Referências:
BAITELLO JR, Norval. Corpo e imagem: comunicação, ambientes, vínculos. In: RODRIGUES, David (org.) Os valores e as atividades corporais. São Paulo: Summus, 2008. P. 95 - 112
BAITELLO JR, Norval. Corpo e imagem: comunicação, ambientes, vínculos. In: RODRIGUES, David (org.) Os valores e as atividades corporais. São Paulo: Summus, 2008. P. 95 - 112
A famosa citação de Harry Pross: “Toda
comunicação começa no corpo e nele termina” abre a discussão sobre a
necessidade de se incluir o corpo no processo comunicativo. São discutidas algumas
implicações que vêm a tona quando se menciona “corpo”: a hipnogenia, a
ambiência, os vínculos e a projetividade.
De acordo com o princípio da hipnogenia, as
pessoas não têm responsabilidade pelo processo comunicacional que é controlado
absolutamente pelos meios, elas se encontram em quase hipnose. Contudo, nessa
categoria se enquadram apenas os indivíduos que se submetem a essa alienação,
renunciando ao seu prórpio corpo, ou negligenciando uma relação equilibrada com
ele.
“... concepção de hipnogenia (Elisabeth
von Samsonow) como componente indispensável dos sujeitos e objetos da
comunicação – crença que passa a ser questionada. Tomava-se por aceita e
tranquila a concepção de que os veículos comunicativos, os chamados meios ...
tendem a substituir (ou ao menos ocultar) seus produtores, conduzindo o
telespectador à ilusão de que são autônomos e imperativos (por seu lastro
material ou por sua autoridade baseada na presença contínua de seus sinais).
... A hipnogenia transfere ao meio toda a responsabilidade, mas também toda a
capacidade de decisão, deixando seus agentes no espaço-tempo de uma quase
hipnose, abrindo mão de sua intencionalidade, de sua história e de seus
sonhos...”(BAITELLO, 2008, pág 97)
“... localizando no corpo o momento
germinal da comunicação, evita-se totemizar os meios, a mídia e afasta-se a
crença na autonomia desta, bem como em sua onipotente decisão. Expande-se a
percepção do fato social e inclui-se uma instância complexa, dotada de
imperativos próprios, de densidade histórica e cultural. Com isso, não se pode
simplesmente transformar ou enxergar o participante de um processo de
comunicação como um ‘sujeito hipnógeno’, despido de capacidade de
autodeterminação. Ele será transformado em tal figura infantilizada e de
reduzido grau de vigília e prontidão quando renunciar- por vontade prórioa ou
dos insistentes aparelhos sociais e culturais _ ao seu próprio corpo ou tiver
uma relação pouco vital com ele. ... Por força de um estreitamento do uso dos
sentidos (e da sensorialidade), ou seja, do próprio corpo em suas múltiplas
potencialidades, criam-se “funcionários” (no sentido da expressão criada por
Vilém Flusser) de um aparelho social onipotente, incapazes de existência plena e
previamente projetados para suas funções.”(BAITELLO, 2008, pág 98)
Além disso o corpo cataliza ambientes
comunicacionais, pelo simples fato de estar presente. A essa qualidade dá-se o
nome de ambiência.
“O corpo não se reduz a um único vetor ou
a uma única direção de vinculação... não é... mero meio de comunicação ou
mídia. Muito antes, ele é um catalisador de ambientes, e talvez seja sempre o
catalisador inicial de um ambiente comunicacional. Podemos nomear essa
implicação de “princípio da ambiência”. Sua simples presença gera a disposição
de interação, desencadeia processos de vinculação com o meio, com os outros
seres do entorno e com seus iguais.... Somos vocacionados para a interação com
outros que preencham nossas faltas e necessidades, porque somos corpo, com
limites e alcances espaciais claros, com uma duração apenas presumível, mas
indubitavelmente finita.” (BAITELLO, 2008, pág 99)
Comunicação deve ser entendida como estabelecimento
de vínculos entre corpos. É descabida a ideia de que comunicar é apenas trocar
informações.
“ Comunicar-se é criar ambientes de
vínculos. Nos ambientes de vínculos já não somos indivíduos, somos um nó
apoiado por outros nós e entrecruzamentos ... deslocamento do foco da
comunicação: não se pode mais compreendê-la como simples conexão ou troca de
informações, mas necessariamente é preciso ver nela uma atividade vinculadora
entre duas instâncias vivas. ... os vínculos procedem de atmosferas afetivas,
quer dizer, procedem de espaços de falta (ou espaços negativos), eles germ
densidades afetivas oriundas dos espaços de carência ou saciedade, dos espaços
de negação ou de negação da negatividade.” (BAITELLO, 2008, pág 100).
E comunicar é estabelecer ambientes ou
atmosferas comunicacionais, conectanto a história de toda a humanidade por meio
do princípio da projetividade.
“...não é um canal, ou uma via, ou um
fluxo a melhor forma de retratar um processo comunicativo, já que este parte de
um corpo. Muito mais adequado seria sua consideração, ... como ambiente, ou uma
atmosfera gerada por todas as partes que a integram, suas materialidade e
imaterialidade, seus percurso e sua histórias, seus sonhos, suas ambições e
aspirações, suas perspectivas pregressas e ‘progressas’, suas projeções para
frente e para trás, ambas entrelaçadas e inseparáveis, as naturezas
retrospectiva e prospectiva mescladas uma à outra, como se o tempo se tivesse
tornado duplo, inverso e reversível. A essa implicação podemos atribuir o nome
de ‘princípio da projetividade’. Sim, porque um corpo é o registro das
histórias de si mesmo e de todos os outros corpos, oferecendo a um ambiente
comunicacional a profundidade e a densidade das camadas mais profundas do seu
tempo e dos outros tempos. E sim, porque um corpo também é o registro dos
sonhos, desejos e anseios que delineiam a perspectiva e a projeção futura de si
mesmo e de todos os outros corpos. Projetividade é o lastro de história e o
potencial de anseios que todo corpo carrega em seu âmago. ... Um corpo sempre
conta histórias e projeta sonhos. Mais que isso, ele se constrói nas histórias
e nos sonhos” (BAITELLO, 2008, pág 102 e 103)
Na contemporaneidade, contudo, se percebe
um processo de abstração do corpo e de cerceamento do corpo para fazê-lo entrar
na forma dada previamente por uma imagem. Em um processo crescente de adequação
a objetivos e sonhos pré-fabricados. Como se os seres humanos fossem apenas
ferramentas.
“ operação complexa que denominei ‘iconofagia’,
na qual se processam as duas devorações heterodoxas: corpos que se alimentam de
imagens e imagens que se alimentam de corpos. Tais devorações ocorrem em
inúmeras situações e com frequencia cada vez mais assustadora, com a escalada
exponencial da hegemonia do sentido da visão em detrimento dos outros sentidos
que operam a comunicação de proximidade. Tocar, saborear e cheirar são sentidos
banidos da comunicação.” (BAITELLO, 2008, pág 104)
“As amputações de projetividade ...Entre
as violências perpetradas pela civilização, essa se apresenta como uma das mais
graves. Pode-se simplificá-la coo uma sonegação do direito de sonhar, de crer
(até mesmo de ter fé), de ambicionar uma vida própria, diferenciada dos padrões
previstos e programados pelas estratégias da civilização centrada no escoamento
da produção serial de mercadorias. ... Apagar os matizes da memmória e das
vivências sempre individualizadas significa homogeneizar o presente, pois impõe
um atestado de procedência única. Significa, também, impor um único destino, um
roteiro de vida previsto, um futuro de sonhos uniformizados e pré-fabricados.”
(BAITELLO, 2008, pág 105)
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