problemas e contradições também graves. O
mundo capitalista olha a economia com o principal ponto de referência,
considerando religião, valores e metafísica como falsos problemas, restolho de
uma forma de cultura atrasada e arcaica. Em lugar de buscar o máximo
desenvolvimento das forças produtivas, o capitalismo procura o máximo
desenvolvimento do lucro e da competitividade, conseguindo na aparência grandes
sucessos, mas criando uma série de problemas no plano humano e social de
extrema gravidade.
Deseja-se referir ao agravamento das tensões internacionais, à separação
sempre mais ampla entre países ricos e industrialmente avançados e países
pobres e subdesenvolvidos, à exploração incontrolável dos recursos naturais e à
degradação sempre maior do ambiente, ao sempre maior sentido de mal-estar e de
insegurança que atinge as sociedades econômica e tecnologiamente avançadas.
Este sentido de mal-estar e de insegurança é colocado em evidência por fenômenos
de desadaptação social, da difusão da delinquência comum e organizada, pela
ampliação do fenômeno do uso e do comércio de entorpecentes.
No mundo ocidental tudo serviu à economia. a sociedade é organizada
segundo fins que não são aqueles inscritos na natureza do homem, pelo qual o
indivíduo e a comunidade não tem os seus desejos de crescimento e liberdade
prejudicados.
Os ritmos de vida sempre mais frenéticos e absurdos, a uniformização das
necessidades e a criação de outras em função da produção e não da pessoa humana
ou da sociedade, a imposição de modelo de vida “ocidental”, em prejuízo da
originalidade das diversas culturas e da capacidade de cada povo de resolver de
modo próprio e original os problemas da vida, a massificação da sociedade,
realizada através da persuasão escondida da propaganda e a substituição da
consciência com o conformismo, usando o terrorismo ideológico para o
dissidente. Tudo isto está do lado oposto do conceito de cooperação livre e
criativa.
Muitos cientistas percebem hoje a responsabilidade por terem fornecido
ao poder político meios de destruição e de terror e de terem contribuído a um
uso de conhecimentos científicos nem sempre conformes com as exigências de
salvaguarda da natureza, de desenvolvimento equilibrado da civilização
tecnológica, de respeito pelas diversas tradições culturais e de uma
distribuição equitativa das vantagens derivadas do desenvolvimento científico.
CIÊNCIA E ÉTICA: HISTÓRIA
A ciência reconhece hoje a complexidade dos sistemas naturais e a
especificidade de cada um deles. A intervenção do homem sobre o ambiente
natural estar consciente e respeitosa desta complexidade e especificidade,
tendo em conta as vastas inter-relações entre os sistemas naturais que tornam
possível a vida sobre a terra nas suas diversas manifestações.
A ecologia não é u’a moda, mas uma ciência rigorosa do ambiente e dos
seus mecanismos de regulação. Baseando-se neles é que podem ser estabelecidas
as linhas diretivas de qualquer intervenção humana sobre o ambiente. Aqui se
abre um assunto complexo. A intervenção do homem não se limita hoje a u’a
modificação do ambiente, mas pode ser impelida a u’a manipulação das espécies
vegetais e animais, podendo tentar u’a manipulação do próprio homem.
A ciência não pretende impor-se como uma nova forma de moral,
entretanto, de um exame atento do estado da pesquisa, emergem alguns elementos
que podem ajudar na definição das linhas diretivas que deverão inspirar a ação
do homem no seio da natureza. Existem limites ao desenvolvimento e, portanto, valores
como crescimento econômico, bem-estar, contínua disponibilidade de bens, não
podem ser mais assumidos como guia ou como norma das escolhas econômicas ou
políticas.
De outra parte é necessário recordar que a industrialização foi um fator
determinante de progresso não só sob o aspecto econômico mas, também, sob o
prisma social e político. De outra parte, ela produziu fenômenos negativos como
a poluição, a urbanização forçada, o fim da civilização rural e dos seus
valores, mas também permitiu a eliminação da miséria e do atraso de muitas
regiões da era pré-industrial.
A expansão industrial é um exemplo que ilustra bem como o caráter
positivo ou negativo de qualquer ação humana depende e das situações em que
esta se insere. O que em determinadas condições históricas pode –ser útil e
positivo, em outras circunstâncias pode constituir uma tendência negativa, que
deve ser limitada e controlada. O desenvolvimento econômico consequente do
processo de industrialização tinha um caráter positivo enquanto permitia combater,
de modo eficaz, o atraso e a pobreza.
Hoje, em muitos países, o crescimento econômico e industrial não serve
para combater fenômenos negativos, mas ele se tornou um fator pernicioso
enquanto dá origem à poluição, esgotamento das riquezas, consumismo... Um
processo se torna negativo quando impede o crescimento e o desenvolvimento.
A função dos valores é o de fazer emergir algo novo da História, de
despertar os interesses, as capacidades ou potencialidades criativas a nível
pessoal e comunitário. O valor é o caminho para o fim, para um fim que se
incarna na História, mas que não se reduz a uma simples adequação, mas que não
se reduz a determinadas condições históricas, e tende a um superamento, a uma
sua reinterpretação, segundo uma ótica mais ampla e mais profunda. Os valores
tem uma relação com a História, mas tal relação deve ser lida em sentido
transcendente e não imanente.
É preciso que haja plena liberdade de pesquisa, mas esta deve ser vista
sob a ótica da responsabilidade, da seriedade, do rigor. O conhecimento é um
valor, um instrumento de crescimento e libertação do homem, mas não pode ser
separado de outros valores igualmente importantes, como o respeito pela pessoa
e por sua dignidade e a defesa do ambiente natural, na convicção de que se tem
responsabilidades precisas com relação às gerações futuras.
É preciso deixar de olhar a ci6encia como um formalismo matemático
abstrato que procede autonomamente na base de um mecanismo lógico. Ela tem um
caráter histórico, limitado e falível. Como tal, ela deve ser encarada como uma
aventura do pensamento humano que procura conhecer e compreender a realidade
natural.
A
bioética está sempre relacionada com um modelo ou com um fundamento de
antropologia. Ela baseia os seus princípios e suas afirmações normativas sobre
uma determinada concepção de homem. Não é possível uma bioética sem uma
fundamentação antropológica.
Propõe-se aqui o personalismo como modelo antropológico de referência,
que é baseado sobre a dignidade da pessoa humana. Não se quer discutir aqui as
características desta antropologia.
Esta dignidade singular se baseia sobre o ser humano, constituído de
inteligência e vontade, consciência e liberdade. Assim, seu corpo não é
reduzível a mero “bios”, ou matéria biológica, mas nas suas manifestações é
revelador de instâncias valorativas e, portanto, de exigências de respeito.
A vida humana na sua integridade exprime a pessoa e participa de sua
dignidade, não podendo ser usada como meio para algo. Deste núcleo ontológico e
axiológico da vida humana, como pessoa, nascem os princípios fundamentais da
bioética.
Princípio da unidade e totalidade, pelo qual não se pode reduzi-lo a
mero objeto. Como tal, a vida humana é princípio e fonte de moralidade,
portador de exigências éticas.
Princípio da indisponibilidade, pelo qual não se pode reificar e tratar
a vida humana como um bem instrumental, com valor de uso. Não se pode servir da
vida de uma pessoa para fins estranhos a ela. A vida humana tem valor de fim,
não de meio.
Princípio da terapêutica, pelo qual é obrigatório cuidar da própria vida
e da dos outros na presença da doença, mas também na prevenção desta em vista
da proteção da saúde e para a promoção da qualidade de vida.
Princípio da proporcionalidade, através do qual deve-se procurar uma
cura quando há proporcionalidade entre seu emprego e os resultados esperados,
tendo em vista as condições do paciente. Deve-se renunciar quando os meios são
desproporcionais.
Princípio de solidariedade e subsidiariedade, pelo qual, cada vida
humana, inalienável em sua autonomia, é um bem para todos e, como tal, une e
responsabiliza todas na promoção, na tutela e na cura, em razão das
necessidades de cada um. A responsabilidade não é só individualista mas,
também, social e política.
O modelo liberal também acolhe o conceito e o bem da pessoa, mas o
concebe e acredita em sentido subjetivístico, ou seja, a pessoa é uma
consciência e uma liberdade auto-referencial ou autocêntrica, de tal forma que
se torna o árbitro da moralidade. A bioética se ressente, difusamente, desta
subjetivação da moral de várias formas.
A subjetivação emotiva coloca a bioética sob o princípio do desejo. A
própria vida e daqueles que são considerados propriedade própria é condicionada
pelo sentir subjetivo do indivíduo.
A subjetivação utilitarista coloca a bioética sob o princípio do lucro.
A vida é só condicionada por parâmetros econômicos.
A subjetivação sociologista coloca a bioética sob o princípio da opinião
dominante. A vida humana depende do valor que a cultura ou a ideologia
dominante estão dispostos a reconhecer-lhe.
A subjetivação nihilista coloca a bioética sob o princípio do arbítrio.
Tudo depende do modo de pensar e da liberdade de escolha do sujeito.
A bioética apela para um conhecimento não meramente fatual e empírico,
manipulador e calculador, emocional e sensacionalista, mas a um conhecimento
sábio e contemplativo, capaz de perceber o que existe de incomensurável e
indispensável em cada vida humana.
BIOÉTICA E CIÊNCIA
A bioética nasce do progressivo desenvolvimento das ciências biomédicas
e das suas aplicações tecnológicas, dando origem a uma problemática que envolve
a relação entre os dois saberes. O problema não se põe como questão teórica mas
de fato, das inéditas e preocupantes possibilidades de intervenção sobre a vida
humana.
Acontecem tensões contínuas entre a possibilidade técnica de novas
práticas biomédicas e a sua admissibilidade ética. Tais tensões não podem
encontrar solução nem em uma ciência monopolizadora da racionalidade humana nem
em uma ética desconhecedora da legítima autonomia da ciência. Esta monopoliza a
racionalidade quando presume decidir sobre a bondade humana de suas descobertas
e da sua aplicação tecnológica. A ética, por sua vez, desconhece a autonomia da
ciência quando prescinde das suas relações cognoscitivas na própria função
normativa. E é assim que a racionalidade científica e aquela ética se opõem e
se contradizem.
A solução das tensões não passa por estas oposições, mas pelo encontro
das autonomias legítimas. A bioética não pode ignorar os progressos das
ciências e de suas contribuições para a verdade na ordem do conhecimento da
vida humana e das descobertas biomédicas. Uma bioética enraizada apenas nos
próprios princípios, fechada em uma concepção abstrata da vida humana e da lei
natural, é incapaz de discernir, compreender, motivar e persuadir.
A racionalidade ética está aberta à racionalidade científica e
vice-versa. A racionalidade científica não absorve a racionalidade ética,
relativizando a ordem dos valores e dos fins humanos, mas se relaciona com
estes. O verdadeiro não coincide com o dado científico. Enquanto dado humano,
tem uma sua profundidade que a racionalidade técnico-científica não pode
exaurir. Ele deve ser expresso em âmbito de valor, para compreender a validade
humana, e assim é introduzida a instância ética na ciência e na técnica.
Entretanto, isto não acontece automaticamente, em razão das diversas
aberturas epistemológicas da ciência e da ética, da biomedicina e da bioética,
mas como o relacionamento efetivo da racionalidade científica dos dados e dos
meios com aquele da ética dos valores e dos fins. São necessárias a consciência
e a responsabilidade éticas do biólogo e do médico, distinguindo o dado do
valor, a praticabilidade técnica da liceidade ética.
Hoje está rompida a relação da ciência com a sabedoria, da técnica com a
ciência. A ciência, enquanto é aliada da sabedoria, é orientada continuamente
por esta na direção de uma verdade única, integral e indivisível do homem, de
tal forma a não prescindir, na sua diferenciação epistemológica, de instâncias
de outro gênero. A mudança de relação da ciência com a técnica pois, na
atualidade, é o investimento técnico que comanda a pesquisa científica, tende a
romper aquela aliança, a tirar da ciência toda influência da sabedoria. A
ciência sofre o predomínio tecnocrático, cujo poder não é o da ética, mas da
ideologia dominante e do mercado.
Deste modo é que aparece uma racionalidade biotecnológica voltada sobre
si mesma, baseada sobre todos os fatos, sobre resultados e produtos, ou seja,
sobre verdades pragmáticas que prescindem de significados, presume bastar-se a
si mesma e de decidir sozinha aquilo que é humanamente admissível, voltando-se
apenas às necessidades e desejos dos sujeitos, encontrando nestes a própria
legitimação.
Uma racionalidade biológica é uma aproximação fundamental e
imprescindível da verdade do homem, mas setorial e parcial. Esta faz apelo a
uma racionalidade meta-biológica de significação antropológica e, portanto,
valorativa. Em biomedicina é preciso afirmar que nem tudo o que é tecnicamente
factível pode ser eticamente admissível.
A liberdade de consciência encontra a sua justificação enquanto condição
necessária para a pesquisa da verdade e para a adesão a esta quando foi
conhecida adequadamente.
A consciência moral tem três elementos característicos. A primeira é que
a consciência é a capacidade de discernir aquela lei inscrita no coração de
cada homem que o impele a agir com consequência, ou seja, com empenho e responsabilidade
pessoal. Tal lei é co-natural ao homem, é o sinal de seu ser pessoal. É
anterior a qualquer legislação positiva do Estado e de qualquer outra
sociedade.
A segunda característica é que a consciência moral não é um oráculo
infalível, não é qualquer coisa de absoluto, colocada acima da verdade ou do
erro, mas esta é a procura da verdade objetiva e tem na própria verdade
absoluta o seu critério último de autenticidade e de moralidade.
A terceira característica é que a busca da verdade objetiva deve ser
livre no seu duplo significado: livre de aderir a verdade e livre de qualquer
forma de coerção externa.
Agostinho exprimiu claramente o mais profundo dinamismo da consciência
humana para a verdade absoluta, sob o signo da liberdade do amor em dois textos.
O primeiro das “Confissões” diz “ama e faz o que queres (Dilige, et quod vis
fac); se calas, cala por amor; se tu falas, fala por amor; se corriges, corrige
por amor; se perdeoas, perdoa por amor; esteja em ti a raiz do amor, pois desta
raiz não pode proceder se não o bem. O segundo do Comentário do Evangelho de
João afirma: “mas onde existe o amor, existe paz” (ubi autem charitas ibi pax).
A consciência ética do homem no emitir o próprio juízo sobre a
moralidade do ato a ser realizado pode ser reta ou errônea, certa ou incerta,
verdadeira ou falsa. Por isso para cada homem se impõe o dever de formar e de
educar a própria consciência, a fim de que ela se torne sempre mais uma
consciência reta.
É óbvio que este trabalho de formação e de purificação da própria
consciência não pode ser feito sozinho. Dada a natureza social do homem e dado
que a consciência humana nasce, cresce e se desenvolve em um ininterrupto
entrelaçamento de relações com os outros
em um confronto vivo entre pessoas, é necessário que outros sujeitos concorram
para ajudar a formação da consciência justa do homem.
Os grandes sujeitos sociais que entram diretamente na formação da
consciência individual são a família, a escola, as instituições educativas, as
comunidades diversas e os meios de comunicação social. O papel destes últimos é
extremamente importante, e até essencial, para promover a pesquisa da verdade,
pois muitas vezes a média é a única fonte de informação para um número sempre
maior de pessoas.
Na História dos homens, um fruto da consciência errônea, que chega à
cegueira, é a intolerância por motivos políticos e sociais, culturais e
religiosos. A intolerância constitui uma séria ameaça para a paz, pois leva à
recusa da liberdade de consciência dos outros. Na vida pública a intolerância
não deixa espaço à pluralidade das escolhas políticas ou sociais, impondo assim
sobre todos uma visão uniforme da organização civil e cultural. Todos os
totalitarismos, antigos e modernos, adotam esta visão de mundo apoiada na
repressão, na marginalização e na perseguição violenta, física ou moral, de
particulares e de grupos, como forma de governar.
Apenas uma virtude ou hábito mental pode ser contraposto a este
dogmatismo: a tolerância. Sob o ponto de vista teórico e prático significa o
respeito e o reconhecimento para com aqueles que pensam diferentemente. É a
condição da liberdade de consciência, ordenada, por sua natureza, à busca da
verdade. E a procura da verdade não conduz à intolerância, mas ao respeito e à
reconciliação.
Antigamente, os pobres eram tidos, como desadaptados para qualquer
cultura, relegados a um, “status” social de inferioridade incapazes de assumir
uma própria norma ética. Eram julgados exclusivamente por critérios éticos
aceitos por pessoas instruídas e “civilizadas”.
Nos tempos hodiernos, o termo ”cultura” adquiriu um significado
amplamente antropológico. A cultura pode existir e desenvolver-se também entre
pobres incultos. Uma vivência popular, mesmo praticada entre mendigos, pode
oferecer um sentido espiritual até agradavelmente original.
O costume popular adquiriu uma missão propriamente antropológica. Já que
a vida humana é vivificada por valores existencialmente inefáveis e nenhuma
classe de pessoas sabe exprimir com plenitude, as próprias culturas populares
são convidados a fazê-los emergir socialmente de modo consciente. Legitimamente
a vida social é hoje concebida unida no entrelaçamento de culturas tanto doutas
quanto populares.
A classe dos excluídos, tendo uma cultura própria, um modo próprio de
raciocinar, de sentir afetivamente, de exprimir-se, de apresentar-se dentro de
formas institucionais, de atuar socialmente, muitas vezes revela uma legítima
visão autônoma dos valores, um costume próprio, uma experiência espiritual
singular, um “ethos” próprio, praticado intensamente.
A ética, estruturada em racionalidade sistemática, gosta de
apresentar-se como a única e a autêntica. Por princípio aceitou que nenhum
“ethos” popular dos excluídos pudesse de qualquer modo substitui-lo ou mesmo
colocar-se a seu lado. Jamais admitiu que pudesse existir valores autênticos
fora de sua formulação normativa. Pediu para ser reconhecida como a única
valoração legítima do honesto. Ela punia quem ousava, afastar-se de sua
normatividade e, portanto, não podia gozar de segurança.
De tal modo, o “ethos” popular dos excluídos, se discordante da ética
oficial, era reduzida a ser, no máximo, uma opinião pessoal, que não recebia o
apoio institucional. Não deve ser sacralizada nenhuma ética existente, nem a
oficial e nem a popular. Existe na meta, de qualquer forma transcedente, à qual
todas as éticas existentes são chamadas a colaborar. Estas devem ajudar-se
mutualmente a exprimir da forma menos inadequada a indicação normativa
fundamental da manifestação do ser.
Na descoberta do novo mundo foi imposta a ética européia em desrespeito
aos costumes dos povos indígenas. Nenhuma ética formulada é vivida é autorizada
a não aceitar e acolher a experiência ética vivida em outro lugar. É necessário
acolher as indicações éticas vividas por qualquer população, sobretudo daquelas
comunidades que participaram do sofrimento.
Segundo a Escolástica a “reta razão” tem a finalidade de determinar a
normatividade ética. Semelhante enunciado não parece existencialmente
proponível. De fato, nenhuma razão pessoal é de todo “reta”. Não aparece jamais
claramente habilitada a tratar de uma norma plenamente objetiva.
Qualquer faculdade humana, no seu exercício, reflete a configuração de
toda a personalidade subjacente. A razão está intimamente condicionada pela
tendência afetiva difusa no próprio ser pessoal. A fim de que possa formular
retamente uma verdade ética, pressupõe que o inteiro ser pessoal subjacente
seja verdade. Para poder enunciar valorações pessoais, requer existir até o
mais profundo inconsciente. Uma pessoa, quando se propõe dar um juízo ético
objetivo, inconscientemente o faz permeado de um implícito subjetivismo, que é
ineliminável.
O princípio clássico ético declara que a consciência é um absoluto, ao
qual todos os homens tem de ater. Isto não nega que esta mesma seja
condicionada pelo próprio estado pessoal passional.
Depois da segunda guerra mundial, a responsabilidade passou a ser um
conceito ético fundamental, pois a moralidade dificilmente pode seguir
limitando–se ao cumprimento de alguns deveres legais. Frente a ética até agora vigente, a
consciência do problema é ampliada em três aspectos.
Em primeiro lugar, no que se refere à competência ou campo, já não
atende apenas a obrigação de um para com o outro, mas também a trama solidária,
em especial das pessoas jurídicas e da representação dos mais diversos
interesses em favor do desenvolvimento em escala mundial. Em segundo lugar, no que se refere ao
alcance, há que se incorporar, além da conservação do ser humano corrigindo a
limitação autropocêntrica até então em uso, na direção não humana no sentido de
uma macroética planetária. Em terceiro
lugar, com relação ao horizonte, não só deve–se conservar o respectivo
estado atual, mas há que se examinar os efeitos das próprias atuações com vista
à sua conciliação com as condições de um futuro genuinamente humano.
Seguindo o jogo da pergunta e resposta, este conceito desenvolve–se
assim : a) Uma pergunta é experimentada
na consciência como vinculante, como um dever. b) Em virtude desta vinculação
pessoal, o ser humano se sente induzido a agir de acordo com a idéia da obrigação e a responder assim
existencialmente pela pergunta. c) Este
processo culmina e se fecha, quando alguém toma consciência do procurado e do
ocorrido, ou seja, quando alguém se responsabiliza.
É preciso distinguir entre “responsabilidade” no sentido da competência
vinculante, que deve ser assumida frente a um determinado setor da atividade ou
da vida, assim como no sentido de ter que responder à autoridade competente. E
de outra parte a “responsabilidade” que aponta sobretudo para a obrigação
pessoal que dela deriva de dar conta da própria ação ou omissão e, se o caso
requerer, reconhecer a própria culpa e levar a cabo uma reparação. Age com consciência responsável quem vive na
atitude de prestar conta e razão de sua conduta.
a) O sujeito responsável, a pessoa capaz de uma atuação moral (actus
humanus ) se encontra numa dupla relação: b) ele enfrenta uma instância
legitimada para o questionamento: c)
ante a qual deve justificar-se pelo objeto, tanto no que se refere às ações,
suas consequências e seus efeitos secundários, como às pessoas ou às
coisas. d) Estes três fatores
acabam fundindo-se pela obrigatoriedade, que deriva da competência de cada
situação assinalada.
Na concepção atual, só se pode falar de responsabilidade na medida em
que um sujeito que age goza de conhecimento e liberdade, ou seja, na medida em
que conseguiu na maturidade social, que engloba os componentes intelectuais,
voluntários e emotivos. A “questionabilidade” do homem, assim como a sua
obrigação de responsabilizar–se, podem ser vistos como um dado fundamental do
homem. O homem experimenta-se constantemente como devedor, que está frente a
exigências, pois enquanto, ser social só pode realizar-se na comunidade
solidária.
Para a ética, há três tipos de instâncias para as quais deve o homem
deve prestar contas. Em primeiro lugar,
ele é responsável perante sim mesmo; em segundo lugar, diante daquelas pessoas
que em seu próprio nome ou em nome de uma comunidade podem questionar; e
finalmente diante de Deus, se acreditar nele, o único que poderia pedir as
contas sem limitação.
A obrigatoriedade, que mantém todos unidos, pode ser definida como uma
vinculação na liberdade. O estar
pessoalmente obrigado pode derivar da própria natureza da coisa, da ordem de
uma autoridade competente ou pode ser o resultado de uma promessa voluntária e
livre. Qualquer que seja a forma, este
estar obrigado deve estar ligado com a liberdade, como pressuposto necessário
para a imputabilidade.
Desde que nunca se podem valorar todas as consequências de uma ação,
também o cálculo dos riscos e de sua possível compensação é próprio de uma
pessoa consciente e responsável. É
preciso opor - se à propensão crescente de escapar da responsabilidade ou de
voltar a colocar–se sob a tutela da obediência.
CORRUPÇÃO
Atualmente, os meios de comunicação denunciam por toda a parte casos de
corrupção. Só nos anos noventa caíram governos na Itália, Paquistão, Indonésia,
Zaire, Brasil... Os cidadãos começam a não mais tolerar a corrupção dos
políticos. As tentativas de controlá –la se tornaram concretas quando a
indignação da gente comum recebeu apoio por parte de uma aliança de
fornecedores de ajuda econômica, de legisladores e de homens de negócios, que
antes haviam se omitido de tomar posição. Um outro motivo importante foi pelo
fato que as crises que atingiram as economias de vários países, devidas de
qualquer maneira a uma forma de capitalismo corrupto, que tirava os recursos
das empresas com sólidas bases econômicas, transferindo-os para aquelas que
pagavam propinas aos governantes.
Pela primeira vez se assiste a uma campanha voltada a enfrentar a
corrupção como um problema a nível
mundial frente ao qual se pode quem sabe fazer qualquer coisa. Até há poucos
anos atrás os motivos para combater a corrupção apareciam fracos aos
fornecedores de ajudas econômicas e para aqueles que eram encarregados de
formular as regras a nível mundial.
Em alguns países a corrupção podia ser vista como uma benção. Desbloqueava
as mercadorias presas na alfândega ou fixava preços para serviços que o governo
oferecia gratuitamente. Muitos economistas distinguiam entre uma corrupção boa
e u’a má. Hoje eles distinguem entre vários tipos de corrupção, se bem que
pensem muito antes de afirmar que exista uma corrupção boa. Assim, o Banco
Mundial afirma que, independentemente do grau de previsibilidade da corrupção
de um país, a sua taxa de crescimento seria mais alta se a corrupção fosse
menor.
A corrupção não é um problema que compreende apenas sociedade que não
seja sã. Ela não conduz necessariamente à ruína social, política ou econômica.
Trata-se antes de um problema inserido em uma combinação de problemas de
desenvolvimento. Problema que está solidamente radicado nas sociedades e que é
muitas vezes um sintoma de dificuldades mais profundas. Nos casos mais sérios,
quando a corrupção política e burocrática está bem consolidada, esta representa
o equilíbrio ou um ponto de estabilidade. Em tais circunstâncias, há a presença
de um sistema acuradamente organizado e estável em seu interior. Isto cria uma
competição política insuficiente, um crescimento econômico lento e irregular, e
uma sociedade civil débil, e em tudo isto encontra por sua vez sustentação.
Entretanto, os países podem passar de altos níveis de corrupção para
níveis mais baixos. (isto obtem-se garantindo as liberdades civis e os direitos
econômicos fundamentais, e levando a competição política e econômica,
alimentando uma sociedade civil forte, e adotando medidas legais e
institucionais voltadas a combater a corrupção. Se bem que o processo seja
difícil, tais passagens não requerem sistemas democráticos plenamente
desenvolvidos ou mercados econômicos avançados.
Praticamente não existe forma de corrupção que não seja exercida em
quase todos os países do mundo. Por que não se intervém para frear a corrupção?
Porque falta uma vontade adequada ou não existe capacidade suficiente a nível
local, em particular no que se refere às estratégias apropriadas ou os
incentivos para prevenir a corrupção. Em alguns casos a capacidade local é
forçosamente limitada por causa dos custos, da falta de competência técnica e
de esforços insuficientes aplicados para usar estratégias aptas para combater a
corrupção. A cooperação internacional pode ajudar cada país a desenvolver a
vontade e as capacidades necessárias.
CONCEITOS DE CORRUPÇÃO
A corrupção é, muitas vezes, comparada a uma doença grave. Difundindo-se
inexoravelmente de funcionário a funcionário, ela mira as instituições até
provocar a ruína do sistema político que elas representam. A corrupção deve ser
erradicada para conseguir o ressaneamento do sistema. Melhor ainda, a corrupção
deve ser prevista antes do início.
O problema é que u’a mentalidade que conceba a corrupção neste termos
não atinge a sua essência. A corrupção nem sempre enfraquece as bases dos
regimes e das instituições. A ironia quer que alguns países nos quais uma
mudança política, devam fazer frente a novas formas de corrupção originadas do
processo de reforma política e econômica.
É um fenômeno que preocupa não só por si mesmo, mas também porque é,
muitas vezes, o sintoma de dificuldade mais profunda. Este modo de ver é
sustentado pela análise empírica. A corrupção é associada à lentidão do
crescimento econômico, à redução dos investimentos, à inconsistência dos
direitos imobiliários e contratuais, à ineficiência das instituições, à
limitada interação social e a um débil Estado de direito, à exigua competição
econômica, à exigua competição econômica, às profundas divisões ou conflitos
étnicos, à baixa participação popular na vida política e à escassa tutela das
liberdades civis, ao baixo nível
educacional e a sistemas políticos e econômicos fechados.
Portanto, se de um lado será sempre importante combater a corrupção de
outro é, também, essencial compreender o mais amplo contexto no qual ela se
manifesta e com o qual interage. Para as agências de ajuda isto significa não
só combater os abusos no âmbito dos programas, mas também utilizar estes
últimos para combater a corrupção como problema do desenvolvimento. Grande
parte da corrupção nos países em via de desenvolvimento implica uma participação significativa por
parte dos países desenvolvidos.
A idéia de aumentar ordenado dos funcionários públicos para reduzir a
corrupção é uma falácia. Os funcionários mais bem pagos são os mais corruptos.
O ser humano tem uma ambição insociável. E é assim que alguns afirmam que a
corrupção que mais prejudica o
crescimento econômico não é tanto a pequena, quanto a maciça subtração de
fundos estatais operada por políticos e por seus colaboradores de alto nível.
Deve-se evitar esteriótipos inúteis e contextualizar a discussão. Assim,
alguns acreditam que todas as formas e todos os casos de corrupção sejam
igualmente danosos. Existe também a crença que, já que a corrupção existe em
todos os países, nada se pode fazer no lugar em que se vive, a seu respeito. O
resultado e o grau de incidência da corrupção se manifestam de modo diferente
nas várias regiões. Estabelecer o grau e o tipo constitui uma questão crucial.
O termo corrupção tem muitos significados. È necessário analisá-lo e
fazer as subdivisões. Na acepção mais amplamente aceita, a corrupção
corresponde ao uso impróprio de um serviço público para fins não oficiais. A
catalogação dos atos corruptos inclui o suborno, a concussão, o uso venal da
própria influência, o nepotismo, a fraude, a apropriação indébita ou peculato e
a prática do chamado “speed money” (soma
de dinheiro dado a funcionário governamental para apressar a prática de ação
que pertence à sua competência administrativa). Se bem que se diga que é uma
característica da administração pública,
a corrupção existe igualmente, ou mais ainda, no setor privado. Na corrupção ,
além do corrupto, existe o corruptor.
CORRUPÇÃO CONSOLIDADA
Os diversos tipos de corrupção não são todos igualmente danosos. A
corrupção que insidia as regras do jogo no sistema bancário e creditício, e os
direitos referentes ao setor imobiliário provoca prejuízos devastadores para o
desenvolvimento econômico e político. A corrupção que tem como efeito o
envenenamento ambiental ou a concessão por parte dos operadores de hospitais
são mais danosas que as propinas, que se deve pagar para obter um mais rápido
acesso aos serviços públicos.
Também a extensão da corrupção tem a sua importância. Quando esta se
torna a norma, os seus efeitos são paralisantes. Estabelecer e manter regras do
jogo aceitáveis no plano internacional se torna neste caso impossível. Este é o
motivo principal pelo qual as regionais menos desenvolvidas do mundo,
permanecem como estão.
De um ponto de vista econômico, a corrupção segue a fórmula C = M + D –
R, ou seja, a corrupção é igual ao monopólio mais a discreção, no sentido de
“segrego”, menos a responsabilidade. A corrupção é um crime que se comete com
cálculo, não por paixão. A luta contra a corrupção inicia-se projetando
sistemas melhores.
Os monopólios devem ser reduzidos e atentamente regulados. É necessário
mostrar a falta de transparência dos canais oficiais. A transparência deve ser
intensificada. A probabilidade de descobrir e de punir os transgressores deve
ser aumentada, e as penas para os crimes de corrupção, tanto de corruptos como
de corruptores, devem ser aumentadas. Se não é possível “produzir” funcionários
e cidadãos incorruptíveis, pode-se, entretanto, encorajar a competição,
modificar os incentivos, reduzir a impunidade.
A corrupção existe em todos os países, mas nos sistemas mais
desenvolvidos os reformadores gozam de muitas vantagens. Em primeiro lugar, a
corrupção constitui comumente a exceção, não a regra. Em segundo lugar, os
esforços para combater a corrupção obtêm o apoio político e popular. Nestes
casos o vocabulário de base da reforma é geralmente aceito. Isto ajuda a
determinar aquilo que é público e o que é privado, ajudando assim a tipificar
as ações consideradas abusivas. Em terceiro lugar, o governo buscando a
reforma, pode fazer uso dos recursos do capital político. Estes últimos incluem
a legitimidade, a credibilidade das políticas fundamentais, o Estado de
direito, linhas consolidadas de responsabilidade públicas e leis conforme as
normas sociais. Se as reformas não forem feitas, o governo poderá ser mudado
sem destruir o ordenamento político.
Em muitos países subdesenvolvidos, a corrupção está arraigada. Está
implantada em um quadro social que deixa os sinais visíveis das suas
consequências e que, ao mesmo tempo, contribui para sustentá-la. A corrupção
consolidada pode ser política, burocrática ou ambas as coisas. Não é
necessariamente mais visível ou mais freqüente. A corrupção enraizada é
persistente pois gera uma espécie de equilíbrio ou um ponto de estabilidade.
Em tal cenário, muitos cidadãos e investidores vêem a corrupção como
algo inevitável e consideram fútil qualquer tentativa de reforma. Submeter-se
às condições dos funcionários corruptos é muitas vezes o caminho obrigatório. A
corrupção enraizada desvia os recursos do desenvolvimento, e enfraquece a
vitalidade política e social da qual a sociedade tem necessidade para prestar
ajuda eficaz. Além disso, ela se mostra resistente a muitas reformas
institucionais e administrativas...
CORRUPÇÃO CONSOLIDADA E QUADRO SOCIAL
A corrupção consolidada é bem organizada e solidamente inserida em um
contexto político – econômico que revela os seus efeitos e, ao mesmo tempo,
contribui para a sua sustentação. A corrupção política pode apresentar aspectos
diferentes daquela burocrática, mas ambas são viciadas enquanto influentes,
organizadas e monopolísticas. Alterando o ambiente político e econômico, é possível
caminhar na direção de um equilíbrio baseado sobre níveis mais baixos de
corrupção e ritmos de crescimento mais altos, que se desenvolva de uma esfera
política e administrativa responsável e que, ao mesmo tempo, contribua para
sustentá-la.
Quando é envolvente a corrupção é assim comum que existem poucas
alternativas práticas de escapar da influência de funcionários corruptos.
Quando é organizada, a corrupção implica uma coordenação interna, uma divisão
de conhecimentos e uma troca vertical de benefícios. Ela facilita e, na sua
estrutura, reflete uma economia interna que estabelece uma coligação entre os
operadores e os seus superiores. Quando é monopolista, a corrupção não é
contrastada por nenhuma oposição política ou por alguma concorrência econômica
de algum relevo, e isto torna mais difícil a extirpação, consentindo aos
operadores corruptos de obter o máximo de benefícios durante longo período de
tempo.
Estas três características da corrupção não são necessariamente ligadas
entre elas, mas quando existe uma combinação dos três aspectos, a corrupção
resulta particularmente deletéria. Além disto, este tipo de corrupção cria um
equilíbrio difícil de modificar, especialmente se se recorrer apenas a remédio
de tipo administrativo e pessoal.
Reduzir a corrupção é função também do setor privado. As empresas podem
ter de competir em ao menos quatro tipos de ambientes corruptos. Em primeiro
lugar, uma sociedade pode ter um sistema social não ético. Um segundo caso é
constituído pelo governo e pelo líder do país corruptos, enquanto o sistema
social em si não o é. Em um terceiro caso, o sistema pode no ser corrupto, mas
podem existir elementos influentes implicados em práticos ilegais e não éticas
que ameaçam frequentemente os indivíduos particularmente e a eticidade das
operações comerciais e econômicas. Enfim, pode acontecer que o governo não seja
corrupto, mas que não esteja em condição de fazer aplicar as próprias
leis.
As dimensões de uma empresa e a sua importância para a comunidade ou
para a região são fatores que podem consentir de operar de modo ético e
economicamente vantajoso. As pequenas empresas não têm tanta liberdade de ação
quanto as grandes. Muitas vezes é impossível competir de forma ética e, ao
mesmo tempo, sobreviver economicamente em um ambiente corrupto. Em algumas
sociedades, o inquérito é um meio eficaz de descobrir a corrupção. Entretanto,
em alguns países, os governos controlam os meios de comunicação. A publicidade
dos procedimentos contribui para a transparência nos confrontos da opinião
pública.
Quando a corrupção é inveterada, a atividade política é dominada por uma
organização ou por um grupo monopolista que mantém o próprio poder em parte
mediante a corrupção, tirando proveitos ambulantes. O objetivo primário da
corrupção consiste em comprometer o maior número de pessoas com pequenos
favores. A habilidade de tais organizações está em sua influência profunda no
seio da sociedade.
CORRUPÇÃO POLÍTICA E BUROCRÁTICA
Os que sofrem as danosas consequências da corrupção consolidada
reagirão, provavelmente, adaptando-se a ela do que reagindo. As vítimas da
corrupção podem tomar três tipos de ação compensativa: ações de desconto com o
fim de reduzir a dependência dos funcionários corruptos; ações diretas para
aumentar o custo e o risco que os funcionários corruptos encontrariam em
enfrentar depois de sua conduta; e ações ilícitas de modo a combater a
corrupção com a corrupção. A ação direta é arriscada. As respostas do tipo de
descontar e ilícitas são mais atraentes, mas não obterão grandes resultados na
redução do grau de corrupção ou de criar oposição a ela.
Com relação aos burocratas corruptos, a situação é algo diferente. Antes
de mais nada, a maior parte deles não deve fazer frente a uma concorrência
frente a outros governos ou entidades que exerçam as mesmas funções. Em segundo
lugar, várias entidades podem ter que ver com um mesmo setor da economia, mas
desenvolvendo funções especializadas. Nenhuma destas entidades pode acabar com
uma outra semelhante ou procurar afastá-la da praça no setor dominado pela
corrupção. Todavia elas podem dar vida a ligações e criar redes de corrupção
permanentes e lucrativas, que se alimentam da dependência política e econômica
e, ao mesmo tempo, contribuem para sustentá-la.
A corrupção burocrática organizada verticalmente representa um notável
salto de qualidade com relação ao seu grau de enraizamento. Nestes casos, uma
parte do que é recebido pelos operadores é dividida com os superiores. Aqui a
ênfase se coloca ente a “corrupção sem furto”, quando uma quota de contribuição
entra em caixa, e a “corrupção com furto”, quando a quota contributiva não
chega em caixa. Na realidade, onde os salários dos burocratas não estão na
altura do custo de vida, a corrupção organizada com furto pode constituir uma
questão de sobrevivência. Mas excluindo-se uma estreita integração entre a
corrupção política e a burocrática, dificilmente o furto acontece de maneira
total. Por exemplo, por motivos políticos, os fiscais podem multar e a polícia
pode prender...
A corrupção estruturada, organizada e coordenada é sólida e difícil de desenraizar. Como acontece no caso de
corrupção política de tipo monopolística, aumentam as oportunidades de grandes
resultados para alto nível, e os maus tratos burocráticos coordenados com uma
aplicação seletiva das leis podem ser utilizadas para não exercer pressão sobre
aqueles que não querem pagar. De tal modo os burocratas corruptos estendem a
sua influência sobre a sociedade, criando um clima desfavorável às atividades
econômicas e aos investimentos, na qual a falta de oportunidades alternativas
pode constituir um motivo ulterior da consolidação de seu poder.
A grande corrupção no seio de qualquer sociedade jamais será igual a
zero. Afim de que o grau de corrupção seja aceitável, requer-se vontade
política para tal. Esta reforça os aspectos políticos da capacidade de um país
de utilizar os recursos do desenvolvimento. A corrupção não é apenas um
problema de desenvolvimento, mas também uma questão central na política de
desenvolvimento. Os países que tem a corrupção consolidada precisam tomar
consciência da mesma, principalmente do modo como se forma e da sustentação que
recebe do ambiente social e econômico.
ESTRATÉGIAS CONTRA A CORRUPÇÃO
Existe um elenco de eventuais estratégias contra a corrupção. Em
primeiro lugar, dever-se-iam punir os autores dos crimes mais relevantes. Em
segundo lugar, dever-se-ia envolver a gente comum no diagnóstico dos sistemas
corruptos. Consultando tais pessoas, podem-se obter informações úteis sobre os
lugares nos quais se verifica a corrupção.
Em terceiro lugar, dever-se-ia concentrar o esforço na prevenção, pondo
remédio nos sistemas corruptos. Todavia, se os custos e as perdas de eficiência
determinadas pela luta contra a corrupção pesam mais sobre o prato da balança
do que os benefícios de uma corrupção pequena, tais esforços são
contraproducentes.
Em quarto lugar, deveria haver incentivos para fazer uma reforma. Em
muitos países, o salário do setor público é de tal forma baixo que não consente
uma família viver razoavelmente. Além disso, no setor público há uma falta de
um sistema de avaliação da eficiência, de tal forma que a remuneração dos
funcionários não está ligada à sua efetiva produtividade. Portanto, é
necessário sublinhar a oportunidade de um sistema de avaliação das prestações e
uma revisão dos critérios de remuneração.
Apesar das muitas dificuldades que se encontram para combater a
corrupção existem motivos de esperança. Variações no nível de corrupção podem
ser encontradas em muitas partes do mundo político. Elas refletem longos
processos de disputa política e econômica, que colocaram fim a períodos
anteriores de extensa corrupção. Para obter um resultado semelhante é
indispensável empreender as reformas legais e institucionais, tratando-se
sempre de uma transição factível.
Com o passar do tempo, o ânimo do desenvolvimento encoraja um equilíbrio
a baixo nível da corrupção e consente a reforma, dizendo não à corrupção,
colocando as próprias raízes no mais amplo contexto político e econômico do
sistema. Uma imprensa independente, grupos de oposição política e uma sociedade
civil ativa tem maiores possibilidades de desenvolver-se se podem exprimir-se
publicamente e são livres de intimidações. Sob o aspecto econômico dever-se-iam
garantir direitos imobiliários e contratuais aceitáveis.
A corrupção política pode prosperar na ausência da corrupção burocrática
e vice-versa. Quanto mais grave se torna ou um ou outro tipo de corrupção,
tanto menor é a possibilidade de existir uma via independente. Um sistema concatenado
de corrupção política e burocrática tem um poder enorme. O problema crucial não
consiste tanto em induzir os governos a fazer qualquer coisa com relação à
corrupção quanto em ajudá-los a decidir que coisa é oportuno fazer e como.
Muitas vezes o problema não é oriundo da vontade política mas de não
saber como agir. Existe um dilema: os líderes políticos podem ter consciência
dos custos de uma corrupção sistemática e deplorá-la; mas, de outro lado, eles
reconhecem também os benefícios que lhe derivam pessoalmente e ao seu partido
pelo sistema vigorante de corrupção. A via de saída poderia ser tríplice. Em
primeiro lugar, as lideranças deveriam ver que é possível trazer melhoramentos
ao sistema sem dever cometer um suicídio político. Em segundo lugar, no
elaborar as estratégias, as lideranças deveriam reconhecer que nem tudo pode
ser feito de imediato: é necessário fazer uma análise dos custos e benefícios.
Em terceiro lugar, as lideranças devem evitar o isolamento político.
ÉTICA PROFISSIONAL: DISPONIBILIDADE
INTRODUÇÃO
Profissão é aquela atividade laboriosa, que empenha toda a pessoa humana numa orientação
de vida bem determinada, a serviço da sociedade.
A separação entre o capital e o trabalho
tornou este estranho à responsabilidade da empresa, equiparando-o a mera
mercadoria. A mobilidade do emprego, o desemprego e a migração de mão-de-obra, provocados pelas vicissitudes
econômicas, tornaram, reiteradas vezes,
aleatória qualquer fixação profissional. O próprio desenvolvimento da atividade
tecnológica esvaziou o antigo conteúdo
da noção de profissão.
I
Valores da profissão
Uma verdade fundamental está
na base de toda ética profissional: a união que existe entre a profissão
e as condições de existência do
indivíduo.
O indivíduo, enquanto pessoa, caracteriza-se por sua capacidade de se
conhecer e querer a si, para se determinar livremente, com responsabilidade.
A personalidade não é dada uma vez por todas, mas é convidada a crescer
e a desenvolver-se na realização da idéia de homem. Ela realiza a noção de ser em crescimento,
com o desenvolvimento da consciência e do poder, participando da História.
Esta realização, o homem concretiza através de seus atos livres.
Aperfeiçoa-se através de uma atividade, que pode tomar várias formas, desde a
ação imanente, que é a reflexão, até a ação mais transitiva, que é a construção
do mundo.
A relação entre o ser e o agir
manifesta-se, no ser humano, pela
realização da pessoa, dentro de suas condições de existência. E, se a profissão
é considerada uma das formas essenciais de um tal agir, é importante saber como
entendê-la, segundo o tipo de ação imposto pela vida moderna.
O homem deve limitar a sua escolha, ou aceitar a sua limitação, pois a
progressividade de sua realização exige continuidade, unidade e especialização
na ação. Caso contrário, será o esboroamento, a dispersão e o fracasso da
personalização. A liberdade humana não
tem sentido se não se desenvolve numa direção determinada. Ela não é um
absoluto, pois deve operar num campo de trabalho que se lhe propõe, com suas
próprias leis e exigências.
O homem é um ser no mundo, posto numa situação, que deve assumir. Ele
está mergulhado no meio cósmico, que o envolve, e que ele tem necessidade de
explorar e dominar, para garantir a sua existência. Esta exigência de
transformação do mundo, realiza-a o
homem pelo trabalho, que supõe a
adaptação à sua tarefa, conferindo ao trabalhador uma facilidade e uma
competência na sua especialização.
Vê-se, assim, aparecer a profissão, como atividade laboriosa. O drama da
nossa época reside na dificuldade de conciliar as especializações do
trabalho técnico, com as exigências
fundamentais e genéricas da idéia de profissão. Tudo depende, então, da maneira
como o trabalho é exercido e do sentido, que lhe é proposto.
Independentemente do juízo ético, que deva pronunciar-se sobre a
remuneração do trabalho, limitada à satisfação das necessidades vitais básicas,
típica da concepção capitalista do
assalariado, o trabalho tem, em primeiro lugar, a função de ganha-pão, de dar
ao homem com o que ganhar a vida. Limitado a esta função, ele permanece sempre
um grilhão, uma ocupação necessária, sem ligação com o resto da existência. Em
semelhante caso, não se pode falar de ofício ou profissão.
Múltiplas tarefas, na sociedade, são incapazes de dar qualquer coisa a mais que o ganha-pão, a tal ponto são
banais, monótonas e vulgares, consideradas na sua materialidade.
É a este nível, que a análise marxista do trabalho pode ser de
utilidade. Todo trabalho tem valor, enquanto atividade vital, consciente e
voluntária. pela sua necessidade de especialização, ele é uma obra social, uma
tarefa que torna o trabalhador solidário com todos os outros, e lhe faz
descobrir o seu "ser genérico". O labor mais banal, desde que seja
útil e aceito pela sociedade, pelo fato de cooperar para uma atividade global e
lhe trazer o seu contributo, por mínimo que seja, pode abrir para valores
personalizantes e próprios da vida social. A estrutura da sociedade deve
permitir esta abertura, residindo aqui o problema da relação entre o indivíduo
e a sociedade, que deve ser repensado em função das mudanças do mundo atual.
Também a análise freudiana da relação entre a necessidade e o desejo
pode ser útil. Se, enquanto atividade própria do homem, o trabalho parte de uma necessidade a satisfazer, ele
transcede esta ordem puramente biológica. Ou antes, faz nascer no seio da
necessidade saciada, o desejo de outra coisa, uma insatisfação que pode impelir
o indivíduo na via do progresso e da descoberta, ou, simplesmente, a procurar
uma realização por fora do seu labor, mas que este torna possível, desde que
não esgote as forças do trabalhador.
II
É o problema do tempo livre, concebido não como tempo morto e vazio, ou,
mesmo, como atividade após o trabalho, e sem qualquer laço com ele, mas como
atividade gratuita, isto é, não motivada pela necessidade de ganhar a vida, que
deve permitir, com a alegria e disponibilidade, que pode proporcionar, que cada
um tome consciência do valor humano e social do trabalho, para além de sua
materialidade.
Só uma concepção humanista da sociedade pode unificar valores pessoais e
valores sociais no trabalho profissional. Trata-se da relação entre indivíduo e
sociedade , que deve ser relembrada como pressuposto de toda a solução
concreta, sempre a reinventar.
A sociedade nem é a simples soma dos indivíduos que a compõem, nem uma
entidade autônoma, possuidora dum fim superior ao das pessoas. A sociedade é
dada já com o indivíduo, contido nela em potência. Porque este, como pessoa, é
feito, essencialmente, para se abrir a outrem, para comunicar e dialogar com o
outro, para se enriquecer pelas vias do conhecimento e do querer bem. O fato
fundamental da existência humana não é, nem o indivíduo como tal, nem a sociedade
como tal, mas sim os homens existindo com os outros homens.
Ora, esta comunicação entre os homens, inicia-se ao nível elementar de
todo o trabalho, criador duma solidariedade entre as pessoas, que não podem
prover a sua subsistência, a não ser agrupadas, dando cada uma o seu
contributo.
O trabalho é uma das ligações entre a vida pessoal e a vida social. Pelo
próprio fato do seu labor, e do mínimo de competência e especialização que
supõe, o trabalhador nunca está isolado. Insere-se num conjunto.
Ora, o homem, para se realizar, em primeiro lugar, sente a necessidade
de segurança, de se saber reconhecido pelos outros num mínimo de dignidade, que
é normalmente assegurado por todo trabalho bem realizado. Se o desenvolvimento
da pessoa passa pela comunicação com o outro, a integração social mínima,
trazida por todo o trabalho, deve contribuir para isso. Entretanto, ela não
pode ser suficiente se outros níveis da pessoa não são influenciados ou, mesmo
se o são, constituem uma ruptura com a vida, enquanto o trabalho é puro
ganha-pão.
Por parte da sociedade, todo o trabalho contribui para a sua formação.
Ela não pode existir senão pelo contributo de todos, nela exercendo cada um uma
função, ainda que o ignore e o esqueça.
O erro do capitalismo liberal é o de se recusar a fazer participar os
trabalhadores, tanto do produto comum, como das responsabilidades da empresa.
Para se conseguir tal participação e tal reconhecimento dos direitos do
trabalho, é evidente que este deve ser concebido na sua total dignidade humana,
isto é, no quadro de uma verdadeira noção de profissão. O perigo da
desumanização torna urgente uma verdadeira reabilitação do ideal profissional.
As mudanças na sociedade
Enquanto, ainda há bem pouco tempo, era a propriedade privada, que
parecia ser o ponto de partida da ordem econômica e social, nos dias atuais, é
o trabalho, principalmente o tecnológico, que está em vias de desempenhar este
papel. A profissão é o trabalho enquanto humanizado e realização da pessoa. O
fato narrado constitui, portanto, um convite para restituir à profissão a sua
verdadeira função na sociedade, e encontrar novas estruturas, que atribuam ao
trabalho a dignidade humana.
Assiste-se, nos tempos atuais, à importância crescente das relações
humanas na empresa. Enquanto, outrora, esta se definia, exclusivamente, como
unidade de produção de novos bens, meio de aumentar o capital, hoje em dia,
parece ter passado para primeiro plano a organização das relações humanas no
seu seio, entre os seus diversos membros. Ainda que o lucro continue a ser o
móbil essencial do capitalismo, a evolução de certos setores da civilização
industrial parece ir num sentido menos materialista.
Ao libertar o homem das tarefas demasiado aviltantes ou esgotantes, a
tecnologia orienta, cada vez mais, o trabalho do operário para uma operação de
controle de sistemas automatizados. Ela provoca o aparecimento de uma
civilização do tempo livre, como forma de atividade personalizante, que pode
animar a atividade laboriosa. O tempo livre permite um certo recuo em relação
ao tempo de trabalho, podendo ajudar a integração da existência, evitando os
efeitos traumáticos duma tarefa fragmentária e monótona.
As transformações atuais podem ser favoráveis a uma retomada da idéia de
profissão e a u'a melhor compreensão de sua função social. Já não é tanto o
trabalho, como obra acabada e objetiva (perfectio operis), mas como competência
técnica que ela supõe no operário (perfectio operantis), que dele faz um
artífice consciente do progresso social.
Enquanto a humanidade viveu de um modo praticamente estático, a
profissão consagrava um "estado de vida" quase imutável, numa ordem
social hierarquizada, na qual desempenhava u'a missão social predeterminada.
Hoje, a exigência de crescimento obriga, permanentemente, a colocar em
questão a estrutura e as formas de trabalho. Isto implica em mudanças
constantes, em abandono de fontes de produção pouco competitivas, transferência
de mão-de-obra, procura de novos mercados. A tecnologia, com sua rapidez
característica, faz cair, de modo rápido, muitas competências estabelecidas.
III
A planetarização da humanidade, como que u'a massificação coletiva,
através de redes, cada vez mais abrangentes, de relações inter-humanas, confere
ao mundo uma nova fisionomia, cada vez mais unitária, impelindo-o para sua
unidade e para a formação duma consciência e duma cultura comuns. Ela aproxima
os homens uns dos outros, tornando-os solidários, com uma ambigüidade grave,
pois aumenta os riscos de choques e de afrontamentos.
O processo de socialização é a tendência para reforçar os laços sociais,
fazendo predominar o social sobre o individual. A relação entre o indivíduo e a
sociedade, arrisca-se a ser falseada em detrimento do primeiro. Muitas
atribuições e tarefas, que outrora era de ordem privada, realizáveis pelos
indivíduos, são pouco a pouco assumidas pela coletividade. Donde a necessidade,
para a sociedade, de planejar e prever, o que diminui a margem da livre
escolha, em particular da profissão.
Pode parecer difícil conciliar o desenvolvimento da autoridade social e
suas intervenções, de um lado, com a liberdade de exercício das profissões, de
outro, mas que dizem respeito cada vez mais, a toda a sociedade. A dificuldade
reside em salvar a função social e de serviço, de uma parte, e sua função
personalizantes e sua independência, de outra.
Problemas atuais e conclusão
Doravante, toda profissão deve ser considerada numa perspectiva de
serviço. Isto não significa que não sejam legítimas outras finalidades
pessoais. Mas todas devem estar subordinadas a um fim social, isto é, uma
função a cumprir no meio social. pelo fato da profissão ser a prática de um
trabalho especializado, mesmo que se se procurasse nele a realização da pessoa,
a solidariedade, inerente a tal trabalho, conferia à profissão um caráter social.
Hoje, o aspecto social deve ser posto bem em primeiro plano, também em
nome da função personalizante da profissão. É manifesto o caráter social do
trabalho moderno. Com efeito, da competência de um trabalho consciencioso, pode
depender a vida de numerosos seres humanos. A complexidade de imensas tarefas
técnicas, faz com que um trabalhador anônimo, e isolado no seu posto, possa
assumir enorme responsabilidade para com a sociedade. os exemplos são claros
nos transportes e na distribuição de energia e de carburantes... A menor greve
geral revela a dependência da sociedade em relação ao mundo do trabalho.
Se o trabalho perdeu algo de sua densidade humana ou de seu encanto
romântico, se ele é cada vez menos capaz de encher uma existência humana, a
pessoa do trabalhador pode e deve encontrar a sua realização na tomada de
consciência da função e missão social que desempenha. Não é na materialidade do
gesto, que reside a dignidade a ser encontrada, mas na ligação entre o gesto e
a vida social para a qual contribui. Daí a importância do tempo livre para essa
tomada de consciência.
Tomar consciência de seu papel, dentro da perspectiva de serviço social,
supõe um esforço de educação. A monotonia do trabalho, ou o parcelamento deste,
perdem parte de seu aspecto desumanizante, se na empresa se instauram relações
humanas, se há informação do valor, sentido e finalidade das diversas tarefas
realizadas na organização.
Contrariando a moda neo-liberal, quer-se afirmar que, apesar de tudo, a
atividade econômica não pode, "a priori" e em absoluto, ser
inteiramente deixada à iniciativa privada. A economia revelou a sua
incapacidade em dominar, ela própria, o seu crescimento. Há necessidade de um
planejamento, que numa perspectiva personalista, não deve ter como conseqüência
retirar às pessoas os seus direitos e iniciativas legítimos. Todo plano supõe
uma escolha política, opção para o futuro e uma educação dos responsáveis pela
economia.
O planejamento é obrigado a privilegiar certos setores da atividade
econômica, para os quais disponha de mais recursos naturais ou de facilidade de
mão-de-obra. Assim é que é obrigado a prever uma diminuição ou, ao contrário,
um aumento de efetivos desta ou daquela profissão, limitando, desta forma, a
liberdade da pessoa na escolha das profissões, ou, então, permitindo e
facilitando sua imigração para outro setor mais favorecido.
Outrora, a profissão significava uma existência votada a uma tarefa
especializada, geralmente para toda a vida. A sociedade moderna, em mudança e
desenvolvimento, não pode garantir "a priori" que as formas
profissionais do passado continuem a ser as do futuro.
Já não pode aceitar-se que haja, para cada homem uma tal e qual vocação.
Deve-se alargar, consideravelmente, a idéia de vocação. A única verdadeira
vocação do homem é a de realizar planejadamente a sua personalidade, ao serviço
de seus semelhantes. Se esta ou aquela profissão é o meio particular de
realizar esta vocação fundamental, só numa perspectiva de disponibilidade
permanente, em relação a outras tarefas possíveis, será isto possível. A idéia
de profissão pode, ainda, solucionar o eterno problema entre o indivíduo e a
sociedade.
Excertos bibliográficos:
“Só há duas concepções de ética, [situadas]
em pólos opostos: uma delas, cristã e humana, declara que o individuo é sagrado
[...] A outra parte do princípio básico de que um fim coletivo justifica todos
os meios [necessários para atingi-lo].” Arthur Koestler apud Lobby, o que é.
Como se faz, 2007, p. 2006.
“O modelo simétrico de duas mãos proporciona
uma teoria normativa de como se deveria praticar as relações públicas para que
estas sejam éticas e eficazes” James e Larissa Grunig, 1992.
“Vivemos não apenas num novo ambiente
social: passamos a viver, de uma década pra cá, num novo ambiente moral, com
novas regras de comportamento, com novas exigências, onde transgressões que
antes podiam passar desapercebidas podem agora ser expostas em tempo real, em
escala global” (ROSA, 2007, p. 62.)
“No campo do limite da tolerância
intra-organizacional, o trabalhador que transgride a ética ou a organização que
atua fora dos seus limites ou bem são cúmplices, ou bem são intoleráveis um
para o outro. Não há terceira opção.” (THIRY-CHERQUES, 2008, p. 234)
“Mesmo a mais corriqueira das alegações, a
de que devemos tolerar as pequenas faltas, as faltas sem consequência, não
encontra respaldo em nenhuma das correntes do pensamento ético”.
(THIRY-CHERQUES, 2008, p. 234)
“As atividades de Relações Públicas estão a
serviço da classe que detém a prioridade privada dos meios de produção. “Sob a
aparência de conclamação ao debate com o objetivo de encontrar um interesse
comum, estabelece-se uma “compreensão mútua” entre desiguais.” (PERUZZO, 1986,
P. 79)
“A tolerância com a moral não é um bem nem
um dever. É a complacência com quem não cumpre o dever. (...) Tolerar
moralmente significa uma autorização para violar princípios”. “Mesmo a mais
corriqueira das alegações, a de que devemos tolerar as pequenas faltas, as
faltas sem consequência, não encontra respaldo em nenhuma das correntes do pensamento
ético”. “No campo do limite da tolerância intra-organizacional, o trabalhador
que transgride a ética ou a organização que atua fora dos seus limites ou bem
são cúmplices, ou bem são intoleráveis um para o outro. Não há terceira opção.”
(THIRY-CHERQUES, Hermano Roberto, 2008, p. 234)
“Os profissionais de Relações Públicas
precisam tornar-se “educadores no ajudar as pessoas a entenderem todos os
ângulos e conseqüências antes de tomarem uma decisão, facilitadores para que
neste mundo de crescente complexidade, tornar as coisas mais simples e
compreensíveis; tradutores no uso da palavra mais adequada e clara para que a
informação não se distorça”. (Vera Giangrande, terceiro congresso de jornalismo
empresarial)
BIBLIOGRAFIA
AMOÊDO, Sebastião. Ética do trabalho na era da pós-qualidade. 2 ed. ver
e ampl. - Rio de Janeiro: Qualitymark, 2007.
COSTELLA, Antônio F. Legislação da Comunicação Social. Campos do Jordão:
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Entrevista com Renato Janine Ribeiro. Ética ou o fim do mundo. Por Paulo Celestino da Costa. In: Revista Organicom, ano 5, número 8, 1º semestre de 2008.
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SROUR, Robert Henry. Por que empresas eticamente orientadas? In: Revista Organicom, ano 5, número 8, 1º semestre de 2008.
THIRY-CHERQUES, Hermano R. Ética para Executivos. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2008. p. 177 – 197. Capítulo Até que ponto somos socialmente responsáveis.
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p. 13- 34.
ZAJDSZNAJDER, Luciano. Ética, Estratégia e Comunicação. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1999. p. 23 – 72.
Bibliografia Complementar:
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DENNY, Ercílio A. A verdade como liberdade. Piracicaba, Edicamp , 2004..
DENNY, Ercílio A. e DENNY, Danielle M. T. Hermenêutica e argumentação. Editora Edicamp. Piracicaba. 2005.
DENNY, Ercílio A. Ética e Política I. 2. ed. Capivari: Opinião E., 2001 (a).
DENNY, Ercílio A. Ética e Política II. 2. ed. Capivari: Opinião E., 2001 (b).
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DENNY, Ercílio A. Fragmentos de um discurso sobre Liberdade e Responsabilidade. 1. ed. Campinas: Edicamp, 2003. v. 1.
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[1]
Aporético adjetivo 1 relativo a ou que contém aporia 2 inclinado a dúvidas; céptico. Aporia substantivo feminino 1 fil dificuldade ou dúvida racional decorrente de uma impossibilidade objetiva na obtenção de uma resposta ou conclusão para uma determinada indagação filosófica [As aporias foram cultivadas pelo ceticismo pirrônico como demonstração da ausência de qualquer verdade absoluta ou certeza filosófica definitiva.]; 2 fil em Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.), problema lógico, contradição, paradoxo nascido da existência de raciocínios igualmente coerentes e plausíveis que alcançam conclusões contrárias; 3 p.ext. p.us. situação insolúvel, sem saída; 4 ret figura pela qual o orador simula uma hesitação a propósito daquilo que pretende dizer. Locuções aporias de Zenão fil as formuladas pelo filósofo grego Zenão de Eleia (sV a.C.), que tinham por objetivo provar que as ideias de multiplicidade e movimento conduzem o pensamento a impasses e contradições lógicas insuperáveis.
Aporético adjetivo 1 relativo a ou que contém aporia 2 inclinado a dúvidas; céptico. Aporia substantivo feminino 1 fil dificuldade ou dúvida racional decorrente de uma impossibilidade objetiva na obtenção de uma resposta ou conclusão para uma determinada indagação filosófica [As aporias foram cultivadas pelo ceticismo pirrônico como demonstração da ausência de qualquer verdade absoluta ou certeza filosófica definitiva.]; 2 fil em Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.), problema lógico, contradição, paradoxo nascido da existência de raciocínios igualmente coerentes e plausíveis que alcançam conclusões contrárias; 3 p.ext. p.us. situação insolúvel, sem saída; 4 ret figura pela qual o orador simula uma hesitação a propósito daquilo que pretende dizer. Locuções aporias de Zenão fil as formuladas pelo filósofo grego Zenão de Eleia (sV a.C.), que tinham por objetivo provar que as ideias de multiplicidade e movimento conduzem o pensamento a impasses e contradições lógicas insuperáveis.
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